Felícia Cabrita denuncia ataque do PS ao jornal Sol

por RTP
"Eu não sei se os senhores têm entendido que há aqui um resquício não só salazarista mas também colonizador" Mário Cruz, Lusa

Felícia Cabrita acusou esta sexta-feira o PS de ter tentado “liquidar financeiramente” o jornal Sol. Ouvida pelos deputados da Comissão parlamentar de Ética, Sociedade e Cultura, a jornalista do semanário atribuiu ao partido de José Sócrates a “assunção de que o jornalismo é controlável” e questionou a posição do Procurador-Geral da República sobre as escutas.

O Partido Socialista está no centro de "uma tentativa clara e já conhecida de tentar novamente descredibilizar o Sol", ao questionar a composição do corpo de accionistas do jornal. Quem o afirma é a jornalista que assinou as últimas notícias do semanário sobre o envolvimento do Governo de José Sócrates num alegado projecto de controlo de órgãos da comunicação social. Para "mostrar transparência", Felícia Cabrita distribuiu pelos deputados fotografias dos accionistas da publicação - Joaquim Coimbra e dois empresários angolanos. "São pessoas que não se escondem", disse.

"São empresários angolanos que, felizmente, nos libertaram do peso que era a intenção, que havia por parte do Partido Socialista, de liquidar financeiramente o nosso jornal", enfatizou a jornalista, para logo questionar o "interesse" do partido de Sócrates "pelos accionistas": "Da parte do Partido Socialista há de facto uma assunção de que o jornalismo é controlável. Tanto o acham que o dizem agora ao contrário. Não percebo muito bem qual é o vosso interesse pelos accionistas. Não sei são racistas, não é? Não sei se são racistas. Como digo, eu não tenho um discurso político".

O comentário de Felícia Cabrita motivou protestos por parte dos deputados socialistas e levou o presidente da Comissão de Ética, Luís Marques Guedes, a pedir à jornalista "para não usar esse tipo de expressões, que são insultuosas das próprias pessoas".

"Resquício salazarista" e "colonizador"

Ouvido na quinta-feira pela Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, o antigo governante socialista Arons de Carvalho disse desconhecer a identidade dos proprietários do Sol, sustentando que "em nome da transparência seria importante saber". Na véspera, os deputados do PS haviam questionado o jornalista Mário Crespo e o antigo director do Público José Manuel Fernandes sobre a composição accionista do semanário.

Felícia Cabrita vê no "interesse" do PS uma estratégia para minar a credibilidade do jornal.

"A tentativa que se está a verificar, neste momento, é uma tentativa clara e já conhecida de tentarem novamente descredibilizar o Sol com esta questão curiosa, que é perguntar quem são os accionistas. Eu não sei se os senhores têm entendido que há aqui um resquício não só salazarista mas também colonizador", afirmou a jornalista.

"Plano sórdido"

A jornalista do Sol reconheceu, durante a audição parlamentar, que "nunca" foi alvo de "qualquer tipo de pressão, directamente, quer do primeiro-ministro, quer de alguém próximo do primeiro-ministro". Mas denunciou um conjunto de ataques pessoais que podem encaixar no conceito de pressão.

"Arranjaram um plano sórdido para denegrir a minha imagem com a colocação de determinadas notícias sobre a minha pessoa, insinuando relacionamentos com polícias e magistrados", apontou Felícia Cabrita, acrescentando que tem sido objecto da "forma mais vil de pressão sobre qualquer pessoa": "Se isto não é vil e não nos envergonha, como é que este tipo de pressão pode acontecer? Eu prefiro, já me aconteceu, ter uma arma apontada ao peito".

"Eu não sou pressionável e não tenho telhados de vidro. Já me conhecem", acentuou.

Felícia Cabrita questionou também o posicionamento de Pinto Monteiro face ao conteúdo das escutas do processo Face Oculta: "Como até há cartas anónimas, devem saber, que dão origem a inquéritos, eu pergunto se, com tudo isto e com mais que há, o Procurador-Geral da república não devia ter aberto um inquérito".

Pressões para "arrumar o assunto Freeport"

As pressões sobre o Sol, prosseguiu a jornalista, acentuaram-se com a publicação de notícias sobre o processo Freeport.

"Aquilo que sei é que terá sido comunicado, penso que a dois directores, a seguir a uma das várias notícias que eu escrevi sobre o Freeport, que ou arrumavam o assunto Freeport ou iriam tentar liquidar financeiramente o jornal. Penso que, sobre essa questão, nada melhor do que ouvir o José António Saraiva", declarou Felícia Cabrita.

Em entrevista ao Correio da Manhã, o director do Sol, José António Saraiva, adiantou ter sido "coagido" pelo Millennium BCP, por influência do Executivo socialista, para se abster de publicar mais notícias sobre o processo Freeport. A contrapartida seria a resolução das dificuldades de tesouraria experimentadas pelo Sol, num momento em que o BCP era credor e accionista da publicação.

A jornalista Felícia Cabrita foi o quinto nome chamado para as audições na Comissão de Ética, na sequência de um requerimento dos sociais-democratas para ouvir 25 personalidades. O ministro dos Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão, foi acrescentado à lista de audições por proposta do CDS-PP.

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