“A maior tragédia humana do Portugal democrático”. O primeiro-ministro referiu-se assim, no debate quinzenal realizado esta quarta-feira, ao incêndio de Pedrógão Grande. Uma vez mais confrontado pelo líder do PSD, Pedro Passos Coelho, com a denúncia de “falhas do Estado”, ocorridas “desde a primeira hora”, António Costa quis garantir que o Governo procurará poupar as populações atingidas pela calamidade ao “calvário da justiça”.
Passos Coelho voltou então à carga com a afirmação de que “é fundamental o apuramento de tudo o que se passou, de forma a evitar que possa ficar na opinião pública a perceção de que ficaram por apurar responsabilidades”.
As investigações em curso, acentuou o presidente do PSD, “não são para saber o que se passou nos últimos 40 anos”.
“Não se pode dizer que vários governos não possam ter responsabilidade”, continuou Passos, para acrescentar que tal constatação “não pode servir para concluir que a responsabilidade é todos e por isso não é de ninguém”.
“Desde a primeira hora há falhas do Estado, independentemente se era ou não evitável este acidente. O Estado falha quando tantas pessoas morrem nestas circunstâncias”, enfatizou o dirigente social-democrata, que esta semana protagonizou um episódio de acesa controvérsia política, ao invocar supostos casos de suicídio decorrentes da calamidade que se abateu sobre Pedrógão Grande, para corrigir horas depois essa declaração.
No hemiciclo, diante da bancada do Governo, o líder do PSD quis propugnar esta quarta-feira que, “se a política não servir para discutir tragédias, então não serve para nada”.
“Desde a primeira hora há falhas de Estado, independentemente se era ou não evitável este acidente. O Estado falha quando tantas pessoas morrem nestas circunstâncias”, insistiu, antes de perguntar se o Executivo apoiado à esquerda estará aberto a criar um mecanismo para responder financeiramente “tão rápido quanto possível” às famílias das vítimas mortais de Pedrógão.“Respostas não coincidentes”
Na réplica, o primeiro-ministro recordou que, perante “respostas não coincidentes” por parte das diferentes estruturas tuteladas pela Administração Interna, a ministra Constança Urbano de Sousa “solicitou a um laboratório que procedesse a uma auditoria global da rede SIRESP para saber como funciona e que problemas teve neste caso concreto”.
Costa disse aguardar ainda um relatório do Instituto do Mar e da Atmosfera para apurar se ocorreu um fenómeno meteorológico incomum no dia do incêndio, assim como o relatório da Guarda Nacional Republicana.
“Havendo responsabilidades do Estado, o Estado deve assumi-las”, quis frisar o chefe do Governo, lembrando em seguida que, quando caiu a Ponte Hintze Ribeiro, em Entre-os-Rios, tutelava a pasta da Justiça e que foi então divisada uma fórmula para um célere apoio às vítimas.
“Se e quando se confirmar que há uma responsabilidade do Estado, não hesito em repetir o mecanismo expedito para indemnizar as famílias”, prometeu, colocando a tónica na necessidade de poupar as populações ao “calvário da justiça”, expressão utilizada por Passos Coelho.
“Responsabilidade objetiva do Estado”
Pedro Passos Coelho diria, adiante, ter uma perspetiva diferente daquela que tem sido repetida pelo Governo: “Parece muito evidente que há responsabilidade objetiva do Estado, porque muitas pessoas morreram numa estrada nacional e por isso o Estado deve assumir responsabilidades”.
O líder laranja apelaria também a uma revisão da estratégia de combate aos incêndios florestais, dado que a época de incêndios está a principiar já com uma tragédia em pano de fundo. E do próprio discurso do poder executivo.
“Estas versões desencontradas que aparecem entre as instituições dão às populações uma sensação de intranquilidade e insegurança que deve ser minorado”, vincou.
António Costa responderia a Pedro Passos Coelho com o argumento de que o Estado “tem acorrido a todas as necessidades imediatas das populações”. Já quanto às responsabilidades, o primeiro-ministro reiterou a intenção de esperar pelas conclusões do inquérito.
“Quando falamos de vítimas, não falamos apenas das vítimas mortais e estas não são apenas as que morreram numa estrada. Há feridos e há vítimas de danos materiais. O Estado terá que indemnizar muito mais que o dano morte”, fez notar o primeiro-ministro.“Como foi possível?”
Por sua vez, a líder do CDS-PP abordou o que descreveu como a “frente” da recuperação da confiança nas estruturas do Estado.
“Querer andar em frente sem o apuramento total é mau”, afirmou Assunção Cristas, propondo-se, ao mesmo tempo, manter uma “postura construtiva”.
“Há tempo para os estudos, para as análises técnicas e reformas estruturais. É tempo da responsabilidade política”, propugnou, enunciando depois uma pergunta: ”Como é que foi possível acontecer esta tragédia?”.
“Essa não é a pergunta política, é a que qualquer pessoa faz”, redarguiu António Costa.
Assunção Cristas insistiria: “O que os portugueses não podem assistir hoje é ouvir vários serviços a dizer coisas incompatíveis entre si e não há ninguém que venha pôr ordem na casa”.
A líder dos democratas-cristãos perguntou ainda por que razão o comandante operacional nacional nunca assumiu o controlo do combate ao incêndio em Pedrógão Grande.
O primeiro-ministro negou ter permanecido em silêncio ao longo dos últimos dias. Recordou que colocou perguntas “logo na segunda-feira” e que desde então tem obtido respostas.
“Não calar ninguém nem esconder o que dizem”, sintetizou Costa.”A resposta política”
Assunção Cristas insistiria na necessidade de isolar responsabilidades políticas, uma vez que ”a coisa mais importante de assumir num caso onde morreram 64 pessoas é a resposta política”.
“Não é expondo as contradições da Administração Pública e expondo as fragilidades da coordenação que o senhor dá uma imagem de tranquilidade às populações e a garantia que isto não volta a acontecer daqui a 15 dias”, lançou.
“Eu pergunto primeiro. O método que eu sigo é o que qualquer responsável político deve seguir. Foi aliás o que aconteceu em 2003, o ano de maiores incêndios em Portugal”, devolveu o primeiro-ministro.
“A resposta política não é a resposta da invenção. É a resposta fundada na informação. Se me perguntarem sobre a origem do incêndio podia pôr-me aqui a especular, já ouvi várias versões. Quando eu aqui disser a origem do incêndio é por ser fundada tecnicamente”, reforçou, acrescentando que o número um da Autoridade Nacional da Proteção Civil, Rui Esteves, “esteve sempre no posto nacional”.
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