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Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP e candidato pela CDU António Pedro Santos - Lusa

Legislativas. Disponível para convergência, CDU quer derrubar a direita e reforçar o número de deputados no Parlamento

Depois de os partidos mais à esquerda do PS, como o Partido Comunista Português, terem chumbado o Orçamento de Estado para 2022, a CDU chega a estas eleições legislativas de forma determinada e confiante, com a preocupação de "tudo fazer para assegurar novos avanços". Reforçando o Compromisso Eleitoral de 2019, priorizando questões como o aumento do Salário Mínimo Nacional ou a gratuitidade das creches, a coligação formada pelo PCP e pelo PEV pretende reforçar o número de deputados na Assembleia da República e impedir o regresso da direita ao Governo português. E, embora os socialistas garantam que a “Geringonça” chegou ao fim e aparentem preferir uma aproximação aos sociais-democratas, Jerónimo de Sousa não rejeita a possibilidade de haver um novo acordo pós-eleitoral.


Se em 2015 as esquerdas se juntaram para derrubar a direita e impedir um novo mandato do PSD, agora as hipóteses parecem mais remotas. Mas reforçar e convergir são os termos centrais da campanha da Coligação Democrática Unitária para as eleições de 30 de janeiro.

Para o candidato da CDU, estas novas eleições são responsabilidade do Partido Socialista, que “ambiciona uma maioria absoluta” e “não queria encontrar soluções”.

Numa reunião do Comité Central do PCP, em novembro passado, Jerónimo de Sousa recordou que foi graças ao acordo com o PS e o Bloco de Esquerda que foi possível afastar “o PSD e o CDS do Governo” em 2015. E rejeitando a acusação de que com o chumbo do OE2022 o PCP “abriu a porta” a um acordo do Governo com a direita, o candidato pela CDU apontou o dedo a António Costa.

“Foi o primeiro-ministro que usou a expressão de meter a mão na maçaneta. E isso encerra uma opção e a possibilidade de repetir o que já vimos de maioria absoluta e bloco central. Há aqui um problema de facto, a que o primeiro-ministro poderá responder. Porquê esta pressa em meter a mão na maçaneta? O futuro dirá”
, afirmou na altura.

De facto, ao longo da campanha, o secretário-geral do PCP tem garantido que não se arrepende de ter chumbado o último Orçamento do Estado e mantém a porta aberta ao diálogo com o PS após as legislativas.
Convergência? Sim, mas “Geringonça” não se repete
Jerónimo de Sousa é, uma vez mais, o candidato pela CDU - Coligação Democrática Unitária – nas Eleições Legislativas. Na liderança do PCP desde 2004, o político e operário metalúrgico de profissão, é deputado na Assembleia da República desde 2005.

Filiado no Partido Comunista desde 1979, Jerónimo de Sousa já não é um novato na corrida ao Governo de Portugal. E, com um percurso de relevo na política e enquanto representante do “povo e dos trabalhadores”, aos 74 anos o secretário-geral do PCP volta a encabeçar a lista da CDU, formada pelo Partido Comunista Português e pelo Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV), incluindo normalmente membros da Associação de Intervenção Democrática (ID).

Quando a 13 de dezembro a CDU apresentou o seu Programa Eleitoral anunciou ser um desenvolvimento do mesmo “compromisso eleitoral de 2019”, reafirmando “a política alternativa, patriótica e de esquerda, como condição de resposta aos problemas do País e ao seu desenvolvimento”.



O compromisso eleitoral dos comunistas foi apresentado pelo membro da Comissão Central de Controlo Agostinho Lopes e incluiu “dez questões cruciais para a vida e o futuro do país”, que incluem aumento do salário mínimo nacional para 800 euros já no próximo ano e para 850 euros “a curto prazo”.

Nas palavras do comunista, o programa eleitoral da CDU é uma reedição do de 2019, mas enquadrado com a realidade atual que se impôs, entretanto, por causa da pandemia, e com o que o partido considerou ser uma degradação acentuada das condições laborais e de vida dos portugueses.

