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Caça-minas NRP Roberto Ivens Foto: J.Canelas/DR

Achado recente: navio afundado perto do Tejo por submarinos alemães

No dia 26 de julho de 1917, quando procedia à rocega de minas na barra do rio Tejo, o Navio da República Portuguesa (NRP), Roberto Ivens colidiu com uma mina colocada por um submarino alemão, levando à sua parcial destruição e consequente afundamento, arrastando consigo 15 elementos da tripulação, entre eles o comandante (primeiro-tenente Raul Cascais). O navio foi agora encontrado e o local do achado mostra que havia minas alemãs bem mais perto da costa do que se pensava.

No ano em que se comemora 100 anos da entrada de Portugal no primeiro conflito mundial, a Marinha Portuguesa em parceria com o Instituto de História Contemporânea e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior dá a conhecer o achado do navio caça-minas NRP Roberto Ivens ao largo da foz do rio Tejo.

Esta descoberta reveste especial importância visto reescrever a história da movimentação da frota alemã na costa portuguesa.
Caça-minas Roberto Ivens: o primeiro navio militar afundado pelos alemães
Decorria o ano de 1917, em pleno período de guerra com a Alemanha, quando no dia 26 de julho o caça-minas Roberto Ivens recebe ordens para cumprir a missão de rocega de minas ao largo da barra do rio Tejo.

A missão veio a revelar-se fatal para o NRP Roberto Ivens e respetiva tripulação devido à colisão com uma mina deixada pelos submarinos pertencentes às forças alemãs nas águas territoriais portuguesas.

Do afundamento resultou a morte dos 15 elementos da tripulação entre eles o comandante, primeiro-tenente Raul Alexandre Cascais. Deste acidente sobreviveram sete marinheiros que foram recolhidos pelo rebocador da Armada "NRP Bérrio", o qual por vezes, também auxiliava na rocega de minas, e que naquele dia apoiava o "NRP Roberto Ivens".

"O 1º tenente Cascais, comandante do vapor “Roberto Ivens”, era um oficial muito distinto. Depois da declaração de guerra da Alemanha a Portugal, comandou um destroyer. Em seguida esteve no serviço de rocegagem na barra de Lisboa e há tempo comandava aquele vapor. Os náufragos recolheram ao Bom Sucesso, indo para o hospital dois deles, um que ficou ligeiramente ferido e outro que, por estar muito tempo na água, teve um princípio de congestão. Há ainda um outro ferido, que depois de pensado, recolheu a casa.
O comandante da Divisão Naval, logo que teve conhecimento do caso, partiu para o local do sinistro, onde procedeu a rigoroso inquérito, que durante a noite entregou ao sr. Ministro da Marinha."
 
Em (Jornal “O Comércio do Porto”, de 27 de Julho de 1917)

As noticias do afundamento da embarcação foram largamente publicadas como se pode comprovar na publicação da Ilustração portuguesa da altura.


Ilustração Portuguesa de 6 de Agosto de 1917 - Notícia sobre o afundamento do Roberto Ivens (Fonte Hemeroteca Lisboa)

A história deste navio remonta à primeira década do século XX.

De nome inicial Lordelo, o navio, propriedade da Empresa Portuense de Pescarias, Lda, construído em Selby, em 1906, foi construído como arrastão de pesca, tendo operado ao longo de 10 anos.

Devido às suas características, e face à entrada de Portugal no conflito mundial, o navio foi requisitado pela Armada portuguesa, a 19 de abril de 1916, tendo sido adaptado para caça-minas e rebatizado com o nome de Roberto Ivens.


NRP Roberto Ivens fundeado à esquerda / DR

A embarcação tinha 42,72 metros de comprimento, era equipada com uma pequena peça de artilharia (Hotchkiss de 47 mm) à proa e serviu a Marinha portuguesa durante cerca de 11 meses.

Nesse dia 26 de Julho de 1917, o "Roberto Ivens" cumpria a sua missão de rocegar minas, na zona compreendida entre o Cabo da Roca e o Cabo Espichel, onde se encontravam vários daqueles engenhos que ali eram regularmente colocados pelos submarinos alemães classe UC.



Segundo os relatos da época, o NRP Roberto Ivens afundou-se a cerca de 12 milhas náuticas ao sul de Cascais, mas os recentes achados mostram que os restos da embarcação se encontram numa posição bem mais próxima da costa revelando que as forças militares alemãs, submarinos, operavam relativamente perto da costa portuguesa.

