O dr. Vaz Correia perguntou a Alípio: Você conhece o desembargador Amado?
Respondeu evasivo: Gente ilustre, gente ilustre!
- Então, amanhã vai jantar comigo lá a casa. A filha faz anos.
Alípio Abranhos não sabia mas esta curta conversa ia mudar completamente a sua vida. É que meses depois seria aquela a sua família. Mas Vaz Correia foi descuidado. Não lhe disse que o levava para o apresentar, que o seu objectivo era mostrar Alípio ao desembargador Amado, a maior pança do maior alarve que por Lisboa tinha passado, e á sua inefável esposa Laura Amado, beata das beatas, mulher de sério carácter e pelo na venta que fuzilava com o olhar alguém que se atrevesse á predisposição ao pecado.
Descuidado destes perigos, compôs-se a preceito. Primeiro passou pela casa do correeiro para satisfazer as fomes de Alice, mulher de muito alimento, agora mais necessitada que o marido ia para dois meses que morava numa enfermaria de S.José atacado por uma carga de bexigas. Foi o primeiro percalço da noite. Alice estava grávida e não havia maneira de explicar ao marido, agora que ele estava prestes a sair do hospital que logo durante a sua ausência tivesse acontecido tal desmando.
Alípio enredou-se em explicações. Ou melhor a inventar explicações e chegou a uma conclusão brilhante: Não lhe dizes agora. Adias a conversa mais um mês e a criança nasce de sete meses!
- Mas o senhor é o pai! - ripostava Alice. E não se espante o tratamento cerimonioso. Eram de diferentes classes e, isso, como lhe explicara Alípio nem os segredos de alcova conseguiam dissipar.
Recorreu á mais fina retórica para convencer a mulher que o pai do filho que trazia no
ventre era o enfermo que gemera com o ataque de bexigas durante os dois meses de festança em que mergulhara o miserável casebre. Como ela se desse por convencida, e já que de grávida não passaria, resolveu-se o problema que ali o trazia com amor feito á pressa entre arreios e cabrestos.