“Dois anos depois, os impactos da Covid-19 confirmam e reforçam essa necessidade”, lê-se no documento eleitoral. “Tivesse o Governo PS adotado outras respostas a velhos e novos problemas, como o PCP propôs, a situação dos trabalhadores, do povo e do País seria hoje melhor".
"Neste contexto, as eleições de 30 de Janeiro constituem uma importante batalha política, em que se coloca como questão determinante a rutura e a mudança para essa política alternativa”.

Também numa entrevista à RTP, Jerónimo de Sousa garantiu que o PCP tem “sentido da medida” e que as propostas do partido fazem falta ao país, “aos trabalhadores e ao povo português”.

Nós verificámos nestes últimos seis anos que muitas das medidas que pareciam impensáveis de serem aplicadas” apenas o foram graças “à persistência e à determinação” do Partido Comunista, referiu.


Mas o primeiro objetivo para estas eleições é eleger deputados e, se possível, reforçar o número de representantes da CDU com assento no Parlamento.

“O nosso objetivo é reforçar a CDU em votos e mandatos”.
Em 2019, recorde-se, a coligação de esquerda conseguiu garantir o lugar de 12 deputados e, agora, reforçar esse número é “uma tarefa de grande exigência”.

E, em segundo lugar, a CDU traça como objetivo um eventual apoio a “um Governo PS”, mas isso depende do “programa socialista”.

Quanto à possibilidade de, à semelhança do que aconteceu em 2015, o PCP apoiar o PS a formar Governo, o líder comunista não se opõe a essa possibilidade.

“É nosso posicionamento (…) que o PS só não forma Governo se não quiser, em termos aritméticos”
, começou por dizer Jerónimo de Sousa na entrevista a Vitor Gonçalves.

Na altura, a campanha socialista ainda não tinha apresentado o seu programa eleitoral e Jerónimo reforçou: “Nós procuramos sempre convergências, mas nessas convergências o que é fundamental saber é quais são os conteúdos concretos”.

Contudo, e referindo-se ao fim da chamada “Geringonça”, deixou claro que “a história não se repete”, mesmo que possa haver "alguma semelhança”.

“O que nós continuamos a dizer em relação a qualquer Governo é que o projeto que apresenta aos deputados da Assembleia da República é que determinará uma posição”, explicou, adiantando que o PCP está sempre disposto ao diálogo com as forças democráticas.

Mais recentemente, num debate com António Costa transmitido na TVI, Jerónimo de Sousa afirmou que a sua relação com o candidato socialista não é de "inimigos" mas de "naturalmente, adversários políticos", lembrando que as críticas feitas ao PS são claras, mas também "na perspetiva de encontrar soluções".
Foto: TVI/Lusa

"Com certeza que existirão soluções possíveis", chegou a afirmar. "Não há aqui inimigos, não tenho discurso belicista. A nossa crítica [ao PS] é clara mas numa perspetiva de encontrar soluções".

E, perante a renitência do adversário em ponderar num eventual acordo com o PCP para ter maioria e de assumir não sentir confiança de que a "geringonça é uma solução estável", o candidato comunista continuou a defender que a CDU estava disponível para "convergências", visando "resolver problemas", "venham as propostas de onde vierem".

"Não faço futurologia, isso seria arrogância da minha parte", reiterou, contudo.
Impedir maiorias absolutas e "arranjos" entre PS e PSD
Para além do programa eleitoral oficial, apresentado pela CDU, a coligação candidata tem destacado que um dos objetivos para estas eleições legislativas é impedir as maiorias absolutas e os “arranjos entre PS e PSD em curso”.

Para as legislativas de 30 de janeiro, a CDU “reafirma a atualidade e validade do Programa Eleitoral de 2019, apresentando em simultâneo o presente ‘Compromisso Eleitoral – Com o PCP, soluções para Portugal’, em que se apontam razões e soluções, sem prejuízo de outros desenvolvimentos, dando visibilidade e resposta a Dez Questões Cruciais para a vida e o futuro do País”.

“Os anos de 2015 a 2019 corresponderam a uma nova fase da vida política nacional face à Legislatura que a antecedeu e a quatro décadas de uma trajetória inalterada de política de direita”,
lê-se no documento, numa referência à legislatura da “Geringonça”.

De acordo com a candidatura comunista, ao longo dos últimos anos concretizou-se “um caminho de defesa, reposição e conquista de direitos” e, agora enquanto Portugal enfrenta também as consequências da pandemia da Covid-19, os “problemas do país exigem uma outra política”.

