Operação Miríade. Militares portugueses suspeitos de tráfico de diamantes, ouro e droga
A Polícia Judiciária desencadeou esta segunda-feira 100 buscas de norte a sul do país. Militares que integraram missões no estrangeiro são suspeitos de envolvimento em tráfico de diamantes, ouro e droga. Terão montado uma associação criminosa em torno das missões militares portuguesas, no âmbito da ONU, designadamente na República Centro-Africana. Foram feitas dez detenções.
A operação decorreu em Lisboa, Funchal, Bragança, Porto de Mós, Entroncamento, Setúbal, Beja e Faro, "contando com a participação de cerca de 320 inspetores e peritos da Judiciária".
"Está em investigação uma rede criminosa, com ligações internacionais, que se dedica a obter proveitos ilícitos através de contrabando de diamantes e ouro, tráfico de estupefacientes, contrafação e passagem de moeda falsa, acessos ilegítimos e burlas informáticas, tendo por objetivo o branqueamento de capitais", conclui o comunicado.
As Forças Armadas garantem que, depois de avaliadas as responsabilidades, "tomarão as devidas medidas sendo absolutamente intransigentes com desvios aos valores e ética militar".
“O comandante da FND relatou prontamente ao EMGFA a situação, tendo esta sido de imediato denunciada à Polícia Judiciária Militar (PJM) para investigação”, refere a nota enviada. A PJM comunicou ao Ministério Público, que nomeou como entidade responsável pela investigação a Polícia Judiciária.
“O que está em causa de momento é a possibilidade de alguns militares que participaram nas FND, na RCA, terem sido utilizados como correios no tráfego de diamantes, ouro e estupefacientes. Estes produtos foram alegadamente transportados nas aeronaves de regresso das FND a território nacional”, refere a nota enviada pelo gabinete do Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMFGA).
"Uma situação de projeção internacional"
Em Cabo Verde, onde cumpre uma visita oficial, o Presidente da República reagiu às notícias sobre a operação que visa militares portugueses. Marcelo Rebelo de Sousa sublinhou que as suspeitas investigadas pelas autoridades judiciais são "uma situação de projeção internacional" e de "prestígio das Forças Armadas".
"Normalmente, em território estrangeiro, não faço comentários sobre a situação portuguesa, mas aqui é uma situação de projeção internacional, de prestígio das Forças Armadas, nomeadamente numa intervenção neste continente", começou por afirmar o Chefe de Estado.
"Logo que houve a denúncia, no final de 2019, as Forças Armadas, elas próprias, através do Estado-Maior General das Forças Armadas, em colaboração com o Estado-Maior do Exército, desencadearam as investigações", assinalou Marcelo. "Segundo, a Polícia Judiciária Militar teve um papel nessas investigações. Terceiro, porque o âmbito era mais vasto, a Polícia Judiciária passou a intervir e a ter um papel fundamental nas investigações, ao longo de 2020 e 2021", prosseguiu.
"Quarto, a ideia é levar as investigações o mais longe possível, para apurar o que se passa, confirmar se sim ou não são casos isolados e portanto não afetam em termos de prestígio, que está incólume", disse ainda o Presidente, que insistiu na ideia de este processo "não atinge minimamente o prestígio das Forças Armadas portuguesas.
“Não afeta a nossa imagem internacional”
Questionado pelos jornalistas sobre esta operação judicial, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, quis afiançar que “não afeta a imagem internacional” do país.
“Se as autoridades judiciais entendem que há indícios que exigem investigações, essas investigações devem ser feitas. Vigora o princípio da separação de poderes, por isso não tenho nada a dizer sobre investigações em curso”, acrescentou o governante, que colocou a tónica no facto de “o papel desempenhado por militares portugueses” ser internacionalmente reconhecido. “Não trato indícios como se fossem factos apurados”, enfatizou Santos Silva.
“Investigações são muito importantes”
Por sua vez, o secretário de Estado adjunto e da Defesa Nacional veio afirmar que “as investigações são muito importantes” para a credibilidade das instituições militares.
“Como é evidente, vivendo nós num Estado de Direito e existindo separação de poderes, estas questões devem ser investigadas de uma forma absolutamente clara, para defender o interesse público, e, portanto, desse ponto de vista, nós observamos com toda a atenção no Governo como é que estas investigações estão a ser feitas, porque elas são muito importantes, nomeadamente para mantermos com toda a credibilidade e com todo o bom-nome todas as instituições militares”, declarou aos jornalistas Jorge Seguro Sanches, numa deslocação à Marinha Grande.
Admitindo que, “por vezes, em todas as organizações, poder haver uma situação menos clara ou outra”, o secretário de Estado contrapôs que é “nessas situações que as autoridades devem investigar”.
Seguro Sanches afiançou ainda que, “logo que houve algumas suspeitas sobre esta situação, os órgãos próprios passaram a fazer essa investigação e este resultado está agora a funcionar”.
“Neste âmbito, existe uma estrutura que é Polícia Judiciária Militar que, desde o início, está envolvida, precisamente na investigação destas situações”.
“Aquilo que nós observamos é, com toda a tranquilidade, as instituições a funcionar, a esclarecer aquilo que têm de esclarecer e a atuar se for caso disso nesta situação”, estimou o governante.