Depois de uma reeleição em 2019, o executivo de António Costa chega a estas eleições com a bagagem de quase dois anos de covid-19 e todas as consequências sociais e económicas que desta resultaram para o país. Em novembro, o Estado justificou com a pandemia e as despesas no Serviço Nacional de Saúde o défice de 6673 milhões de euros até outubro de 2021.
Os últimos tempos de governação socialista foram ainda marcados por escândalos, nomeadamente em torno do ministro da Administração Interna, que acabou por se demitir no início de dezembro.
Com essa pasta ficou a ministra da Justiça, em acumulação. Francisca van Dunem já avançou, porém, que vai abandonar a vida política, pelo que pelo menos dois Ministérios vão ficar com lugares por preencher caso se dê uma vitória socialista em janeiro.
Numa recente mensagem divulgada nas redes sociais, António Costa pediu que todos se mobilizem para dar uma maioria ao Partido Socialista.
“É fundamental garantir ao PS estabilidade por uma ação governativa para quatro anos. Dar força ao PS para podermos continuar a combater com sucesso a pandemia, para recuperar a economia, garantir um país próspero, justo, inovador. Um país onde todos possam viver melhor e com melhores salários”, apelou.
“As eleições nunca estão antecipadamente ganhas e, desta vez, precisamos mesmo de ganhar com maioria. É por isso necessário mobilizarmo-nos todos, mobilizar todos para irem votar no próximo dia 30 de janeiro. E, juntos, nós seguimos e conseguimos”.
As propostas socialistas para os próximos quatro anos
As 12 prioridades do PS
1. Crescer anualmente 0,5 p.p. acima da média europeia2. Reduzir peso da dívida pública no PIB até 2026
3. Alterar regime de recrutamento na carreira de professor
4. Garantir unidades de saúde familiar para 80% da população
5. Assegurar visitação pelos cuidados de saúde a idosos em lares
6. Aumentar para 80% peso das energias renováveis na eletricidade
7. Cresces gratuitas, de forma progressiva, até 2024
8. Aprovar até julho a Agenda do Trabalho Digno
9. Ponderar aplicação de semanas de trabalho de quatro dias
10. Aumentar em 20% rendimento médio por trabalhador até 2026
11. Apoiar 30 mil jovens nas áreas STEAM e em cursos profissionais
12. Aumentar em 25% número de empresas nacionais exportadoras
“Estamos unidos e temos objetivos muito claros: a defesa de um país melhor, o combate à pandemia e o relançar da economia, aumentando os salários médios”, lê-se na página oficial da candidatura de António Costa. “O nosso objetivo é o reforço da confiança dos portugueses”.
Na apresentação do programa eleitoral do PS, no início de janeiro, o secretário-geral do partido assumiu um compromisso: “O meu próximo Governo será um Governo mais compacto e será, verdadeiramente, uma task force ao serviço da recuperação do país”.
Para o recandidato a primeiro-ministro, essa recuperação “é a recuperação da economia de cada um: da economia das famílias, da economia das empresas”. “Este ano é um ano onde já vamos retomar o crescimento acima da média europeia”, assegurou.
As linhas gerais do programa eleitoral socialista, sob o lema “Juntos Seguimos e Conseguimos”, dividem-se em cinco pontos: boa governação, alterações climáticas, demografia, desigualdades e sociedade digital.
- Boa Governação: Economia, Saúde, Educação, Democracia
A primeira ambição socialista na área da boa governação é a de registar, até 2026, um nível médio anual de crescimento superior a pelo menos 0,5 pontos percentuais relativamente ao da média europeia e um ponto ao da média da zona euro.
O Partido Socialista quer ainda reduzir, nos próximos quatro anos, “o peso da dívida pública do PIB para valores inferiores a 110 por cento”.
Para António Costa, que no início de janeiro apresentou publicamente o programa, com este valor será possível “proteger a credibilidade internacional do nosso país, o futuro das próximas gerações e permitir ao país continuar a progredir”.
