"Europa tem de retaliar". Durão Barroso alerta para provável imposição de tarifas por Donald Trump

por Joana Raposo Santos - RTP
Durão Barroso acredita que a eleição de Trump pode ser o estímulo que faltava à Europa para tomar decisões. Foto: Patrick Hertzog - AFP

O antigo presidente da Comissão Europeia Durão Barroso avisou que a relação entre a Europa e os Estados Unidos de Donald Trump será difícil e que é provável a aplicação de tarifas por Washington, pelo que será necessário "retaliar". Em entrevista ao Telejornal, considerou, porém, que a eleição do republicano "pode ser o estímulo que faltava" ao bloco comunitário para tomar decisões.

Se o atual presidente norte-americano, Joe Biden, “procura valorizar os seus aliados, o presidente Trump – como aliás já se viu no primeiro mandato – parece desprezar os aliados”, sustentou Durão Barroso na entrevista à RTP.

“É difícil, vai ser complicado gerir essa relação, ainda por cima porque ele agora tem a experiência do primeiro mandato e vem aparentemente com ideias bastantes mais claras”, continuou.
Na opinião do antigo presidente da Comissão Europeia, “os europeus têm de fazer os seus próprios trabalhos de casa”.
“Perante uma dificuldade que é, sem dúvida, um presidente americano que será ainda mais protecionista, mais isolacionista, nós na Europa temos interesse em que não haja protecionismo. Precisamos de economias abertas para o mundo para exportar”, afirmou.

“Vejo que, por essa Europa fora, há uns que estão a sorrir com a vitória de Trump, há outros que estão a chorar. A mim apetece-me citar um grande filósofo que eu admiro muito (…) que é Espinosa. Ele dizia que perante estas questões não vamos chorar nem rir, vamos tentar entender”.

“Por que razão é que os americanos elegeram Trump? Porque ali há razões sobre as quais nós talvez devamos refletir para evitar extremismos na nossa Europa”, acrescentou.
Tarifas poderão afetar "sobretudo setor automóvel"

Questionado sobre as tarifas que o presidente eleito dos EUA poderá aplicar à Europa, Durão Barroso disse acreditar que tal “não é inevitável”, podendo ainda existir uma negociação, “mas é possível e provável”.

“Trump tem repetido que a palavra que ele mais gosta no dicionário é ‘tarifa’ (…). E vai aplicar tarifas muito altas contra a China, o que também é um problema para nós, porque se esses bens e mercadorias não entram nos EUA, ainda vão ter de fazer maior pressão para entrar na Europa”, explicou.

Prevejo que ele vai aplicar tarifas para a Europa, sobretudo para o setor automóvel. Agora penso que a União Europeia, se estiver unida, deve falar com Trump claramente para saber quais são os seus objetivos”.

“Se ele quiser uma relação confrontacional com a Europa, então a Europa tem de retaliar, senão perde o seu próprio autorrespeito, a sua própria autoestima. Não vejo outra solução”, referiu.
Europa deve preparar-se “em termos de Defesa”
Vincando que a UE “por definição é lenta, é mais reativa que proactiva”, o antigo primeiro-ministro português acredita que “a eleição de Trump pode ser o estímulo que faltava à Europa para tomar decisões”.

A Europa só toma decisões quando há crises. Foi necessária a crise financeira para criarmos mecanismos para dar maior solidez ao sistema do Euro. Foi necessária a pandemia para a Comissão Europeia poder comprar vacinas em nome dos 27 países” e foi necessária a guerra na Ucrânia para a Europa falar em defesa, enumerou.

É precisamente para evitarmos a guerra que nós devemos estar preparados em termos de Defesa, e eu penso que se isto for explicado pelos líderes europeus, os europeus estão dispostos a esse sacrifício”, declarou.

Acerca da crise de liderança sentida em alguns países europeus, Durão Barroso frisou que “sem uma Alemanha e uma França a cooperarem, a União Europeia não funciona”.

“Em democracia temos de trabalhar com os líderes que são eleitos, e é verdade que a Europa é mais complicada porque somos 27 países. Mas acho que é fundamental termos esta estabilidade na Comissão, foi bom que tivéssemos a confirmação de von der Leyen”, que “mantém uma posição central no sistema”, afirmou.

“A nossa comissária portuguesa vai trabalhar para o mercado de capitais integrado na Europa, que é indispensável. Ela pode fazer as melhores propostas, e tenho a certeza que vai fazer, mas sem os Governos aprovarem, nada acontece”, acrescentou Barroso.
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