Na casa de Alípio espera-se dia após dia, minuto após minuto que o governo caia. É uma espera que descontrola os nervos e não admira que as pessoas façam coisas sem pensar. Coisas que quando a cabeça arrefece nem se acredita que tenham sido pensadas quanto mais realizadas. Foi o caso da Fradinho. Nem ela sabe como foi mas quando deu por si estava nos braços do bacharel Tavares enquanto o marido se entretinha a jogar voltarete com o desembargador Amado e o Coronel Serrão. Juraram amor e fidelidade. O que era impossível. Amor vá que não vá, mas fidelidade era coisa que não estava nem da mão de um nem de outro. Ao mesmo tempo Alípio dava conta que a mulher lhe faltava na cama. Não é que o incomodasse por aí além, que um homem quando está com a cabeça ensarilhada de preocupações políticas nem pensa em delírios amorosos, mas era estranho. Não havia noite que Virgínia não se escapasse e quando regressava, quase pela manhã e o apanhava acordado a desculpa era sempre a mesma. O bébé chorava e ela deixara-se dormir ao lado dele.
Acreditou até á noite em que a insónia o despertou. Resolveu ir ao escritório apontar ideias que lhe haviam sobressaltado o sono para um futuro discurso político quando ao passar no quarto dos hospedes ouviu gemer. Gemia-se baixinho, é certo. Não havia nada de escândalo como mais tarde se justificou mas gemia-se e resolveu espreitar. Nem queria acreditar. O
sorumbático Doutor pulava que nem um corcel em cima da sua Virgínia que gemia e berrava de prazer. O entusiasmo do par era tal que não pararam quando Alípio entrou e perguntou estupidamente: "Mas o que é que se passa aqui?"
Nessa noite jurou vinganças. Como homem de honra que era, expulsou o Doutor e ainda estendeu a mão para esbofetear a Virgínia mas interrompeu a agressão quando se lembrou que não se bate em dinheiro. Virgínia era acima de tudo a sua carreia e, por isso, em voz embargada mandou-a para o quarto. Não conseguiu dormir o resto da noite. O sangue pedia-lhe vingança, a razão pedia-lhe calma. Quando o sangue falava, decidia que no dia seguinte iria entregar a estouvada á beata da mãe. Quando a razão falava, lembrava-o que ia entregar o baú do ouro e implorava-lhe que ele se recordasse dos doridos e negros tempos em que era redactor da Bandeira. Depois vinha outra vez o coração e impelia-o a um duelo com o miserável do Doutor. Depois a razão dizia-lhe: Toma cuidado. E se ele sabe manejar a espada? E era verdade.
Quando ficou mais calmo percebeu que estava entre a espada e a parede. Largar a Virgínia era ficar sem dinheiro e havia valores tão grandes que uma mera aventura nocturna não podia pôr em causa. Sendo assim, como homem prático que era, tomou uma decisão. Aceitaria as desculpas de Virgínia.