“Há meios e recursos para a concretizar. Não o fazer acrescentará dificuldades e agravará a situação”.Por isso, as “soluções para os problemas do país exigem que, quer as maiorias absolutas, quer os arranjos entre PS e PSD em curso, sejam derrotados”. De acordo com o compromisso eleitoral dos comunistas esta é uma estratégia como “elemento decisivo” para “abrir caminho a uma política determinada pelos interesses dos trabalhadores”.

Na apresentação dos candidatos do círculo eleitoral de Bragança, em dezembro, Jerónimo de Sousa apelou ao voto na CDU para impedir uma maioria absoluta do PS.

"O país não precisa da falsa estabilidade das maiorias absolutas"."Este é o tempo para lembrar que cada voto na CDU é um voto que conta, como nenhum outro, para impedir a maioria absoluta que o PS ambiciona e também para impedir o regresso do PSD, sozinho ou com os seus apêndices atrelados ou ainda de mão dada com o PS", referiu.

Em Macedo de Cvaleiros, Jerónimo disse estar convencido de que com o reforço da votação na CDU, será "possível responder aos problemas do país", porque é a "resposta que pode trazer estabilidade à vida dos trabalhadores e do povo".

Tanto mais, salientou, que "como a história tão bem demonstra", a maioria absoluta "rapidamente se transforma num inferno de instabilidade na vida de quem trabalha".

Mesmo ao justificar o voto contra o último Orçamento do Estado, o Partido Comunista aponta, no compromisso eleitoral que o "caminho que o PS e o seu Governo há muito tinham em construção com o PSD, e no qual o Presidente da República se insere, teve, na sistemática convergência parlamentar em dezenas de processos legislativos, a confirmação do entendimento prevalecente entre estes dois partidos em questões fundamentais".

Evitar um possível bloco central como solução governativa emergente das eleições é um dos principais objetivos comunistas, que pode levar ao regresso da política de direita “interrompida em 2015” e representar o “afastamento do PCP de qualquer influência nas políticas seguidas”. Nas palavras referidas no compromisso comunista lê-se mesmo que “a dimensão dos problemas que o país enfrenta exige a adoção de uma política que rompa com a política de direita”.

“Exige a denúncia das opções do PS e do seu Governo. Exige o combate e confronto com os projetos reacionários que PSD e CDS, e os seus sucedâneos – Iniciativa Liberal e Chega – têm em curso”, continua o documento.
As dez questões cruciais do Programa Eleitoral
Começando por salientar que “Portugal é um país marcado por uma crescente desigualdade entre capital e trabalho”, a CDU enumera as “dez questões cruciais para a vida e futuro do país”, como: o aumento do Salário Minimo Nacional; a gratuitidade das creches; valorização das pensões e reformas dos mais velhos; a defesa do Serviço Nacional de Saúde e os direitos à Educação e à Cultura; o direito à habitação e à mobilidade; uma justiça independente e acessível no combate à corrupção; justiça fiscal; um ambiente saudável; e o desenvolvimento económico.

O aumento geral dos salários é a primeira questão apresentada no Compromisso Eleitoral da CDU, com vista a "dinamizar o mercado interno, para estimular a atividade económica e a produção nacional, garantir a sobrevivência das Micro, Pequenas e Médias Empresas (MPME), assegurar a permanência em Portugal da força de trabalho necessária ao desenvolvimento do País”. Para o PCP-PEV, Portugal “não tem futuro com um modelo económico que tem como fonte de competitividade os baixos salários e a precariedade”.

Nesse sentido, a CDU defende o aumento geral dos salários, “com um significativo aumento do salário médio, concretizando a convergência com a zona Euro em cinco anos”, assim como a “valorização das profissões e das carreiras”.

A subida do Salário Mínimo Nacional para 850 euros “a curto prazo, fixando o seu valor em 800 euros durante o ano de 2022”, é uma das maiores lutas do PCP reforçada agora neste compromisso eleitoral.
A CDU defende ainda o combate à “desregulação de horários, a prevenção e garantia dos direitos no trabalho por turnos” e a "redução geral do horário de trabalho para as 35 horas semanais, sem perda de remuneração nem de outros direitos”.

