À chegada ao Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em Santarém, onde é julgado um pedido de impugnação de uma contraordenação do Banco de Portugal, Ricardo Salgado foi questionado pela RTP sobre os últimos desenvolvimentos da Operação Marquês. O ex-número um do BES denunciou o que considera ser uma violação constante do segredo de justiça para “formar a opinião pública” contra si.
“Aquilo a que eu assisti é que o segredo de justiça é constantemente violado, não por mim. Vem nitidamente no sentido de tentar formar a opinião pública contra a minha pessoa. Mas eu estou de consciência completamente tranquila”, acrescentou.
O ex-patrão do Grupo Espírito Santo regressou esta segunda-feira a tribunal.
Ricardo Salgado interpôs um pedido de impugnação de uma contraordenação que lhe foi aplicada pelo Banco de Portugal. A ação está a ser julgada pelo Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em Santarém. Quanto a este processo, o antigo banqueiro diz ter sido alvo de um “suposto julgamento completamente parcial”.
Em causa está uma multa de quatro milhões de euros aplicada ao antigo banqueiro – a decisão do supervisor da banca remonta a agosto de 2016. O Banco de Portugal inibiu também Ricardo Salgado do exercício de cargos em instituições financeiras por uma década.
Entre os argumentos invocados pelo banco central está o facto de Ricardo Salgado ter autorizado a comercialização de títulos de dívida da Espírito Santo Internacional junto de clientes do BES, quando a entidade se encontrava já com um quadro líquido negativo.
“Tudo valeu”
O Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão está a julgar desde 6 de março o pedido de impugnação interposto por Ricardo Salgado e o recurso de Amílcar Pires, condenado ao pagamento de 600 mil euros e à inibição de cargos financeiros por três anos. Já José Maria Ricciardi, a quem foi aplicada uma coima de 60 mil euros – suspensa em três quartos por cinco anos -, desistiu do recurso.
No pedido de impugnação, citado pela agência Lusa, Salgado aponta o dedo ao Banco de Portugal, para lamentar, por exemplo, o anúncio das medidas de resolução ao BES em conferência de imprensa, três dias depois da deliberação de instauração do processo de contraordenação. O que, a seu ver, constituiu uma “condenação antecipada e anunciada em plena praça pública”.
O antigo banqueiro invoca também a ausência de gravação das inquirições antes da acusação, criticada pela Relação de Lisboa, o impedimento de produção de prova, a “delação premiada”, a autorização de perguntas a determinados mandatários, em detrimento de outros, e a absolvição de arguidos, apesar de se dar como provado que estes estavam ao corrente da falsidade das contas da ESI.
“Tudo valeu”, escreve a defesa de Salgado no pedido de impugnação contra “um julgamento em causa própria, mas também em casa própria”, durante o qual foram tidos em conta elementos sem credibilidade e ignorados outros “que impunham uma absolvição”.
“Falta de imparcialidade”
No mesmo pedido de impugnação, Ricardo Salgado recua a entrevistas em que o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, adiantou detalhes sobre a decisão final, “quando os arguidos ainda estavam a abrir o envelope da notificação”.
“Esta chocante falta de imparcialidade não pode continuar a ser ignorada e tem de ter as necessárias consequências jurídicas, nomeadamente a nível constitucional. Também suscita questões de inconstitucionalidade o modelo que permite ao BdP acumular poderes de supervisão, entidade de resolução e de ação sancionatória”, argumenta.
Nos termos do processo, igualmente consultado pela Lusa, o antigo homem forte do Grupo Espírito Santo foi acusado da prática de atos dolosos de gestão ruinosa praticados em detrimento de depositantes, investidores e credores. Também por situações como a comunicação ao supervisor de um aumento do valor do ativo da ESI em mil milhões de euros “que sabia não existir, deste modo ocultando a falência técnica e insustentabilidade da ESI e o impacto que teria nas diversas entidades financeiras do GES e condicionando a avaliação da suficiência e adequação das medidas adotadas pelo BdP”.
c/ Lusa