Prossegue esta quarta-feira o julgamento do Grupo Espírito Santo. Neste segundo dia, o tribunal vai começar a ouvir a gravação de um interrogatório a Ricardo Salgado na fase de inquérito.
Este depoimento foi dado antes de haver uma acusação do Ministério Público e antes de ter sido diagnosticada a doença de Alzheimer a Ricardo Salgado. É por isso considerada uma gravação crucial.
A gravação será ouvida em segmentos ao longo das primeiras sessões do julgamento.
Para este segundo dia de julgamento está também prevista a conclusão das exposições introdutórias dos advogados dos arguidos. Faltam identificar três dos 18 arguidos neste caso.
O julgamento do maior processo da justiça portuguesa começou na terça-feira. Ricardo Salgado compareceu no Campus de Justiça para responder a acusações de crime, apesar da defesa ter pedido a dispensa do arguido.
O antigo banqueiro chegou visivelmente debilitado, acompanhado pela mulher e pelos advogados, e foi abordado por um dos lesados do Banco Espírito Santo. Ricardo Salgado foi identificado e acabou por ser dispensado de todas as audiências pelo coletivo de juízes.
“Abriu-se uma página negra na Justiça”
No Campus de Justiça, em Lisboa, o advogado de defesa do antigo banqueiro criticou o coletivo de juízes por ter rejeitado o requerimento para que Ricardo Salgado fosse dispensado de estar presente no início do julgamento por causa do diagnóstico de Alzheimer.
"Abriu-se uma página negra na justiça portuguesa", disse Francisco Proença de Carvalho. “Sabemos como estas pessoas [com demência] são tratadas no mundo civilizado e ficamos a saber como é que são tratadas, pelos vistos, no mundo incivilizado”, acrescentou.
Na terça-feira, os 15 dos 18 arguidos que foram identificados não prestaram declarações.
No tribunal estiveram várias importantes figuras do Grupo Espírito Santo, nomeadamente o ex-braço direto de Ricardo Salgado, Amílcar Morais Pires antigo contabilista do grupo Francisco Machado da Cruz e o primo de Salgado, Manuel Fernandes Espírito Santo.
As defesas negam que tenham feito parte de qualquer associação criminosa liderada pelo antigo presidente do GES. Já o Ministério Público insiste que o grupo foi liderado de forma autocrática por Salgado.
Vários lesados do BES marcaram presença no exterior do tribunal do primeiro dia do julgamento. Ricardo Sá Fernandes, advogado do primeiro lesado que apresentou queixa contra o Grupo Espírito Santo, pediu justiça mas não a todo o custo, afirmando que o estado de saúde de Ricardo Salgado não pode ser ignorado.
“Não podemos querer fazer justiça à custa de valores fundamentais da pessoa humana”, disse o advogado aos jornalistas. “Ricardo Salgado tem de responder patrimonialmente por aquilo que fez, mas do ponto de vista criminal eu entendo que a sua responsabilidade tem que ser avaliado em função da situação em que ele está, e todos vimos como é que ele está”, acrescentou.
Segundo o Ministério Público, a derrocada do GES terá causado prejuízos superiores a 11,8 mil milhões de euros. Dez anos depois, há 104 lesados e dois arguidos que já morreram.
Ricardo Salgado é o principal arguido no processo BES/GES e responde em tribunal por 62 crimes, alegadamente praticados entre 2009 e 2014.
Entre os crimes imputados contam-se um de associação criminosa, 12 de corrupção ativa no setor privado, 29 de burla qualificada, cinco de infidelidade, um de manipulação de mercado, sete de branqueamento de capitais e sete de falsificação de documentos.
c/ Lusa