O segundo ponto em destaque no documento é a garantia dos direitos das crianças e dos pais, o défice demográfico, a emigração dos jovens.

“Investir na saúde, na educação e na qualidade de vida das crianças é construir um futuro melhor para todos”, frisa a CDU, que defende a “gratuitidade das creches para todas as crianças e a criação de uma rede pública de creches, ou soluções equiparadas, alargando em cem mil o número de vagas”.

A coligação de esquerda defende também o alargamento da rede pública de educação pré-escolar, “garantindo vaga a todas as crianças a partir dos 3 anos”, o aumento dos abonos de família e outros apoios aos jovens e o reforço e respeito “pelos direitos de maternidade e paternidade”.

Assegurar a dignidade dos idosos, combater a pobreza e as desigualdades, valorizando as reformas e pensões e os baixos salários, é a terceira questão crucial apresentada.

Sendo necessário garantir justiça social a “quem contribuiu (…) com uma vida inteira de trabalho, a CDU reconhece que deve haver uma “melhor distribuição da riqueza produzida” e solidariedade geracional. Assim sendo, propõe a atualização anual de todas as pensões, “assegurando a reposição e valorização do poder de compra”, a criação de uma rede pública de serviços de apoio e lares, e “o combate à pobreza e exclusão social, pondo fim aos salários e pensões que só garantem níveis de vida no limiar da pobreza”.

Com a pandemia e a crise no Serviço Nacional de Saúde na ordem do dia, o PCP exige como princípios fundamentais “um serviço público, universal, geral e gratuito, garantindo o seu adequado financiamento e a gestão pública, democrática e com autonomia das suas unidades".

E, nesta área, propõe que se fixe e aumente o número de profissionais de saúde no SNS para “garantir mais consultas, exames, cirurgias, médico e enfermeiro de família para todos” e que se acelere a compra de equipamentos auxiliares de diagnóstico e terapêutica para aumentar a capacidade de resposta do serviço público de saúde.

A luta pelos direitos à Educação e à Cultura é uma questão já antiga do partido, que pretende “combater a carência de professores e a precariedade docente” e criar incentivos para fixar estes profissionais nas regiões do país mais carenciadas, a eliminação das propinas no Ensino Superior e a criação da carreira de investigador com contrato de trabalho.

Na Cultura, a CDU propõe a atribuição de pelo menos um por cento do Orçamento do Estado e a criação de um Serviço Público de Cultura, erradicando a precariedade entre os trabalhadores do setor.
Reafirmar compromisso e reforçar deputados
Nas últimas Legislativas, em 2019, a CDU manteve-se como a quarta força política a nível nacional, com cerca de 6,33 por cento dos votos (ou seja, 332.473 votos) e elegendo, assim 12 deputados com assento parlamentar.

Agora, para as eleições marcadas para o próximo dia 30 de janeiro, listas da CDU são “compostas por 332 candidatos, homens, mulheres e jovens, do PCP, do PEV, da ID e por dezenas de independentes”.

A CDU foi fundada em 1987, com o nome de "Coligação Democrática Unitária" e a sigla (CDU), herdeira da Aliança Povo Unido (APU), e integrada pelo Partido Comunista Português (PCP), pelo Partido Ecologista Os Verdes (PEV) e por elementos da Associação de Intervenção Democrática - sendo o PCP a força dominante.

Entre 1987 e 1989, a coligação de esquerda concorreu a várias eleições com a sigla CDU, alterando-a então para PCP-PEV, sendo liderada por Álvaro Cunhal desde a sua fundação até 1991.

De 1995 a 2002, o político e economista Carlos Carvalhas esteve à frente do PCP e encabeçou as listas da CDU. Mas  uma crise interna do Partido Comunista Português, nos últimos anos do século XX, terá contribuído para a perda de expressão política que tem vindo a afetar a coligação político-partidária e, consequentemente, para a perda de alguns mandatos eleitorais.

Jerónimo de Sousa encabeça as listas da CDU em eleições legislativas desde 2005, tendo em 2019 obtido os mais baixos resultados eleitorais de sempre e perdendo cinco deputados. Por isso, na Legislativas de dia 30 de janeiro, a CDU pretende reforçar o número de deputados.