Marcelo decidiu e Portugal vai a votos. O que se segue após o anúncio

por Carlos Santos Neves - RTP
O Parlamento tem trabalhos agendados até 26 de novembro Manuel de Almeida - Lusa

Confirmada a dissolução da atual composição do Parlamento, pela voz do Presidente da República, na última noite, os deputados têm agora uma agenda de trabalhos que se esgota a 26 de novembro. As eleições legislativas foram antecipadas para 30 de janeiro. Antecedem-nas duas semanas de campanha eleitoral e, antes disso, mês e meio de pré-campanha e contagem de espingardas – desde logo à direita.

“Uma semana e um dia depois da rejeição do Orçamento para 2022 encontro-me em condições de vos comunicar que decidi dissolver a Assembleia da República e convocar eleições para o dia 30 de janeiro de 2022”. Foi com estas palavras que Marcelo Rebelo de Sousa selou, às 20h00 de quinta-feira, o desenho do horizonte próximo do país político.

O Presidente sustentou, na intervenção transmitida pelas televisões, que, ”em momentos como este, existe sempre uma solução em democracia, sem dramatizações nem temores, faz parte da vida própria da democracia: devolver a palavra ao povo”.
Relativamente à data escolhida, arguiu que a “campanha eleitoral, bem como debates audiovisuais que a devem anteceder são, a todos os títulos, indesejáveis, e podem ser meio caminho mandado para um aumento da abstenção”, aludindo ao período do Natal e do ano novo.

“O sensato é apontar para debates e campanha, a começar em 2022, mas não em cima do dia de ano novo, e ainda assim termos eleições em janeiro - como eu disse desde o primeiro momento -, compatibilizando a desejável rapidez com a devia atenção a um período sensível na vida das pessoas”, continuou.

A proposta de Orçamento do Estado para o próximo ano foi reprovada na generalidade a 27 de outubro, com os votos contra de PSD, BE, PCP, CDS-PP, PEV, Chega e Iniciativa Liberal. Apenas da bancada do PS votou favoravelmente. O PAN e as deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues abstiveram-se. Já no termo da comunicação ao país, Marcelo deixou uma mensagem direta ao eleitorado, ao afirmar que confia no “patriotismo”, no “espírito democrático”, na “experiência” e no “bom senso” dos portugueses.

“Como sempre, nos instantes decisivos, são os portugueses, e só eles, a melhor garantia do futuro de Portugal”, rematou.
A ausência de consenso

Recorde-se que Marcelo Rebelo de Sousa advertira para a possibilidade de dissolução do Parlamento a 13 de outubro. Isto após as forças que, nos últimos anos, suportaram o Governo de maioria relativa do PS, PCP e Bloco de Esquerda, terem aventado que votariam contra. Logo então, o Presidente da República dizia que a rejeição da proposta de Orçamento “muito provavelmente” levaria à antecipação das eleições legislativas antecipada para janeiro.

PCP e PEV, que formam a CDU, consideraram no sábado desnecessário o recurso à dissolução do Parlamento. De resto, também o Bloco o fez. O partido Pessoas-Animais-Natureza afirmara igualmente que sobejaria outras fórmulas para responder à crise política.

Quanto a possíveis datas para as eleições, PSD e CDS-PP apontaram para os dias 9 ou 16 de janeiro, ao passo que PS, PCP, PEV e Chega indicaram o dia 16 de janeiro, o BE defendeu eleições a partir dessa data, o PAN apontou para o final de janeiro ou início de fevereiro e a Iniciativa Liberal recusou um cenário de chamada às urnas antes de 30 de janeiro.
O que se segue?
Nos termos da Lei Eleitoral para a Assembleia da República, as candidaturas às eleições legislativas têm de ser apresentadas até ao 41.º dia anterior à data prevista para as eleições. No atual contexto, o prazo termina a 20 de dezembro.

A campanha eleitoral, que nos termos legais, tem início ao 14.º dia anterior e término às 24 horas da antevéspera das eleições. Ou seja, as caravanas das forças políticas saem para as ruas entre 16 e 28 de janeiro de 2022.

O Conselho de Estado deu, na passada quarta-feira, “parecer favorável, por maioria, à proposta de sua excelência o Presidente da República de dissolução da Assembleia da República”, de acordo com a nota divulgada após a reunião. A Assembleia da República marcou ontem trabalhos até 26 de novembro. Trata-se, sobretudo, de agendamentos potestativos por parte de partidos, segundo Maria da Luz Rosinha, porta-voz da conferência de líderes.

A reunião da conferência de líderes começou uma hora após a comunicação do Chefe de Estado.

“Hoje foi uma conferência de líderes com uma particularidade, que foi o facto de termos ouvido o anúncio do senhor Presidente da República e por isso mesmo agendamos à partida até dia 26, sendo que pelo meio, dia 17, faremos nova conferência de líderes para afinar aquilo que for necessário”, indicou a porta-voz aos jornalistas.

No próximo dia 10 de novembro, estará sobre a mesa um agendamento potestativo da Iniciativa Liberal sobre o Cartão do Adepto. Foi agendada para o mesmo dia uma proposta de lei do Governo que “altera as taxas previstas no código de Imposto Único de Circulação e prorroga as medidas de apoio ao transporte rodoviário”, medidas ontem aprovadas pelo Governo, em reunião do Conselho de Ministros.

