D. António Ferreira Gomes (1906-1989), o Bispo ao serviço da liberdade
Um documentário biográfico sobre o bispo controverso, D. António Ferreira Gomes. A carta a Salazar, o exílio e a dissidência fazem de D. António Ferreira Gomes uma das maiores figuras da Igreja do século XX.
´Personalidade granítica, homem capaz de liberdade e construtor de homens livres, um pastor da Igreja, uma figura austera, alguém que resistiu´- assim testemunham Carlos Azevedo, Manuel da Silva Martins, Fernando Ferreira Gomes, José Barreto, Irene Pimentel, José Ferreira Gomes, Mário Soares e António Costa Pinto, num documentário biográfico sobre o bispo controverso, D. António Ferreira Gomes.
Nasce no início do século XX na freguesia de Milhundos, Penafiel. António era o quarto de nove filhos de um casal de agricultores abastados. Com uma forte tradição religiosa no seio familiar, não foi de estranhar que com apenas 10 anos fosse enviado para o Seminário. Faz o curso de Teologia no Seminário da Sé e com 19 anos rasgou horizontes e foi continuar os estudos no Colégio Pontifício Português em Roma. Firmado no seu imperturbável pensamento, após o regresso, dedica-se ao ensino e foi um exigente professor de filosofia no Seminário de Vilar. Sobressai entre o corpo de docentes pelo seu lado humanizante, apreciado com entusiasmo pelos alunos.
Quando nada o fazia prever, é nomeado Bispo de Portalegre e Castelo Branco, sendo na altura um dos Bispos mais novos em Portugal, e aí a sua vida mudou irremediavelmente, como o próprio diz ´o problema foi tornarem-me Bispo´. A sua sensibilidade vem desde logo ao de cima com a situação do proletariado alentejano. Pouco tempo depois é nomeado Bispo do Porto. As eleições fraudulentas de 1958, ditaram a história do país e a sua. Escreve o famoso pró-memória (conhecido como Carta a Salazar), documento que antecipa os pontos de discussão de uma entrevista agendada com o ditador. Linhas intermináveis de uma crítica cerrada à miséria social do povo português, ao corporativismo do Estado e à exigência da livre expressão do pensamento e ação política. Terminaram, assim, os tempos de quietude. Controlado e perseguido pela PIDE, acusado de louco, de comunista, de ser ´o bispo das oposições´ tornou-se, segundo Irene Pimentel, a figura incómoda para o regime.
Pagou alto o preço dos seus ideais, com 10 longos anos de exílio, vividos em condições miseráveis, entre Espanha, Alemanha, Itália e França. Abandonado pelo episcopado português e sempre pressionado a renunciar ao seu cargo de Bispo do Porto, inclusive pelo Papa, conseguiu manter-se fiel até ao fim e nunca renunciou. Com Marcelo Caetano no poder, vislumbrou o fim do exílio. Regressou à diocese, como se nunca tivesse saído. Depois do 25 de Abril, foi a figura da Igreja mais identificada com a democracia, por ter sido protagonista de um momento na história que marca uma maior autonomia entre a Igreja Católica e o regime autoritário.
Aceitou livremente a morte com a mesma lucidez com que viveu, até ao fim com a dignidade de estar de pé, de não se vergar perante o poder.
D. António Ferreira Gomes (1906-1989), o Bispo ao serviço da liberdade.