SNS insatisfaz três em quatro médicos da Região Norte

por Carlos Santos Neves - RTP
Foi esta segunda-feira divulgado o estudo <i>A carreira médica e os fatores determinantes da saída do Serviço Nacional de Saúde</i> Regis Duvignau - Reuters

Três em cada quatro médicos do norte do país mostram-se desagradados com as condições laborais do Serviço Nacional de Saúde, mais de um terço dos profissionais trocaram o sector público pelo privado e perto de metade dos internos admitem emigrar. São estas as conclusões de um estudo realizado em colaboração com a Ordem dos Médicos, que apela à tutela para que reveja as carreiras.

O estudo A carreira médica e os fatores determinantes da saída do Serviço Nacional de Saúde é assinado por Marianela Ferreira, do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto.

Ouvida pela agência Lusa, a investigadora sustenta que “a amostra é robusta” e “dá uma perceção de consistência relativamente aos resultados obtidos”. E recorda que as respostas foram voluntárias.
Mais de dois mil médicos, num universo potencial de mais de 13 mil inscritos na Secção Regional Norte da Ordem em 2016, responderam às perguntas formuladas neste estudo.

Uma análise a cerca de 1400 rendimentos de especialistas do Serviço Nacional de Saúde revelou que quase 47 por cento auferem menos de três mil euros brutos por mês, 20 por cento recebem entre três mil e 3500 euros mensais, dez por cento entre 3.500 e quatro mil euros, 7,8 por cento de quatro mil a 4500 euros, oito por cento auferem cerca de cinco mil euros e 7,3 mais de cinco mil euros mensais.

Os clínicos inquiridos mostram-se insatisfeitos com os rendimentos. Todavia, aqueles que escolhem emigrar, reformar-se antecipadamente ou rumar ao sector privado não o referem como causa primordial. São, antes de mais, referidos o número de horas de trabalho, “muito frequentemente acima das horas contratualizadas”, e a ausência de possibilidades de progressão na carreira.

“Apesar desta insatisfação generalizada com a remuneração, não se revelou um aspeto impulsionador da saída do SNS ou, em caso de aumento, de incentivo à permanência”, conclui o estudo, cujo conteúdo é revelado esta segunda-feira pela imprensa e pela Lusa.

Mais de 60 por cento dos médicos especialistas inquiridos disseram-se insatisfeitos ou muito insatisfeitos com o número de horas de serviço. A insatisfação cresce para 74 por cento no que diz respeito ao tempo disponível para família e lazer.
Destinos: privado ou emigração

Do estudo sobressai também o facto de mais de um terço dos médicos inquiridos na Região Norte ter trocado o SNS pelo sector privado. Outro dado a ressaltar é o de que metade dos internos admite emigrar, uma vez concluído o internato da especialidade.Cerca de 80 por cento dos médicos inquiridos mostraram-se satisfeitos ou muito satisfeitos em matéria de relacionamento com os colegas.


A fase do estudo que avaliou os clínicos que deixaram o Serviço Nacional de Saúde recolheu 812 respostas: 36,1 por cento dos médicos escolheram o privado em regime de exclusividade; cerca de 43 por cento passaram à reforma e sete por cento emigraram.

Quanto às idades, os médicos que optaram pelo sector privado rondava os 50 anos, aqueles que se reformaram tinham em média 68 anos os que emigraram tinham 40 anos.

Participaram no estudo perto de uma centena de internos. Quase 20 por cento indicaram a vontade de abandonar o SNS após o internato e mais de 40 por cento disseram-se indecisos, sendo que pouco mais de um terço afirmaram que “provavelmente” ou “definitivamente” ficarão no público.

Em suma, cerca de metade dos internos admitiu ponderar a emigração depois do internato da especialidade e só 11 por cento afiançaram que nenhuma remuneração os levaria a exercer no estrangeiro.
“Uma questão central”

Igualmente ouvido pela Lusa, sobre as conclusões do estudo de Marianela Ferreira, o bastonário da Ordem dos Médicos sublinhou receber, a um ritmo diário, chamadas de clínicos a um passo de deixar o SNS. Miguel Guimarães exorta mesmo o Ministério da Saúde a rever as condições da carreira.

“Todos os dias recebo chamadas de médicos que já emigraram, pretendem emigrar ou daqueles que vão trabalhar no sector privado. E o motivo tem a ver com uma questão central que são as condições de trabalho, que envolvem vários fatores que podem determinar a continuidade ou não das pessoas no Serviço Nacional de Saúde”, explicou o responsável.

“Nos últimos anos a carreira médica não tem tido aplicação prática”, reforçou.

O bastonário referiu, a título de exemplo da falta de aplicação da carreira médica, o caso do concurso hospitalar para médicos que concluíram em março a especialidade – o processo ainda não teve início.

Miguel Guimarães lê o estudo agora conhecido como uma “chamada de atenção” ao ministro Adalberto Campos Fernandes. A Ordem dos Médicos quer mesmo estender a avaliação às demais regiões.

c/ Lusa
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