Rio admite "algum desalento" com governação de Passos

por RTP
"Desafio qualquer um em Portugal que tem uma solução diferente para evitar que o défice resvale", reagiu Passos no domingo Nuno Veiga, Lusa

O coro de críticas, entre os social-democratas, aos primeiros meses da governação de Pedro Passos Coelho encontra eco na avaliação de Rui Rio, para quem é “compreensível” que haja “algum desalento” com “as medidas”, a começar pelos aumentos de impostos. Mas o presidente da Câmara do Porto não vai tão longe nos reparos como Manuela Ferreira Leite ou Luís Marques Mendes. O Executivo, sublinha, “está em funções há pouco tempo”.

Manuela Ferreira Leite reprova o que entende ser um caminho de “manutenção do nível da despesa pública”. Marques Mendes nota que “o Governo já fez três aumentos de impostos” sem concretizar medidas para um “emagrecimento do Estado”. Marcelo Rebelo de Sousa, outro nome na galeria de antigos líderes do PSD, utilizou no domingo o seu espaço de comentário na TVI para assinalar que “falta, em matéria de impostos, uma explicação”. E o antigo eurodeputado Vasco Graça Moura avisou que o Executivo terá de reexplicar o pendor da austeridade para o capítulo da receita.
Críticas “são mais para ajudar”

As críticas de figuras do PSD ao Governo são desvalorizadas pelo secretário-geral do PCP. Para Jerónimo de Sousa, “esses alertas são mais para ajudar do que para desajudar”.

“Eu creio que muitas vezes são pessoas que começam a ser também tocadas nas suas remunerações. Mas obviamente que isto é uma questão em que se verifica o incómodo, quando se devia era verificar uma contestação clara e o arrepio do Governo em relação a esta brutalidade do aumento dos impostos”, disse ontem o dirigente do PCP.

“Eu lembro-me de uma expressão do comentador de serviço, Marcelo Rebelo de Sousa, que dizia: mesmo quando não parece, eu estou sempre a favorecer o PSD nas minhas intervenções”, concluiu Jerónimo.

Rui Rio confessa que se revê “na linha de orientação” seguida por estas vozes social-democratas. Porém, ao mesmo tempo, defende que importa “dar mais algum tempo para ver se as coisas mudam um bocadinho”. O que não significa dar carta-branca ao Governo.

Em entrevista à RTPN, o presidente da Câmara do Porto deixou esta noite um recado ao Executivo: “Mesmo no âmbito da degradação do nível de vida das pessoas, por força dos erros cometidos, é possível fazer um pouco diferente”.

“Dá-me a ideia de que, à medida que o tempo avança, as pessoas não têm tanta condescendência, digamos assim, para com os governos. E portanto admito que estejamos a viver, mais ou menos, esse momento, o momento em que as pessoas vão começar a ser um pouco menos tolerantes com o Governo”, antecipou o autarca.

“Algum desalento”

Comentando uma entrevista de Eduardo Catroga ontem publicada pelo Diário Económico, na qual o economista afirma que “era difícil fazer melhor em 100 dias”, Rui Rio contrapôs que “há algumas coisas em que se poderia fazer diferente”. “A esperança é um pouco maior. Ou seja, se nós tivéssemos o mesmo Governo que tínhamos antes de 5 de junho, era mais do mesmo e as pessoas não sentiam esperança. Eu acho que, com este Governo, se sente alguma esperança, mas também é compreensível, face à situação do país e às medidas tomadas, que também se sinta algum desalento”, admitiu.

Quanto às críticas para a aparente incoerência entre as promessas eleitorais de Passos Coelho e as primeiras medidas de austeridade implementadas pelo Governo partilhado por PSD e CDS-PP, o presidente da Câmara Municipal do Porto considera que, “nesse capítulo em particular”, o primeiro-ministro “não está bem”. “Mas, como digo, lá pelo facto de não estar bem ao cabo de dois meses e tal, não quer dizer quer não esteja bem daqui por quatro, cinco ou seis meses. Efetivamente, há que atirar forte na redução da despesa. Reduzir a despesa não é tão simples quanto a forma como as pessoas dizem, ou que se diz quando se está na Oposição”, acrescentou.

Em linha de aproximação à leitura de Ferreira Leite, Rio sustentou que “o IRS se deve moldar à grande necessidade do país que é o reforço da poupança”: “Sem reforço da poupança, nós não pagamos a nossa dívida externa, que é o grande problema do país. Portanto, os mecanismos de IRS devem proteger quem poupa e não devem proteger quem gasta e, no caso concreto da educação, eu entendo que é no interesse do país e do futuro do país que nós devemos incentivar as pessoas a dar educação aos filhos e que aquele dinheiro que se gasta aí é melhor garantia para o médio e o longo prazo de Portugal. Aí, realmente, faria diferente”.

“Não há ninguém isento de críticas”
Nas páginas da última edição do semanário Expresso, Manuela Ferreira Leite assinou um artigo de opinião pautado pela desconfiança face às estimativas macroeconómicas do Governo e por críticas às alterações introduzidas em sede de IRS. Para a antiga ministra das Finanças, proceder a cortes em deduções de despesas de saúde, uma das medidas desenhadas pelo Ministério de Vítor Gaspar, pode facilitar, por exemplo, a fuga ao fisco por parte dos médicos: “O que se ganha com a diminuição das deduções não compensa o que se perde em tributação de rendimentos”.

Por outro lado, escreveu Ferreira Leite, “tributar cada vez mais” os escalões mais elevados do IRS “é optar por aplicar a sua poupança na manutenção do nível da despesa pública, em vez de deixar que esta se encaminhe para financiar o investimento necessário ao crescimento do país”.

O primeiro-ministro reagiu no domingo às avaliações dos seus antecessores na liderança do PSD. “As pessoas que pensam poder viver e trabalhar sem críticas enganam-se, porque não há ninguém que possa estar isento de críticos e eu aceito as críticas de muito bom grado”, disse Pedro Passos Coelho em Campo Maior, depois de reiterar que quando se candidatou “à liderança do Governo sabia que ia encontrar uma situação muito difícil”.

Mais tarde, depois de encerrar a Universidade de Verão do PSD, em Castelo de Vide, Passos devolveria: “No dia em que eu tiver de aumentar impostos por erros de políticas minhas ou deste Governo, nesse dia eu aceito a crítica de que fiz o que não tinha prometido”.
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