Tribunal de Justiça da União Europeia impede cientista alemão de patentear método de recolha de células embrionárias para criar células nervosas. Decisão está a ser criticada por cientistas, por alegadamente poder vir a pôr em causa o financiamento das pesquisas com células estaminais na Europa, dificultando o desenvolvimento de novas terapias.
A questão foi levantada pelo Greenpeace alemão, que contestou a patente de um método desenvolvido pelo professor Oliver Bruestle, da Universidade de Bona, o qual converte células embrionárias humanas em células nervosas.
As células embrionárias são pluripotenciais, ou seja podem transformar-se em qualquer célula do corpo.
O Tribunal da Justiça da UE decidiu a favor da Greenpeace.
E explicitou a sua decisão, referindo "o uso de embriões humanos para fins terapêuticos ou de diagnóstico, que são aplicados ao embrião humano e lhe são úteis, é patenteável."
"Mas o seu uso para fins de pesquisa científica, não é patenteável", determinou. E acrescentou, "um processo baseado na remoção de uma célula estaminal de um embrião humano no estado de blastocisto (4 a 5 dias) e que implique a destruição desse embrião, não pode ser patenteado".
Investigadores em choque
No Reino Unido a decisão foi considerada "devastadora".
O professor Pete Coffey do Instituto de Oftalmologia de Londres disse à BBC "isto pode realmente deter o progresso de terapias com células estaminais para doenças até agora incuráveis."
Coffey investiga o uso de células estaminais no tratamento de cegueira. Como outros cientistas, considera que a decisão ameaça o futuro da pesquisa médica, dizendo que as empresas europeias ficarão relutantes em investir nesta área específica.
A alternativa é investir em pesquisas fora da Europa. O professor Austin Smith, do Wellcome Trust Centre for Stem Cell Research da Universidade de Cambridge, diz mesmo que esta "decisão infeliz" deixa os cientistas "numa posição ridícula".
"Somos financiados para fazer pesquisa em nome da utilidade pública, mas proibidos de levar as nossas descobertas ao mercado, onde poderiam ser desenvolvidas como novas terapias."
O Próprio professor Bruestle, a quem a patente foi inicialmente atribuída, disse, "com esta decisão infeliz, os frutos de anos de pesquisa transnacional por cientistas europeus é varrido e deixado para os países não-europeus".
"Os investigadores europeus fazem pesquisa básica que depois é implementada noutros lugares em práticas médicas e é eventualmente reimportada para a Europa", explicou.
"Ultra-conservadora" e alinhada com o Vaticano
O presidente do Conselho de Ética português acusou por seu lado o Tribunal de Justiça da União Europeia de adotar uma posição "ultra conservadora" alinhada com o Vaticano.
"Essa é uma questão polémica em ética e que continuará a ser. Ao tomar uma posição dessa natureza, o tribunal tomou uma decisão alinhada com posições ultra conservadoras de algumas correntes católicas, porque nem todos os teólogos católicos pensam o mesmo", afirmou à Lusa Miguel Oliveira e Silva, presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV).
O responsável explicou que as células estaminais embrionárias são obtidas através de embriões humanos congelados, depois de os descongelar, entre o 3º e 5º dia de vida. "São embriões fora do útero, cujo destino é morrer, de qualquer maneira, se não forem utilizados para investigação. A questão que se põe é: é melhor utilizá-los em investigação que pode reverter em benefício humano, ou é melhor deixá-los morrer e deitá-los para o lixo?", questionou o médico, acrescentando não poder estar de acordo com tal posição.
Miguel Oliveira e Silva adiantou que o próprio conselho de ética, na anterior presidência, aceitou que seria melhor a sua utilização para investigação e que a lei portuguesa autoriza essa investigação se ao fim de três anos ninguém quiser nem reclamar os embriões congelados.
Segundo o presidente do CNECV, a posição adotada pelo tribunal é a "posição clássica do Vaticano, que acha que o embrião humano de três dias, mesmo que esteja no congelador, depois de descongelado deve ser tratado como pessoa humana".
Base de uma nova medicina
As células estaminais potenciam o tratamento de doenças como Parkinson, Acidentes Vasculares Cerebrais (AVC), doenças coronárias e diabetes, se for possível ultrapassar problemas técnicos.
Encontram-se nos embriões, no feto, na placenta, no cordão umbilical e em diversos tecidos do corpo e diferenciam-se em três tipos: tecidos (células estaminais adultas), células embrionárias e células pluripotenciais fabricadas.
Diversas terapias foram já desenvolvidas usando células estaminais adultas, chamadas células-mãe por permitirem a regeneração total de um dado orgão a partir do qual tenham sido recolhidas.
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