Na área da saúde, a boa governação vai no sentido de “construir ou modernizar até 2026 100 unidades de cuidados de saúde primários e construir as novas unidades hospitalares Central do Alentejo, Lisboa Oriental, Seixal, Sintra, Central do Algarve e a maternidade de Coimbra”.
Ainda na Saúde, o PS promete que as unidades de saúde familiar vão cobrir pelo menos 80 por cento da população na próxima legislatura. Garante ainda aumentar o número de camas em Cuidados Continuados, criar a Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde, para dirigir o SNS a nível central, e valorizar a carreira dos enfermeiros, repondo “os pontos perdidos aquando da entrada na nova carreira de enfermagem”.
Na Educação, os socialistas propõem construir um "Pacto Social para a Educação", para o qual procurarão “mobilizar os profissionais, os pais e encarregados de educação, os estudantes, os parceiros sociais e as forças políticas, a academia e as comunidades”.
Querem ainda “criar inventivos à aposta na carreira docente” em áreas do país onde a oferta é cada vez mais escassa, assim como “alterar o regime de recrutamento, introduzindo fatores de estabilidade reforçada quer no acesso à carreira, quer no desenvolvimento dos projetos pedagógicos”.
Na área da qualidade da democracia, o PS quer “criar as condições necessárias para a concretização do processo de regionalização”, realizando para isso um referendo em 2024.
- Alterações climáticas e mobilidade
As alterações climáticas são outro ponto-chave do programa socialista, que renova o compromisso de Portugal de reduzir, até 2030, as emissões de gases de efeito de estufa para 55 por cento dos valores atuais.
Até 2026, o partido de António Costa quer aumentar para 80 por cento o peso das energias renováveis na produção de eletricidade, “antecipando em quatro anos a meta estabelecida”.
Até ao final desta década, o PS ambiciona ainda reduzir em 40 por cento as emissões do setor dos transportes e mobilidade. Promete também desenvolver a rede de transportes “mais flexíveis e mais capazes de responder às necessidades dos territórios de baixa procura”.
- Demografia: Habitação e Trabalho
O terceiro ponto das linhas gerais do programa, a demografia, foca-se em respostas sociais que passam pela habitação, tema muito debatido em campanhas eleitorais recentes. O Partido Socialista quer, nesta área, disponibilizar até 2026 cerca de 26 mil fogos “para responder às situações de maior carência” e outros 6.800 fogos a custo acessível.
Pretende ainda duplicar o número de jovens abrangidos pelos instrumentos de apoio à habitação (Porta 65 Jovem e Programa de Arrendamento Acessível).
“Precisamos de ter um Governo de confiança, que abra novos horizontes de esperança e progresso na sociedade portuguesa”, disse no início deste mês António Costa. “É, por isso, fundamental termos uma agenda para as novas gerações, uma agenda para as famílias com filhos, uma agenda que tenha como pilares fundamentais a garantia de habitação acessível, a garantia de execução da nossa Agenda para o Trabalho Digno”.
Assim sendo, no que diz respeito ao trabalho o programa do PS prevê a aprovação, ainda este ano, da Agenda do Trabalho Digno. O partido quer também melhorar a regulação do trabalho temporário, prevenir o abuso do “recurso indiscriminado” a outsourcings, criminalizar o recurso ao “trabalho completamente não declarado” e reforçar os poderes da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT).
Para a promoção da qualidade de vida, os socialistas pretendem debater “novas formas de equilíbrio dos tempos de trabalho”, que podem passar por semanas de quatro dias ou pelo uso de modelos híbridos de teletrabalho.
- Desigualdades: Salários, Impostos e Pobreza
Uma das medidas mais esperadas desta candidatura diz respeito ao salário mínimo, depois de o PS ter sido por várias vezes acusado à esquerda de não realizar aumentos suficientes. Caso seja eleito, o partido de António Costa promete celebrar um acordo de concertação social para elevar até aos 900 euros o salário mínimo nacional em 2026.
O PS quer ainda aumentar, também até 2026, o rendimento médio por trabalhador em 20 por cento. “Nos próximos quatro anos, temos de ir mais longe e temos de andar mais depressa. Queremos agora crescer 20 por cento até 2026, para que daqui a quatro anos o peso dos salários no conjunto da riqueza nacional seja idêntica à média da União Europeia”, afirmou António Costa na apresentação das linhas gerais do programa.
