O partido Livre condenou e exigiu hoje o "cabal e público esclarecimento" sobre a "involuntária ou voluntária" partilha de dados de três ativistas anti-Putin residentes em Portugal entre a Câmara de Lisboa e o regime russo.
Em comunicado, o Livre considera "muito preocupantes" as notícias reveladas na quarta-feira de que a Câmara Municipal de Lisboa (CML) partilhou com o regime russo, através da embaixada em Portugal, e em contacto direto com o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo, os dados pessoais de três ativistas anti-Putin.
"O LIVRE condena firmemente esta ação, quer tenha sido involuntária ou voluntária, e exige não só explicações sobre o sucedido, como um controlo atento e regularmente escrutinado da gestão de dados pessoais por parte da CML", refere esta força política.
Este partido pede que se garanta que "uma situação como esta não volta a acontecer" e "exige também um pedido de desculpas público aos três ativistas, bem como medidas que os protejam desta situação".
"Lisboa deve ser um porto seguro para todos os que lutam pela liberdade, pela paz e pelos Direitos Humanos. É inconcebível para o Livre que ativistas residentes em Portugal que lutam contra regimes autocráticos dos seus países de origem possam recear fazê-lo a partir de um país livre como Portugal", acrescenta-se no comunicado.
Na sequência deste caso, o candidato do PSD à Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, pediu já a demissão do presidente da autarquia, Fernando Medina, numa posição que tem estado a ser difundida nas redes sociais e na imprensa diária, depois de o Expresso ter noticiado que a CML tinha enviado para a Rússia dados de ativistas russos a residir em Portugal.
Entretanto, a Câmara de Lisboa anunciou hoje que alterou os procedimentos internos para manifestações por forma a salvaguardar dados pessoais de manifestantes, após uma queixa de ativistas russos que viram os seus dados partilhados com a Embaixada da Rússia.
"Foram alterados os procedimentos internos desde 18 de abril e, nas manifestações subsequentes para as quais foi recebida comunicação (Israel, Cuba e Angola) não foram partilhados quaisquer dados dos promotores com as embaixadas", justificou a CML em comunicado.
O caso dos ativistas russos reporta-se a 18 de janeiro, quando foi pedida autorização para uma concentração em solidariedade com o opositor russo Alexei Navalny, detido na Rússia, com vista à sua libertação.
No comunicado emitido hoje, a CML confirma que "conforme previsto na Lei (Decreto-Lei n.º 406/74), foram rececionados os dados dos três organizadores" e que essa informação foi "remetida pelos serviços técnicos da CML para a PSP/MAI e à entidade/local de realização da manifestação (no caso, embaixada de serviços consulares da Rússia), conforme procedimento geral adotado para manifestações".
Na sequência do reencaminhamento desses dados, a CML recebeu uma reclamação, em que se solicitava, ao abrigo do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD), o apagamento dos dados pessoais dos manifestantes relativamente à Embaixada russa/serviços consulares e outras entidades.
A autarquia desencadeou então "procedimentos internos com vista à análise da situação".
"Foi comunicado, ao abrigo da legislação em vigor, que as entidades recetoras deveriam proceder à eliminação dos dados", lê-se no documento.
A CML acrescentou ainda ter eliminado os dados pessoais e alterado os procedimentos internos para futuras manifestações, alegando que tem cumprido a lei portuguesa "de forma homogénea", com os mesmos critérios nestas situações, "independentemente do promotor ou destinatário".
"A CML lamenta que a reprodução de procedimentos instituídos para situações de normal funcionamento democrático não se tenha revelado adequada neste contexto. Ciente dessa realidade, os procedimentos foram desde logo alterados, em conformidade com o Regulamento Geral de Proteção de Dados, para melhor proteção do direito à manifestação e à liberdade de expressão, pilares fundamentais do Portugal democrático", lê-se no comunicado.
No entanto, a Câmara de Lisboa rejeita "de forma veemente" quaisquer acusações e insinuações de cumplicidade com o regime russo, considerando que a maioria dessas acusações tem apenas como propósito "o óbvio aproveitamento político a partir de um procedimento dos serviços da autarquia".