A localização do Roberto Ivens, agora encontrado a 5 milhas náuticas a sul do farol do Bugio, e longe da zona que era dada como certa na documentação oficial (12 milhas), vai permitir "aprofundar o conhecimento sobre a presença e o papel da Marinha durante o período conturbado da Grande Guerra e, simultaneamente, lança um novo olhar sobre a real dimensão da ameaça submarina alemã em águas territoriais portuguesas", segundo um comunicado do ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

Um achado arqueológico que muda a perspetiva histórica
A descoberta do NRP Roberto Ivens surge na sequência de uma investigação lançada pela equipa de Paulo Costa, do Instituto de História Contemporânea (IHC), com o apoio da Comissão Cultural da Marinha e do Instituto Hidrográfico, no âmbito da preparação do programa de atividades para assinalar o centenário da entrada de Portugal na guerra.

O incidente com o navio estava referenciado, mas aproveitou-se a ocasião do centenário da entrada de Portugal na Primeira Grande Guerra  para efetuar uma missão com um navio hidrográfico e realizar uma busca ao largo da costa, tendo sido detectados e identificados alguns destroços, que posteriormente foram identificados como sendo do caça-minas Roberto Ivens.

Uma descoberta que Paulo Costa, investigador do Instituto de Historia Contemporânea, diz ter sido quase por mero acaso devido à existência de documentos que colocavam a embarcação num local ao referenciado a 12 milhas a sul de cascais, facto esse que não se veio a verificar.



A detecção do antigo arrastão afundado foi realizada em conjunto pelos elementos da lancha Andrómeda, uma equipa do Instituto Hidrográfico e o elemento do Instituto de História Contemporânea, o investigador Paulo Costa.

Este  achado surge no seguimento de um  destroço, de uma embarcação, que levanta a suspeitas de ser o Roberto Ivens, devido ao seu tamanho e configuração.

"Teve-se conhecimento, viu-se e mergulhou-se num destroço cuja tipologia fez lembrar a tipologia de um arrastão de pesca como era o caso do Roberto Ivens com a particularidade de não ter a popa. Ou seja, exatamente a parte do navio que o caso do Roberto Ivens explodiu com o impacto da mina. E era uma situação suspeita”, contou Paulo Costa à RTP Online.



Neste trabalho de pesquisa foram utilizadas técnicas científicas de sonar e de um ROV (remotely operated vehicle), equipamento que permitiu recolher imagens em profundidade.




Segundo informações disponibilizadas à RTP Online pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, os trabalhos de inventariação e análise dos destroços vão prosseguir em conjunto com os parceiros Marinha e IHC, continuando a ser utilizados para o propósito os equipamentos de sonar, ROV e elementos humanos para inspecionar de perto os destroços, recolhendo imagens que permitam aprofundar o seu estudo arqueológico.


Primeiro centenário da entrada de Portugal na Primeira Grande Guerra
Dia 9 de março de 1916 a Alemanha declara guerra a Portugal, ainda que o envolvimento direto de Portugal, no contexto da Grande Guerra, tenha começado durante o ano de 1914 através do envio de dois destacamentos militares mistos (artilharia de montanha, cavalaria, infantaria e metralhadoras) com destino a Angola e Moçambique.

Oficialmente a entrada de Portugal na Grande Guerra, contra a Alemanha, surge a 9 Março de 1916 na sequência do aprisionamento de navios alemães e austríacos refugiados nas águas neutrais portuguesas que os ingleses solicitaram a Portugal, realizada ainda durante o mês de fevereiro.

Neste trabalho de pesquisa e investigação, apadrinhado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, a secretária de Estado Fernanda Rollo destaca-o como uma forma de se preparar e veicular e valorizar o papel que o Ensino Superior e investigação tem nesta área.

Fernanda Rollo refere esta iniciativa como relevante na forma de apoiar uma descoberta que é importante tanto a nível nacional como internacional.

Esta descoberta vem mostrar uma outra prespectiva da navegação das forças submarinas alemãs, e que significa que “tendo o Roberto Ivens sido apanhado por uma mina, que os submarinos alemães estavam aqui ao largo da costa portuguesa”, refere Fernanda Rollo.



O Roberto Ivens mostra a memória da primeira Guerra Mundial. "Mostra que afinal de contas estamos aqui numa zona muito mais próxima dos acontecimentos pela entrada dos submarinos alemães, mostra no fundo também o impacto direto numa guerra, que estando longe, e no fundo há sempre essa imagem de uma primeira Guerra Mundial, que apesar de tudo mandámos muitos soldados, são 100 mil."

"É muito importante para Portugal. (…) Mas é uma guerra que nos está relativamente afastada e isso também acentua a forma como historicamente nós fomos olhando para o impacto e para o legado desta guerra", explica a secretária de Estado da Ciência, tecnologia e Ensino Superior.

"O Roberto Ivens não só é uma demonstração dessa proximidade, desse conflito, como ainda por cima ter ocorrido nas circunstâncias que ocorreu, o torna ainda mais relevante", conclui.