FERNANDO GIRÃO por João Carlos Callixto
4 Dez 1982 - "Coleira de Solidão"
Falar de Fernando Girão é falar de uma das vozes mas irrequietas, ousadas e sem fronteiras da música portuguesa - um âmbito geográfico que ele aliás mostrou sempre ser curto demais para o seu talento, quer como compositor quer como intérprete. Nascido em São Paulo, em 1951, tanto o Brasil como Portugal lhe estão nos genes: o seu pai é o guitarrista português Fernando de Freitas e a mãe a cantora brasileira Maria Girão. Tendo-se o seu pai deslocado ao Brasil na comitiva que acompanha Amália Rodrigues em 1945 e aí registado com ela os primeiros discos da diva, o nascimento de Fernando Girão tem-na assim como madrinha.
Em Portugal, os primeiros passos mais sérios do jovem músico são em grupo, com os Steamers, na viragem dos anos 60 para 70. O percurso discográfico começa logo depois, em 1972, e fica marcado tanto por um primeiro disco a solo como por trabalhos com outro grupo, a Heavy Band. “Engrenagem”, um single com “Pequeno Poema” no lado B, foi editado pelo selo Orfeu, de Arnaldo Trindade, e mostrava boas influências da escrita de Milton Nascimento. Ambos os temas têm letra de João Camilo Lopes Júnior, antigo integrante dos Ekos, e música do próprio Girão. No entanto, não seria com o seu nome de baptismo que assina este primeiro disco a solo, mas com a alcunha com que muitos o chamavam: Very Nice, nome de guerra que utilizaria em paralelo ao longo da década de 70. Com a Heavy Band em terras de África, a Valentim de Carvalho edita unicamente em Angola os dois singles do grupo, “Beggar Man / Funky” e “Your New Motel”, antes de uma digressão por terras brasileiras que os leva à gravação de mais músicas que no entanto não terão chegado a disco. Na guitarra, estava outro talento indomável: Filipe Mendes, mais tarde “apodado” de Phil Mendrix.
No ano da revolução, Girão lança o primeiro disco com o seu nome de baptismo: “Tirano Vem, Tirano Vai”, com "Eu Não Hei-de Morrer” no lado B. Ambas as músicas são de Pedro Osório, no primeiro caso a partir de um poema de Sidónio Muralha e no segundo a partir de outro do chileno Pablo Neruda, numa adaptação de José Carlos Ary dos Santos. Ainda em 1974, o nosso músico participa num álbum de Mário Viegas com poesia de Manuel Alegre e dirige, ao lado de Herman José, o álbum “Urgentemente”, do músico e editor Branco de Oliveira. Como membros do grupo ad-hoc In-Clave, Girão e Herman cantam um dos hinos de Abril, “Portugal Ressuscitado”, com palavras de Ary dos Santos. No ano seguinte, é no primeiro Festival RTP da Canção depois da revolução que encontramos Fernando Girão, desta vez ao lado de Jorge Palma. Juntos, cantam “O Pecado Capital”, que acaba por se classificar em 7.º lugar.
Sempre imparável e nunca se contentando com os percursos já construídos, Fernando Girão assina em 1976 um single com o seu nome (uma versão de “Uma Flor de Verde Pinho”, canção vencedora do Festival RTP da Canção desse ano) e outro como Very Nice (a incursão funky jazz de “Brothers of the Sun”). Em paralelo, integra o grupo Saga, que grava nesse ano o seu único álbum, “Homo Sapiens” (inteiramente composto por originais de José Luís Tinoco e que mais de 20 anos mais tarde seria reeditado na Coreia do Sul), e participa em “Malpertuis”, o histórico álbum de estreia de Rão Kyao. Até ao início da década seguinte, chega finalmente um álbum (“Discretamente”, em 1977, o último assinado como Very Nice, e que permanece até hoje como uma criativa “desbunda musical” desconhecida do grande público), a participação no segundo e último álbum dos Petrus Castrus (a ópera-rock “Ascenção e Queda”, em 1978) e ainda a edição em disco da famosa canção da Regisconta (“aquela máquina”...)
Esta música de hoje é a faixa de abertura do álbum "Contos da Europa Tropical", editado em 1982 pela Rádio Triunfo, e que marca o primeiro passo em longa-duração com o nome Fernando Girão. Cruzando referências de Portugal, África e Brasil, tem duas letras de Carlos Tê, sendo todas as músicas de Girão. As imagens aqui são do programa "Venha Tomar Café Connosco", de Jorge Cobanco, e com Simone de Oliveira como convidada. De então para cá, em quase quarenta anos, Fernando Girão continuou a fazer de tudo e bem, gravando discos fora do país, escrevendo e produzindo para outros e cruzando sempre várias linguagens. O trabalho mais recente de Girão é como vocalista do grupo de heavy metal R.A.I.V.A., em 2018, integralmente composto por originais seus e de Ricardo Mendonça, ex-RAMP. “A Vida É dos Que Acreditam”, como aí canta!