“Neste momento as comissões estão a ultimar todo um conjunto vasto de iniciativas que lá têm, a discuti-las na especialidade, que subirão para votação também e poderá ainda haver alguma alteração em relação àquilo que foi acabado de anunciar em função de alguma necessidade por parte do Governo ou algum ajustamento em relação à data de dissolução do “Parlamento", fez ainda notar Maria da Luz Rosinha.

A Constituição da República estabelece que as legislativas antecipadas têm de ocorrer nos 60 dias a seguir à dissolução da Assembleia. Logo, esta só pode ser decretada a partir de 1 de dezembro.
A 11 de novembro, o agendamento cabe ao CDS-PP e terá por base um projeto de lei para a revogação do regime especial de perdão de penas na sequência da pandemia.

No dia 12, o Pessoas-Animais-Natureza terá um agendamento potestativo para dois projetos de lei: um sobre o “alargamento da tutela criminal a todos os animais vertebrados” e outro que reconhece e regula a figura do animal comunitário e “reduz o prazo de reclamação dos animais não identificados recolhidos nos centros de recolha animal”.

Para o mesmo dia foi agendado um projeto de lei dos socialistas, que não terá tempos e concerne à prorrogação para o ano de 2022 do regime excecional e temporário do exercício de direito de voto antecipado para eleitores em confinamento obrigatório no âmbito da pandemia e eleitores residentes em estruturas residenciais e estruturas similares.

A 17 de novembro, será a vez de um agendamento potestativo do PCP, ainda sem tema. Houve “acordo da parte dos partidos em facilitar o agendamento de alguma medida por parte do Governo” para o mesmo dia.

O Bloco de Esquerda fez um agendamento potestativo para o dia 18, o PSD para 19, o Partido Ecologista “Os Verdes” para 24 e o PS para o 25. Por último, para a 26 de novembro está previsto um conjunto de votações.
À direita, a pressão
Em entrevista à TVI, na noite do anúncio do Presidente, Rui Rio, recandidato à liderança do PSD, afirmou que vai “tentar comprimir” os prazos das eleições diretas e do Congresso laranjas, isto para diminuir o tempo de que o PS dispõe “a seu favor” para as legislativas de 30 de janeiro.

O PSD, propugnou Rio, devia nesta altura mostrar-se “sem tumultos internos, todos unidos, todos focados para derrotar o PS em janeiro”.

“Estão a dizer que, se fizer isso, se suspende a democracia e que tenho medo de eleições. Então, vou fazer um exercício - não sei se consigo, vamos ver se consigo - de comprimir isto tudo, diretas e congresso. Se se ganhar uma ou duas semanas é tempo que tiramos ao PS a nosso favor”, vincou.
As diretas social-democratas estão previstas para 4 de dezembro e o congresso para o período de 17 a 19 de janeiro. Mas existe uma proposta, por parte da ala de Paulo Rangel, para antecipar a reunião magna para entre 14 e 16 de dezembro, que vai ser votada no próximo sábado pelo Conselho Nacional do partido, que terá lugar em Aveiro.

Rui Rio afiançou ainda que, se for candidato do PSD às eleições legislativas e perder, só se manterá na liderança “um, dois meses”. Mas não ficará “mais quatro anos à espera de eleições”: “Ou eu sou primeiro-ministro ou é a última eleição da minha vida, já tive muitas e não fugi”.

Quanto ao CDS-PP, a viver igualmente uma fase de trepidação, a porta-voz Cecília Anacoreta Correia rejeitava ontem ue o congresso eletivo do partido se realizasse antes das legislativas, ao abrigo do argumento de ue o partido tem “apenas seis semanas” para apresentar listas.A RTP divulga esta sexta-feira, às 20h00, uma sondagem sobre intenções de voto nas eleições legislativas.

“Eleições no dia 30 de janeiro significa que teremos de apresentar as listas fechadas no dia 20 de dezembro e por isso todos os nossos esforços, toda a nossa força anímica, todos os nossos recursos têm de estar absolutamente centrados na preparação de uma alternativa para oferecermos ao país e uma alternativa de programa político, de equipas, que permita recuperar a confiança de todos os eleitores que nos abandonaram nas últimas eleições legislativas”, defendeu.

Por sua vez, Nuno Melo, candidato à liderança do CDS-PP, exortou o líder dos democratas-cristãos a permitir que o congresso do partido se realize em novembro, para acrescentar que, com legislativas a 30 de janeiro, “havia tempo mais do que suficiente”.

“Faço um último apelo ao Francisco Rodrigues dos Santos para bem do nosso partido e do país, que tanto precisa de uma alternativa à direita: ajude a pacificar o CDS da única forma possível. Elejam-se os delegados no próximo fim de semana e realize-se o congresso nas datas agendadas de 27 e 28 de novembro, ou numa data consensual logo após", escreveu no Facebook e defendeu em declarações a diferentes órgãos de comunicação social.

Na expectativa de capitalizar estas dissensões no PSD e no CDS-PP estão a Iniciativa Liberal e o Chega.

c/ Lusa
PUB