Um dos modos de olharmos o mundo contemporâneo é através do zapping: ameaças ambientais, alteração das estruturas familiares, guerra de civilizações, questões de género e identidade sexual, relações económicas e de poder, choque entre civilização e natureza. Neste sentido a obra de Gabriel Abrantes constitui um retrato dos nossos dias, não apenas pela pluralidade de referências que convoca ? do local ao global, do pessoal ao colectivo, da atualidade à história ?, mas sobretudo pelo modo descentrado como são trabalhadas. O presente documentário, através da voz do próprio artista e dos seus filmes, dá-nos conta de uma biografia marcada pelo multiculturalismo e de uma obra assumidamente transdisciplinar, que cruza o cinema ? no âmbito do qual recebeu um Leopardo de Ouro, em Locarno ? com as artes plásticas, de que foi prémio EDP em 2009. O recurso a estratégias narrativas múltiplas e a uma virtualização e exacerbação dos sentimentos replica o modo como olhamos o mundo após Hollywood, cuja lógica retoma para a virar do avesso. Neste sentido o cinema torna-se ferramenta crítica da arte e a arte ferramenta crítica da contemporaneidade, numa implosão de referências que assume um sentido político entre o idealismo e o sarcasmo.