O secretário-geral do Partido Socialista ressalvou, porém, que este esforço “tem de resultar de uma negociação em sede de concertação social, porque este aumento salarial, este aumento do salário da classe média, tem de ser obviamente sustentado nos ganhos de produtividade”.
Para isso, será criado um quadro fiscal adequado “para que as empresas
assegurem, a par da criação de emprego líquido, políticas salariais
consistentes em termos de valorização dos rendimentos, centrado na
valorização dos salários médios”.
Ainda na área do emprego, o candidato compromete-se com a “valorização do rendimento dos mais jovens”, num esforço partilhado entre empresas – por via da valorização salarial - e Estado - por via do alargamento do IRS Jovem, abrangendo mais jovens durante mais anos.
Quanto ao IRS, o PS quer uma revisão dos escalões, de modo a “desagravar os impostos sobre o rendimento das classes médias e assegurar uma maior equidade”.
O programa apresenta ainda medidas no sentido de combater a pobreza infantil e apoiar famílias com filhos, nomeadamente ao criar um “Complemento ao Abono de Família”. Esse complemento irá garantir a todos os menores de 18 anos em risco de pobreza extrema um apoio de 1.200 euros anuais.
Segundo o PS, as medidas de combate à desigualdade permitirão reduzir a taxa de pobreza para o conjunto da população para dez por cento em 2030 – o equivalente a menos 660 mil pessoas em situação de pobreza.
Para atingir a coesão territorial, o partido quer também reduzir “a disparidade da taxa de pobreza dos diferentes territórios até ao máximo de três pontos percentuais em relação à taxa média nacional”.
- Sociedade digital
O quinto e último ponto do programa socialista incide, em parte, sobre a Educação. O partido promete reduzir para menos de cinco por cento a "taxa precoce de abandono da educação" até 2030, querendo ainda aumentar para 70 por cento a população adulta que conclui o ensino secundário.
Está também nos planos do atual Governo, em caso de reeleição, aumentar a participação dos jovens no ensino superior, especialmente nas áreas STEAM (ciência, tecnologia, engenharia, artes e matemática).Pode ver ou rever aqui as linhas gerais do programa do Partido Socialista para as legislativas de 2022 e aqui o programa eleitoral completo.
Em cima da mesa encontra-se ainda a tentativa de “modernização do tecido produtivo”, aumentando, para isso, em 25 por cento o número de empresas nacionais exportadoras face a 2017. Desta forma, será atingido um volume de exportações equivalente a 53 por cento do PIB até ao final da década.
A modernização passa também pelo aumento, até 2030, do “peso das exportações de alta tecnologia para nove por cento das exportações totais de mercadorias”.
A despesa total no setor da Investigação e Desenvolvimento (I&D) será, assim, elevada para três por cento do PIB até 2030, sendo que 1,75 dessa percentagem caberá às empresas.
É ainda prometido o desagravamento seletivo do IRC e a criação de um quadro fiscal “adequado para as start-ups”.
Possíveis soluções de governabilidade
As últimas sondagens realizadas para a RTP pela Universidade Católica, a 7 de janeiro, colocam o Partido Socialista na liderança das intenções de voto para as legislativas, mas sem maioria absoluta.
A estimativa aponta para 38 por cento dos eleitores a votarem no PS, com o Partido Social-Democrata em segundo lugar, obtendo 32 por cento dos votos.
Uma das hipóteses de governação que tem vindo a ser debatida consiste num novo Bloco Central, com PS e PSD unidos na governação do país, ideia que a esquerda tem vindo a contestar por considerar que não é solução.
No final de dezembro, o próprio António Costa rejeitou quaisquer negociações de acordos de Governo de dois anos com o PSD de Rui Rio. “Esse é um cenário que nunca se colocará”, garantiu o atual primeiro-ministro, considerando que “o país precisa mesmo é de estabilidade durante quatro anos”.
