Diniz de Almeida, um dos mais destacados operacionais da revolução de Abril, comandou também, no 11 de Março, a resistência do Ralis (Regimento de Artilharia de Lisboa) e foi um dos principais vencedores dessa jornada. O seu testemunho tem uma importância central para entender o 11 de Março.
Em declarações recentes a uma reportagem da RTP, o antigo piloto e golpista César Neto Portugal afirmara que os meios aéreos enviados em 11 de Março contra o Ralis apenas se destinavam a intimidar a sua guarnição. Diniz de Almeida responde às declarações de Neto Portugal, lembrando o fogo real aberto contra a unidade, o morto e os feridos que esse fogo causou, os estragos que produziu.
O próprio Diniz de Almeida esteve, juntamente com um soldado, a operar
uma metralhadora pesada. Não pode garantir que essa arma tenha acertado
nos aparelhos que sobrevoavam a unidade e sabe que nenhum deles foi
abatido. Mas também é certo que foram impedidos de cumprir a sua missão e
que nenhum dos helicópteros conseguiu aterrar dentro da unidade para aí
desembarcar as tropas que deviam tomá-la.
Do lado dos atacantes, o balanço da operação foi "vergonhoso", por se
tratar de uma tropa especial que atacava de surpresa um quartel
guarnecido por tropa normal, mas sem nada conseguir dos seus objectivos.
A inversão de papeis encontra-se condensada no episódio que protagonizou o próprio Diniz de Almeida, ao surpreender, pelas costas, um páraquedista que se julgava em posição de sitiante do Ralis. Diniz de Almeida poupou-lhe a vida e limitou-se a mandá-lo retirar.
Recordando o sangue que derramaram os
golpistas do 11 de março, Diniz de Almeida reage com desdém perante os
que algum tempo depois começaram a acusar a esquerda militar de algum
desabafo emitido na assembleia de 11 para 12 de março sobre o fuzilamento merecido pelos golpistas. E recorda também que muitas vezes essa virtuosa indignação vem dos
mesmos que aplaudiam os crimes de guerra cometidos pela tropa colonial.
Cita, a propósito, o seu livro "Ascensão, apogeu e queda do MFA" (vol.
I, pg. 65), onde se relata como um capitão comando se ufanava de cortar
as orelhas aos prisioneiros para fazer porta-chaves, e de fuzilá-los
para dissuadir a guerrilha de minar as estradas.
Mais, o mesmo capitão vangloriava-se de cortar a cabeça a cada
prisioneiro executado e de espetá-la num pau, para intimidar. E o
capelão, consultado sobre a moralidade deste procedimento, só se lembrou
de perguntar se a cabeça era cortada aos prisioneiros com eles em vida,
ou depois de serem abatidos. Respondida a pergunta, sentenciou que nada
havia a censurar à decapitação de um cadáver.
Do 11 de Março ao 25 de Novembro
Em poucos meses, alguns dos protagonistas da revolução mudaram radicalmente de atitude. O 11 de Março foi um ponto de viragem para muitos. Nesse dia, os páraquedistas que se renderam no Ralis foram mandados em paz e ficaram a digerir as lições da jornada. No 25 de
Novembro, iriam surgir na barricada oposta à que tinham ocupado no 11 de Março.
A nível individual também se conhecem casos comparáveis. Salgueiro Maia ia fazendo a sua aprendizagem e, no ambiente provinciano de Santarém, essa
aprendizagem era necessariamente lenta. Até ao 11 de Março as suas relações com o spinolismo não tinham ainda atravessado
situações-limite. Mas a intentona golpista desse dia contribuiu para aproximá-lo da esquerda militar, especialmente através de uma forte cumplicidade com Diniz de Almeida, com quem já tinha em Novembro um pacto de não-agressão.
No que se refere aos acontecimentos do próprio 25 de Novembro, Diniz de Almeida recorda ter assistido ao diálogo do major Arlindo Ferreira com Otelo, transmitindo-lhe uma mensagem dos páraquedistas e à resposta de Otelo, a avalizar a saída daquela unidade. Diniz de Almeida avisou Otelo que essa decisão iria necessariamente ter graves consequências. Disse-lhe que ele próprio iria para o Ralis, para ter a unidade pronta e aguardando ordens. Aguardou-as durante várias horas e, quando finalmente telefonou para o Copcon, comunicou-lhe o coronel Artur Baptista que Otelo tinha ido para casa e não atendia o telefone.
Diniz de Almeida contactou várias unidades como a Escola
Prática de Artilharia, depois a Escola Prática de Serviço de Material.
Mas foi-se apercebendo que a ausência de Otelo semeava a dúvida e a
incerteza.
Quando finalmente conseguiu contactar por telefone com Otelo, este já tinha ido entregar-se à Presidência da Repúblicase e já se encontrava lá detido. Deu-lhe a entender por meias
palavras que esperava, mais uma vez, alguma solução vinda do Ralis. Mas
Diniz de Almeida explicou-lhe que os estragos causados pelo próprio
Otelo já dificilmente poderiam ser reparados.