12:09 e o alfa parte da Gare do Oriente. “Porto-Campanhã”, anuncia a placa a piscar. As duas horas que se seguem até Aveiro são para preparar a cobertura mediática do WinterCEmp, o evento organizado pela Representação da Comissão Europeia (CE) em Portugal, do qual a RTP é parceira.
Na janela corre o filme conhecido de quem viaja de comboio. Pessoas com histórias guardadas no bolso e um burburinho fugido, de línguas diferentes, suspenso volta e meia pelo susto da buzina. Vamos de costas rumo a Ílhavo, para o Montebelo Hotel Vista Alegre, onde durante três dias se debate a Europa e o seu futuro.
A Europa trata-se por tu
Dos mais de 70 inscritos gravam-se nomes como Carlos Moedas, António José Teixeira, João Vale Almeida, Bernardo Pires de Lima. Mas também os que, fora do palco político, trabalham para olear a máquina da União Europeia. O dia-a-dia de quem estende o braço para lá da burocracia. Para quem a Europa é uma vizinha da frente, a quem se trata por tu.
O fim-de-semana é experimental e pensado para quem trabalha os assuntos europeus. Quer-se refletir a Europa e transferir o foco da “narrativa de crises” para uma “agenda de soluções”, explica Sofia Colares Alves, representante da CE em Portugal. Mas é, também, uma oportunidade para que trabalhadores de diferentes sectores partilhem conhecimento num ambiente menos institucional.
O caminho desde a estação de Aveiro a Vista Alegre fez-se em 20 minutos. Rui, taxista aveirense, realça a profunda reabilitação que decorreu na zona entre 2014 e 2016. Do abandono e falência iminente ao sucesso social e comercial.
A envolvente do hotel, bem como a antiga fábrica de porcenalas, o bairro operário, o teatro e a capela foram recuperados com fundos europeus, contabilizando mais de 2 milhões de euros. O projeto foi premiado nos RegioStars em Outubro de 2018.
Num contexto diferente, o resultado do fim-de-semana será um documento com recomendações, entregue a representantes políticos em Portugal, mas também à Comissão Europeia em Bruxelas. Será um “contributo português” para a definição da estratégia europeia, continuamente traçada e cuja próxima reflexão alargada será na Cimeira de Sibiu, a 9 de maio.
Dar palco à Europa
O Comissário para a Investigação, Ciência e Inovação abre o debate com uma nota: "É a primeira vez que partilho o palco com Francico Pinto Balsemão". O debate é moderado por Bernardo Pires de Lima, investigador em Relações Internacionais, e Raquel Gomes, Chefe do Gabinete de Imprensa da Comissão Europeia em Portugal. Desafiam os intervenientes a refletir sobre as mudanças na Europa e a partilhar os desafios do dia-a-dia.
Carlos Moedas inaugura o desabafo. “Tenho pena que hoje a Europa esteja tão longe das pessoas”. Considera, por isso, que “a Comissária da Concorrência é a melhor comissária, porque as pessoas sabem o que ela faz. Nestes cinco anos a minha maior luta tem sido explicar a Europa às pessoas”.
Há informação que escapa até aos próprios funcionários, confessa. Alerta para a tecnocracia e para a falta de coragem política. Pede que se trabalhe “a coragem dos políticos que se têm refugiado na esfera técnica”.
Mas o mote do fim-de-semana são as soluções, e Francisco Pinto Balsemão partilha as suas. Defende a criação de um Ministro das Finanças Europeu, a expansão da União Monetária e a participação ativa do Banco Central Europeu no processo legislativo.
Conversa aberta aos participantes: Podíamos usar a 🇪🇺 para reduzir a jornada laboral, uma ideia que já vem do século XX e que continua por concretizar - sugere @jfelixcardoso, que pede também que se sonhe mais a Europa #WinterCEmp
— RTP Europa (@RTPEuropa) 22 de março de 2019
Intervém também Ana Santos Pinto, professora na Universidade NOVA de Lisboa e Secretária de Estado da Defesa Nacional, que lança na mesa a solidariedade europeia. “O modelo social europeu é a base da Europa, um tema fundamental que ainda não chegou a este debate”. Interpelado, o Comissário responde que a Europa “já não tem meios para estabelecer o modelo social europeu”. Um problema que atribui também ao pingue-pongue de culpas entre os governos nacionais e as instituições europeias. De novo, surge a falta de coragem dos políticos. Para se ser europeu, há-que ser "corajoso".
É com o apelo à coragem política mas também à coragem dos cidadãos que se fecha a cortina. Do palco de Vista Alegre para o palco da Europa, termina o primeiro debate do fim-de-semana. A peça passou pelo Brexit, pelas eleições e abstenção, pelo fazer política e cidadania. Passou de fugida pela solidariedade, não tocou no tema dos refugiados.
O fecho da primeira noite
O WinterCEmp é institucional no papel, porque advém de uma instituição europeia e congrega representantes de tantas outras nacionais e estrangeiras. Mas na prática, perde-se a rigidez laboral. A organização do jantar é aleatória e heterogénea. Contribui para a polivalência de opiniões que corre pela noite. Depois da voz que anima sobremesas e do recortar dos talheres, dos círculos que entre fumo partilham histórias, Ílhavo remete-se ao silêncio. A conta gotas os participantes recolhem. Às 02:57 o bar está vazio, ouvem-se apenas as teclas do computador. Amanhã há mais Europa.
A RTP é parceira estratégica do WinterCEmp e está representada pelos programas Europa Minha e De Lisboa a Helsínquia, financiados por fundos europeus.