Na apresentação do programa no início de janeiro, Costa insistiu que “não podemos andar de crise em crise, não podemos viver em governos provisórios de dois anos”.
Outra hipótese é a de uma renovada aliança entre os socialistas, o Bloco de Esquerda, o PCP e o PEV. Algo que pode, contudo, ser difícil de alcançar, depois de a esquerda ter considerado que António Costa “matou” a geringonça com a sua “obsessão pela maioria absoluta”, preferindo dar azo a uma crise política.
Num debate eleitoral na RTP, em janeiro, o ainda primeiro-ministro também se mostrou pouco confiante quanto a uma solução à esquerda. Para António Costa, “não há mortes definitivas, a não ser a própria morte”, mas, “nas atuais circunstâncias”, disse não sentir confiança de que uma nova geringonça seja uma solução estável.
Relembrando que, há dois anos, disse aos cidadãos não ver outra solução fora do quadro da geringonça, o secretário-geral do PS quis agora exercer “a mesma frontalidade”: “tenho de dizer aos cidadãos que, neste momento, não sinto confiança que essa é uma solução estável”, declarou.
As principais figuras da candidatura socialista
A figura número um desta candidatura às legislativas é o próprio PS, fundado em 1973 na cidade alemã de Bad Munstereifel, onde militantes da Ação Socialista Portuguesa e de diversos núcleos no estrangeiro, reunidos em Congresso, aprovaram com 20 votos a favor e 7 contra a transformação da ASP em Partido Socialista.
Na lista de fundadores do PS, elaborada em 1977 por Manuel Tito de Morais e Catanho de Menezes, constam mais de uma centena de nomes.
O primeiro secretário-geral do Partido foi Mário Soares, entre 1973 e 1986. Desde então passaram pela liderança socialista Vítor Constâncio, Jorge Sampaio, António Guterres, Eduardo Ferro Rodrigues, José Sócrates, António José Seguro e, por fim, António Costa.
O mais recente dirigente do PS é também, desde 2015, primeiro-ministro de Portugal. Nestas legislativas antecipadas, dá novamente a cara pelo partido. António Costa tem 60 anos e é licenciado em Ciências Jurídico-Políticas, estando há várias décadas inscrito na Ordem dos Advogados.
Entre 1991 e 2004 serviu como deputado à Assembleia da República, tendo passado depois para a presidência da Câmara Municipal de Lisboa, entre 2007 e 2015. Chegou também a ser vereador na Câmara de Loures.
Em 1995 tomou posse como secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, subindo a ministro em 1997. Dois anos depois, trocou a pasta dos Assuntos Parlamentares pela da Justiça, ocupando esse cargo até 2002.
António Costa passou também pelo Parlamento Europeu, acumulando as funções de deputado e vice-presidente, voltando a ser ministro entre 2005 e 2007, desta vez na pasta do Estado e da Administração Interna.
É secretário-geral do Partido Socialista desde 22 de novembro de 2014.
Outra figura de destaque do PS, neste momento, é José Luís Carneiro, secretário-geral adjunto e cabeça de lista por Braga nestas legislativas. Até à recente dissolução do Parlamento, era deputado da Assembleia da República pelo círculo do Porto.
No final de dezembro, em reação ao congresso do PSD, Carneiro sublinhou que “o PS é o grande partido do centro político e do centro-esquerda em Portugal”, pelo que apenas com uma “maioria clara, inequívoca e reforçada” dos socialistas será possível alcançar a “estabilidade, previsibilidade e segurança” de que o país precisa para enfrentar os desafios atuais.
Entre os outros candidatos do PS nestas legislativas estão figuras bem conhecidas da última legislação, entre as quais Marta Temido, atual ministra da Saúde e cabeça de lista por Coimbra, Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros e cabeça de lista de fora da Europa, ou Tiago Brandão Rodrigues, ministro da Educação que agora concorre por Viana do Castelo.
O PS entregou as listas de candidatos às eleições a 21 de dezembro, considerando-as “plurais e rejuvenescidas”, reunindo “uma ampla experiência de vida e capacidade política para responder ao momento exigente que o país atravessa”.