Oito em cada dez vezes que uma ave embate numa superfície transparente ou espelhada, essa colisão é fatal, estimou hoje a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, alertando para uma ameaça cada vez mais generalizada em Portugal.
A colisão das aves com superfícies transparentes ou espelhadas causa anualmente a morte a muitas centenas de milhões de aves por todo o mundo.
Esta causa não-natural é uma das ameaças menos estudadas e mais subvalorizadas na Europa, existindo pouca informação sobre as espécies afetadas e os principais fatores de risco em Portugal, avança o comunicado da SPEA.
Segundo a SPEA, esta ameaça tem vindo a tornar-se mais preocupante à medida que se generaliza a utilização de superfícies transparentes, como esplanadas, campos de padel ou protetores de autoestradas, e espelhadas, como fachadas e janelas de edifícios recentes.
A associação lançou, em outubro de 2023, uma iniciativa denominada ciência-cidadã, para que os cidadãos avisassem sempre que vissem uma ave a colidir ou que tivesse colidido com uma barreira transparente ou espelhada, através de um questionário. O objetivo era recolher informação para depois encontrar soluções para cada local crítico.
A partir do formulário disponibilizado ao público foram recolhidos 89 registos a reportar a colisão de 124 aves de 29 espécies diferentes.
Das observações efetuadas pelas pessoas estima-se que a taxa de mortalidade devido a colisões deste tipo seja de cerca de 82%, "um número alarmante", tendo-se verificado que 64% dos embates resultaram na morte imediata das aves.
Contudo, o relatório da SPEA destaca que a taxa de mortalidade pode estar a ser subestimado porque existem estimativas de que cerca de metade das aves que sobrevivem a este tipo de embates acaba por morrer nas horas seguintes, devido às lesões sofridas.
Com base nos dados recolhidos ao longo de um ano, existem algumas espécies que parecem ser particularmente sensíveis a esta ameaça.
No caso do guarda-rios, do gavião e do papa-moscas-preto, a morte por colisão com superfícies transparentes ou espelhadas corresponde a uma percentagem significativa da mortalidade não-natural.
Para além disso, as aves migradoras estão entre as mais afetadas -- além do papa-moscas-preto, outras migradoras como as toutinegras e felosas foram também impactadas.
"Uma parte significativa das colisões registadas foram em janelas espelhadas de moradias, pelo que os cidadãos também podem ter um papel importante para mitigar o impacto desta ameaça. Por essa razão, é também importante falarmos deste problema e de possíveis soluções", diz o técnico da SPEA responsável por coordenar esta iniciativa, Hany Alonso, em comunicado.
Com base nos dados recolhidos e em estudos internacionais, a SPEA recomenda que, "sempre que possível, se considere utilizar outros materiais, e que se evite em especial instalar superfícies transparentes e/ou espelhadas em áreas sensíveis como ribeiras, zonas húmidas, ou parques, jardins e outros locais com vegetação abundante".
Nas situações em que forem instaladas superfícies espelhadas ou transparentes, a SPEA apela a que se incluam medidas que "reduzam o risco de colisão, como instalar autocolantes ou películas anti-adesão para torná-las mais visíveis para as aves, estas devem ser instaladas no exterior da superfície, e cobrir toda a área".
A SPEA apela ainda às autoridades locais e às empresas para que adotem estas boas práticas e para que considerem este problema na elaboração de estruturas urbanísticas, de modo a proteger a avifauna nacional e preservar a biodiversidade.