Em Portugal, os primeiros passos mais sérios do jovem músico são em grupo, com os Steamers, na viragem dos anos 60 para 70. O percurso discográfico começa logo depois, em 1972, e fica marcado tanto por um primeiro disco a solo como por trabalhos com outro grupo, a Heavy Band. “Engrenagem”, um single com “Pequeno Poema” no lado B, foi editado pelo selo Orfeu, de Arnaldo Trindade, e mostrava boas influências da escrita de Milton Nascimento. Ambos os temas têm letra de João Camilo Lopes Júnior, antigo integrante dos Ekos, e música do próprio Girão. No entanto, não seria com o seu nome de baptismo que assina este primeiro disco a solo, mas com a alcunha com que muitos o chamavam: Very Nice, nome de guerra que utilizaria em paralelo ao longo da década de 70. Com a Heavy Band em terras de África, a Valentim de Carvalho edita unicamente em Angola os dois singles do grupo, “Beggar Man / Funky” e “Your New Motel”, antes de uma digressão por terras brasileiras que os leva à gravação de mais músicas que no entanto não terão chegado a disco. Na guitarra, estava outro talento indomável: Filipe Mendes, mais tarde “apodado” de Phil Mendrix.
No ano da revolução, Girão lança o primeiro disco com o seu nome de baptismo: “Tirano Vem, Tirano Vai”, com "Eu Não Hei-de Morrer” no lado B. Ambas as músicas são de Pedro Osório, no primeiro caso a partir de um poema de Sidónio Muralha e no segundo a partir de outro do chileno Pablo Neruda, numa adaptação de José Carlos Ary dos Santos. Ainda em 1974, o nosso músico participa num álbum de Mário Viegas com poesia de Manuel Alegre e dirige, ao lado de Herman José, o álbum “Urgentemente”, do músico e editor Branco de Oliveira. Como membros do grupo ad-hoc In-Clave, Girão e Herman cantam um dos hinos de Abril, “Portugal Ressuscitado”, com palavras de Ary dos Santos. No ano seguinte, é no primeiro Festival RTP da Canção depois da revolução que encontramos Fernando Girão, desta vez ao lado de Jorge Palma. Juntos, cantam “O Pecado Capital”, que acaba por se classificar em 7.º lugar.
Sempre imparável e nunca se contentando com os percursos já construídos, Fernando Girão assina em 1976 um single com o seu nome (uma versão de “Uma Flor de Verde Pinho”, canção vencedora do Festival RTP da Canção desse ano) e outro como Very Nice (a incursão funky jazz de “Brothers of the Sun”). Em paralelo, integra o grupo Saga, que grava nesse ano o seu único álbum, “Homo Sapiens” (inteiramente composto por originais de José Luís Tinoco e que mais de 20 anos mais tarde seria reeditado na Coreia do Sul), e participa em “Malpertuis”, o histórico álbum de estreia de Rão Kyao. Até ao início da década seguinte, chega finalmente um álbum (“Discretamente”, em 1977, o último assinado como Very Nice, e que permanece até hoje como uma criativa “desbunda musical” desconhecida do grande público), a participação no segundo e último álbum dos Petrus Castrus (a ópera-rock “Ascenção e Queda”, em 1978) e ainda a edição em disco da famosa canção da Regisconta (“aquela máquina”...)
Esta música de hoje é a faixa de abertura do álbum "Contos da Europa Tropical", editado em 1982 pela Rádio Triunfo, e que marca o primeiro passo em longa-duração com o nome Fernando Girão. Cruzando referências de Portugal, África e Brasil, tem duas letras de Carlos Tê, sendo todas as músicas de Girão. As imagens aqui são do programa "Venha Tomar Café Connosco", de Jorge Cobanco, e com Simone de Oliveira como convidada. De então para cá, em quase quarenta anos, Fernando Girão continuou a fazer de tudo e bem, gravando discos fora do país, escrevendo e produzindo para outros e cruzando sempre várias linguagens. O trabalho mais recente de Girão é como vocalista do grupo de heavy metal R.A.I.V.A., em 2018, integralmente composto por originais seus e de Ricardo Mendonça, ex-RAMP. “A Vida É dos Que Acreditam”, como aí canta!