Dente do Siso ainda existe devido a mecanismo universal genético de todos os mamíferos

por Nuno Patrício - RTP
Imagem de caveira de um "Homo ergaster" do Kenia, incluido no estudo. Foto: David Hocking/DR

Parte-nos por vezes o juízo quando teima em nascer de forma menos correta e a culpa não é dele mas sim da falta de espaço criado pelo desenvolvimento do crânio humano. Mas porque será que ainda não perdemos o dente do siso? Os cientistas falam em mecanismo universal comum a todos os mamíferos.

Serão os dentes do siso um “erro” genético que continuamos a herdar ao longo da evolução humana ou ainda terão alguma utilidade na cada vez mais rara função humana de triturar a comida que ingerimos?

Estas simples questões são apenas algumas de muitas outras que se colocam quando, por infortúnio, os “molares do siso” se fazem sentir no nosso corpo, através da dor.
Designam-se por dentes do siso os 4 terceiros molares, localizados, à direita e à esquerda na parte posterior das estruturas dentárias.

São também estes os últimos dentes a nascer, normalmente entre os 18 e os 20 anos. Uma idade em que o comportamento humano começa a revelar alguma maturidade e daí a designação popular dente do siso, dente do juízo

Mas porque será que estes dentes, ditos do juízo, por vezes nos dão cabo da cabeça?

Muitas das vezes, os maxilares não têm espaço suficiente para acomodar o surgir tardio dos dentes do siso, sendo essa uma das principais razões pelas quais “eles” causam mais problemas do que os outros dentes.

Estima-se que nove de cada dez pessoas apresenta, pelo menos, um dente do siso com problemas durante o nascimento desse dente.



Mas porque existem se não fazem falta? Uma pergunta lógica que segundo alguns investigadores australianos será porque no nosso passado ancestral foram úteis, e porque o nosso código genético continua a ser reescrito e a informar as células construtoras, de que eles (sisos) podem ainda ser úteis, estando apenas adormecidos na sua função e tamanho.

Dentes pré-molares e molares primários responsáveis por dente do siso
Os nossos antepassados hominídeos tinham um bom terceiro molar, até quatro vezes maior do que o nosso, e com objetivo obviamente claro: mastigar.

Ora em 600.000 anos de evolução e cada vez mais sem função aparente, porque é que o código genético continua a dar ordem para “fabricar” este pedaço de calcário branco ?

De acordo com a bióloga Kathryn Kavanagh, que estuda o desenvolvimento humano na Universidade de Massachusetts, em Dartmouth, existe um modelo teórico, baseado no desenvolvimento da dentição em mamíferos em 2007, que vem de alguma forma demonstrar a continuação da existência destes “seculares” molares.

Dados obtidos em ratos, que tentam explicar as teorias, mostram um modelo simples de "cascata de inibição".

Ou seja, quando um dente se desenvolve, emite sinais de ativação ou repressivos sobre os seus “vizinhos”, sendo esta a relação que determina o tamanho dos dentes na sua vizinhança.

Se o comportamento alimentar animal determinar que é necessário o desenvolvimento de um determinado dente ou conjunto dentário, os interruptores naturais e genéticos dos dentes iniciais informam a necessidade de dentes maiores, mais fortes ou pelo contrário mais pequenos e consequentemente menos robustos.

Este estudo metodológico despertou interesse na comunidade cientifica odontológica e alguns dos colegas da bióloga que iniciou a pesquisa, estão a adaptar o trabalho já realizado, mas estendido aos hominídeos.

Alistair Evans, da Universidade de Monash, em Victoria, na Austrália, lidera a pesquisa e já publicou na revista Nature alguns dos resultados.

Os estudos revelam que o modelo em cascata de Kavanagh pode explicar a degeneração do terceiro molar dos Australopitecos para o modesto e problemático dente do siso que tanta dor de cabeça provoca ao atual homo sapiens.


Cranio de uma criança Australopithecus Africanus com 2.1 milhoes de anos apelidada de Taung child, descoberta na África do Sul . Direitos foto: University of the Witwatersrand (Evolutionary Studies Institute).


Os hominídeos mais primitivos, como os Ardipithecus, Australopithecus e Paranthropus, mostravam nas suas extruturas crânio-facial uma variação no tamanho e formas dos molares.
Os molares tendiam em crescer mais na parte de trás da boca, causando o desenvolvimento extra do terceiro molar.

Mas com o passar dos anos e com o surgimento de nosso gênero (Homo), as regras gerais foram ligeiramente alteradas.

Os tamanhos relativos dos molares começaram a depender do tamanho total dos dentes, que obrigou à redução do tamanho total dos dentes, típico da modernidade evolutiva.

A explicação está incorporada na teoria de um mecanismo geral, do desenvolvimento animal, que ainda contém o homo sapiens, e para o qual o terceiro molar se tornou num incômodo e ridículo dente do siso.

Extrair ou manter os sisos?
Não deve existir controvérsia relativamente a esta questão. Não existe nenhuma justificação para a extração indiscriminada dos dentes do siso.

Os sisos que são saudáveis e normalmente posicionados não causam problemas.



Geralmente os dentes que permanecem inclusos, intra-ósseos, numa posição normal, é improvável que causem problemas.

 Porém, se estes dentes estiverem numa posição anormal, o potencial para causar dano deverá ser devidamente avaliado por um médico dentista certificado.

Como é atualmente composta a dentição do homo sapiens

Os dentes são classificados de acordo com a posição e a função. Desta forma, temosas seguintes categorias dentárias:

  • Incisivos: dentes situados na parte da frente da boca e que servem para cortar os alimentos.
  • Caninos: possuem formato agudo e pontiagudo e servem para rasgar os alimentos.
  • Pré-molares e molares: possuem a função de triturar os alimentos e localizam-se no fundo da boca.


Os seres humanos possuem, na sua primeira dentição, 20 dentes de leite (10 na parte superior e 10 na inferior).

Após os 6 anos, os dentes de leite começam a cair e surge a dentição permanente. Esta é normalmente formada por 32 dentes (16 superiores e 16 inferiores), composto por 4 incisivos, 2 caninos, 4 pré-molares e 6 molares na parte superior e a mesma quantidade na inferior, sendo os terceiros molares os dentes do siso.
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