Transparência Internacional. Portugal entre países com risco elevado de corrupção na Defesa

por Cristina Sambado - RTP
Reuters

Portugal está entre os países com risco elevado de corrupção no setor da Defesa, apesar de ter registado algumas melhorias relativamente a 2015, indica uma avaliação da organização Transparência Internacional.

Na avaliação feita pela Transparência Internacional (TI) a 86 países, Portugal surge no grupo com risco elevado de corrupção, com 44 pontos em 100 possíveis, abaixo da média europeia que é de 59 em 100.

A TI publicou esta terça-feira o relatório Government Defence Integrity Index 2020, que avalia, a nível global, a qualidade dos controlos institucionais para gerir riscos de corrupção nas instituições de defesa e segurança.

Relativamente aos dados de 2005, Portugal registou uma evolução positiva, com destaque para as áreas temáticas de risco político e de riscos associados à gestão do pessoal. No entanto, continuam-se a registar problemas ma prevenção e mitigação de riscos decorrentes de falta de fiscalização.


Fonte: Transparência Internacional

“A Assembleia da República continua a não exercer todo o espectro de poderes fiscalizadores que são a sua prerrogativa. A Comissão de Defesa Nacional, por exemplo, não fiscaliza a ação do Ministério da Defesa Nacional com o detalhe e distância que lhe compete”, frisa Karina Carvalho, diretora executiva da Transparência Internacional Portugal.

No que se refere à transparência, os dados indicam que persiste uma diferença acentuada entre o reporte público de informação pelo Ministério da Defesa Nacional e pelos diferentes ramos das Forças Armadas.

Segundo o relatório, “o esforço de publicação de dados pelo Ministério da Defesa Nacional no Portal da Defesa não é acompanhado pelo Estado-Maior-General das Forças Armadas, cuja presença pública é praticamente inexistente. Entre os ramos, o Exército tende a publicar mais informação, ao passo que a Força Aérea não o faz. Por fim, nenhuma das Direções-Gerais do Ministério da Defesa Nacional apresenta informação suficientemente detalhada sobre as suas atividades e boa parte da informação disponível está desatualizada”.

Em relação ao reporte público de informação pela idD Portugal Defence, que gere as participações sociais que o Estado Português detém nas empresas na área da Defesa, apesar de constituir um salto qualitativo face à Empordef, continua a ser insuficiente. Sendo uma área sensível e estratégica, a Base Tecnológica e Industrial de Defesa Nacional deve obedecer a critérios apertados de reporte público.

O documento considera que a área de risco operacional é aquela que mais se destaca pela negativa, com uma pontuação de zero pontos.

Num contexto em que a ação das Forças Armadas se desenvolve cada vez mais em teatros operacionais complexos, implicando cadeias logísticas com muitos intermediários e cadeias de comando, a inexistência de doutrina militar específica sobre riscos de corrupção é cada vez menos compreensível. Tanto o Conceito Estratégico de Defesa Nacional, em revisão, como o Conceito Estratégico Militar deveriam incluir secções específicas sobre prevenção e planos de mitigação de riscos de corrupção e de infrações conexas, que, como se viu até num caso recente, são absolutamente essenciais para garantir a integridade neste setor”, defende Karina Carvalho.

Para a diretora executiva da Transparência Internacional Portugal, “o Instituto de Defesa Nacional tem a responsabilidade de liderar a criação de massa crítica a respeito de riscos de corrupção no sector da defesa e de comandar um processo de reflexão e de reforma institucional que absorva as potencialidades de programas como o NATO Building Integrity ou o próprio Defence & Security Programme da Transparency International”.
62% dos países apresentam risco elevado
O relatório da TI revela ainda que 62 por cento dos países receberam uma pontuação global de 49/100 ou inferior, indicando um risco elevado a crítico de corrupção no setor da defesa em todas as regiões do mundo.

A Nova Zelândia lidera a tabela, com 85 pontos. No final da lista está o Sudão, com uma pontuação global de apenas cinco pontos, país em que, em outubro deste ano, os militares tomaram o poder num violento Golpe de Estado.

A pontuação média dos países do G20 é negativa: 49/100.


Fonte: Transparência Internacional

Em termos de salvaguarda contra a corrupção em operações militares, quase todos os países apresentam uma pontuação fraca. Nesta área, a pontuação média é de 16 pontos.

A TI salienta que a maioria dos países necessita de medidas anticorrupção “como pilar central no planeamento das suas missões”.


Entre os países que têm uma pontuação particularmente baixa nesta área estão países que contribuem ou lideram grandes operações militares internacionais, como os Estados Unidos (18/100), França (10/100) ou Bangladesh (0/100).

“Estes resultados mostram que a maioria dos setores de Defesa e Segurança em todo o mundo carecem de salvaguardas essenciais contra a corrupção. A corrupção no setor da Defesa mina as forças de defesa, enfraquecendo a sua capacidade de proporcionar segurança aos cidadãos, proteger as fronteiras nacionais e trazer a paz. Nos piores casos, a corrupção no sector da defesa tem o potencial de exacerbar o conflito, em vez de lhe dar uma resposta eficaz”, defende Natalie Hogg, diretora do Defence & Security Programme da Transparency International.Corrupção no comércio de armas
O relatório do Government Defence Integrity Index 2020 revela que 86 por cento das exportações globais de armas entre 2016 e 2020 são originárias de países com um risco moderado a muito elevado de corrupção nos setores de Defesa.

Os cinco maiores exportadores – Estados Unidos (55/100), Rússia (36), França (50), Alemanha (70) e China (28) – representaram 76% do total global.

E quase metade das importações globais de armas (49%) são feitas por países que registam um risco elevado a crítico de corrupção em matéria de Defesa.

Fonte: Transparência Internacional

Países que não permitem que os legisladores, auditores ou sociedade civil escrutinem os negócios de armas, nem fornecem dados significativos sobre a forma como escolhem as empresas a quem comprar ou se terceiros estão envolvidos.

Para a TI, “esta falta de transparência deixa a porta completamente aberta ao suborno, ao desperdício de dinheiro público e à descoberta de armas nas mãos de organizações criminosas ou grupos terroristas”.

Face o impacto devastador na vida humana e na segurança que a corrupção continua a ter através do comércio global lícito e ilícito de armas, a TI defende que “é vital que tanto os Governos exportadores como importadores tenham fortes medidas anticorrupção e que promovam a transparência no setor da Defesa”.

O relatório frisa ainda que, “os países com má pontuação têm salvaguardas fracas ou inexistentes contra a corrupção no setor da Defesa e são mais propensos a experimentar conflitos, instabilidade e abusos dos Direitos Humanos. Estes resultados surgem numa altura em que a despesa militar global aumentou para cerca de dois mil milhões de dólares anuais, alimentando a escala e a oportunidade para a corrupção”.

O Government Defence Integrity é a única avaliação global da governação e dos riscos de corrupção nos sectores da Defesa.

O GDI era anteriormente conhecido como o Índice de Defesa Governamental Anticorrupção. E passou por uma atualização importante para a versão de 2020, incluindo alterações à metodologia e à pontuação subjacente ao projeto. Isto significa que as pontuações globais dos países desta versão de 2020 não podem ser comparadas com as pontuações dos países das iterações anteriores.
PUB