Às linhas de política orçamental vincadas nas últimas horas pelo ministro das Finanças, que em artigo no jornal Público se comprometeu com o acerto do défice, BE e PCP respondem com avisos. Catarina Martins adverte contra qualquer correção em baixa da meta para a derrapagem das contas públicas em 2018. Jerónimo de Sousa insta Mário Centeno a explicar por que razão “não há dinheiro para aumentos salariais” no Estado.
Catarina Martins avaliou como “muito infeliz” a frase “somos todos Centeno”, recentemente proferida pelo ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, no Parlamento.
Após uma reunião com economistas na sede do BE em Lisboa, dedicada a políticas económicas, ao Programa de Estabilidade e ao investimento público, Catarina Martins apelou a “que se mantenha o espírito de negociação, de convergência e de cumprir os compromissos que tivemos até agora na maioria parlamentar”.
A dirigente bloquista deixou claro que considera “muito importante que o Governo apresente um Programa de Estabilidade que seja consequente com as metas e o quadro macroeconómico” inscrito no Orçamento do Estado para este ano, viabilizado pelo Bloco.
O partido, afirmou ainda Catarina Martins, encara “com alguma preocupação” que Mário Centeno “anuncie já limitações ao que será o Orçamento do Estado para 2019 antes de iniciar as negociações com a maioria parlamentar”.
Foto: Manuel Fernando Araújo - Lusa
“Nós votámos um Orçamento do Estado de 2018 com uma trajetória de redução da dívida e do défice que foi negociada com a União Europeia nos termos exatos em que o PS e o Governo o quiseram fazer. E o Bloco não colocou isso em causa e negociou dentro dessas margens”, salientou.
“Vai ter de explicar”
No flanco dos comunistas, a inquietação é análoga. Durante um encontro com agentes artísticos no Teatro São Luiz, sobre o programa de apoio do Ministério da Cultura, Jerónimo de Sousa colocou em dúvida o “sucesso” reivindicado pelo titular da pasta das Finanças.“O problema está nas opções”, apontou Jerónimo de Sousa.
“Sucesso, diz o ministro das Finanças. Mas vai ter de explicar aos trabalhadores da Administração Pública por que afirma que não há dinheiro para aumentos salariais para trabalhadores que estão há oito, nove anos sem qualquer aumento”, instou o secretário-geral do PCP.
“Aos homens e mulheres da cultura, aos utentes do Serviço Nacional de Saúde, da educação, das infraestruturas, ou o sucesso é isso? Não ter respostas para os problemas estruturais que resolvam o problema do país?”, insistiu Jerónimo.
A ideia de que “não há dinheiro”, acentuou, é “das mais batidas, designadamente na Assembleia e nas conversas com o Governo”.
“O Governo hoje clama pelo sucesso ao nível do défice porque baixou mais do que ele próprio perspetivou. Dito assim parece um sucesso. Uma décima a mais significaria 200 milhões de euros. E 25 milhões de euros para a cultura seria zero vírgula qualquer coisa”, fez notar o dirigente comunista.
“Devemos isso a Portugal”
Em artigo de opinião que surgia esta segunda-feira nas páginas do Público, o ministro das Finanças alertava contra o regresso do país ao descontrolo das contas públicas e, na mesma medida, contra eventuais ameaças ao desempenho da economia.
“No final desta legislatura, face às condições iniciais que se caracterizaram por um sistema bancário em crise e em iminente resolução, em que imperava a falta de confiança, o pagamento de juros terá diminuído mais de 800 milhões de euros”, escreveu Centeno, para quem “não há nenhum indicador melhor do que este para sintetizar o sucesso da economia e da sociedade portuguesa, porque este é o único que chega mesmo a todos os portugueses”.
“E, podem crer, não o vamos colocar em risco. Devemos isso a Portugal”, comprometeu-se.Centeno escreve no Público que as prestações sociais ficaram a um milhão de euros do previsto.
Neste texto, o governante começa por sustentar que o país atravessa o melhor comportamento económico e financeiro em décadas e que deve estar preparado “para o futuro”, sem “perder mais uma oportunidade”.
Relativamente a compromissos firmados com a esquerda parlamentar para o ano passado, Mário Centeno aponta que o facto de “o conjunto da despesa com consumo intermédio, pessoal e corrente, num total de 36,2 mil milhões de euros”, ter ficado “51 milhões abaixo do previsto, um desvio de apenas 0,14%”.
Enumera, em seguida, o crescimento de 3,5 por cento na despesa com o Serviço Nacional de Saúde, sublinhando que, de fevereiro de 2015 a fevereiro de 2018, essa expansão foi de 13%.
Foto: Mário Cruz - Lusa
“Na escola pública, em 2017, a despesa com pessoal cresceu 1,6% e com bens e serviços cresceu 5,3%”, reforça, para acrescentar ser “pois falsa a ideia de que o défice tenha sido atingido por reduções do lado da despesa dedicada ao funcionamento dos serviços públicos”.
Para Centeno, em suma, “a trajetória de redução do défice deve ser equilibrada, mas efetiva”.
“Se em 2017 cumprimos essa redução com mais despesa na saúde, mais despesa na educação e menos despesa com juros, devemos manter esse equilíbrio no futuro. Para o conseguir, temos de manter a trajetória de redução da dívida, manter o esforço de racionalização e de eficiência da despesa pública”, propugna o ministro das Finanças, que dá como exemplo “a execução orçamental em 2018”.
c/ Lusa
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