PGR: Novo relatório sobre incêndios vai ser considerado nas investigações em curso

por RTP
Lusa

O relatório sobre os incêndios registados em outubro vai ser considerado no âmbito do inquérito aberto na altura pelo Ministério Público, disse à Lusa a Procuradoria Geral da República (PGR), adiantando que não existem arguidos constituídos.

"As investigações relacionadas com os incêndios de outubro prosseguem. Estas investigações, desde logo as respeitantes a incêndios com vítimas mortais, não têm arguidos constituídos", refere a PGR em resposta à agência Lusa.

Relativamente ao relatório da comissão técnica independente, entregue na terça-feira, no parlamento, a PGR adianta que "será considerado no âmbito das investigações em curso, sem prejuízo de outros procedimentos que, em resultado da respetiva análise, se imponham".

Em outubro, o Ministério Público instaurou inquéritos autónomos nos Departamentos de Investigação e Ação Penal (DIAP) das comarcas onde ocorreram os incêndios.

A comissão técnica independente criada para analisar os grandes incêndios rurais de 2017 entregou, na terça-feira, no parlamento, o relatório dos fogos de outubro (dias 14, 15 e 16), envolvendo oito distritos das regiões Centro (Aveiro, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria e Viseu) e Norte (Braga e Viana do Castelo).

O número de total de ignições (de fogachos e de incêndios florestais e agrícolas) iniciadas nos dias 14, 15 e 16 e registadas no Sistema de Gestão de Informação de Incêndios Florestais, do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, "foi de 206, 495 e 213, respetivamente".

A comissão técnica referiu ainda que o panorama vivido nesses dias traduziu-se "numa situação de dramático abandono, com escassez de meios, ficando as populações entregues a si próprias".

Os fogos de outubro revelaram também, segundo a análise, dificuldades dos municípios para liderar procedimentos relacionados com a emergência e o socorro, considerando-se ainda que o apoio das Forças Armadas no combate às chamas "ficou aquém do desejável".

Governo não autorizou reforço de meios

O relatório da Comissão Técnica Independente sobre os incêndios de outubro revela que a Autoridade Nacional de Proteção Civil pediu um reforço de meios para combater os incêndios em outubro de 2017 devido às condições meteorológicas, mas que não obteve “plena autorização a nível superior”.

Segundo o documento, "na audição ao segundo comandante operacional nacional, que à data desempenhava interinamente as funções de comandante operacional nacional, foi-nos referido que, atendendo às condições meteorológicas que se previam, deveria haver um conjunto de reforço de meios, que foram solicitados, mas que nem todos obtiveram, por diversas razões, plena autorização a nível superior".


Aquando dos incêndios, o dispositivo de combate estava em "plena fase Delta, em que os meios disponíveis e a capacidade instalada é francamente menor do que a prevista e planeada" para a fase Charlie, que costuma decorrer entre 1 de julho e 30 de setembro.

A Proteção Civil propôs para reforço do dispositivo para a fase Delta, entre 1 e 15 de outubro, 105 equipas de combate, tendo sido autorizadas 50, tendo também sido recusadas 200 horas de voo suplementares para duas parelhas de aviões anfíbios médios e 40 operacionais para a Força Especial de Bombeiros (FEB), e ainda uma parelha de aviões anfíbios médios e quatro meios aéreos. Os incêndios de 2017 provocaram mais de 100 mortos e mais de 250 feridos.

O relatório da comissão técnica independente adianta que, a 10 de outubro, foi proposto novo reforço de meios, tendo sido aprovadas 164 equipas, o acréscimo de 70 horas de voo para aviões anfíbios médios e o prolongamento de locação de oito helicópteros médios até 31 de outubro, mas foi recusado o aluguer de quatro aviões anfíbios médios para 13 a 31 de outubro.

"Depois do período em análise, já foi autorizada a locação de 15 helicópteros ligeiros, com início a 17 de outubro", indica o documento da comissão.

O mesmo relatório refere igualmente que a ANPC determinou "a elevação do estado de prontidão e grau de mobilização", mas no âmbito das suas competências não acompanhou "o mesmo nível de alerta, nomeadamente quanto à mobilização de meios aéreos".

Os peritos sublinham ainda que os meios preposicionados ficaram "muito aquém das necessidades, ainda que reactivamente, no decorrer do dia 15 outubro e mais particularmente no dia 16 de outubro, se tenha conseguido mobilizar mais alguns grupos de reforço".
Negligência da EDP apontada como causa na Lousã
O relatório da Comissão Técnica Independente revela também que o fogo na Lousã teve causa negligente e a origem pode estar no não cumprimento pela EDP do regulamento de segurança das linhas elétricas. A empresa já negou essa possibilidade e anunciou que vai enviar documentação aos elementos da comissão.

Segundo o relatório da Comissão Técnica Independente, que tem como fonte o Sistema de Gestão de Informação de Incêndios Florestais do Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), a causa do incêndio que teve início no dia 15 de outubro na Lousã e se espalhou a nove concelhos é negligente e tem como ponto de origem as linhas elétricas.

A EDP Distribuição tem 84 000 quilómetros de linhas aéreas de Alta Tensão, das quais 26 000 quilómetros atravessam zonas florestais.
"A ignição com origem nas linhas elétricas, neste caso particular em que terá sido provocada por queda de árvore sobre uma linha de média tensão, pode resultar do não cumprimento do regulamento de segurança das linhas elétricas pela entidade gestora, a EDP", frisa o documento.

Os técnicos da comissão referem que em causa está "a distância mínima de segurança dos condutores [linhas elétricas] às árvores", que não terá sido cumprida.


"Trata-se, neste caso, de situações devidamente regulamentadas e cujo cumprimento pode só por si evitar situações deste tipo e todas as suas consequências", explicam ainda os técnicos.Esta é a segunda vez que a EDP é apontada nos relatórios de análise dos incêndios, sendo que no primeiro caso foi no documento elaborado pelo especialista Xavier Viegas para analisar os incêndios de junho, nomeadamente o fogo de Pedrógão Grande.

A EDP garante que tem sistemas que monitorizam, em permanência, todos os eventos relativos às linhas elétricas, havendo registos disponíveis.

Segundo a EDP, toda a informação de que dispõem “permite afirmar inequivocamente que não ocorreu qualquer incêndio associado a queda de árvores sobre a rede na zona da Lousã”.

A empresa argumenta que o “único evento registado respeita à queda de uma árvore de grande porte (11 metros) localizada fora da faixa de proteção da EDP Distribuição, cuja queda sobre a linha de Média Tensão não originou qualquer incêndio”.

A empresa acrescenta que a árvore foi removida pelas equipas operacionais da EDP Distribuição duas horas após a queda, não se registando qualquer incêndio.

A EDP garante cumprir a legislação que obriga à constituição e proteção de corredores e Faixas de Gestão de Combustível, despendendo anualmente cinco milhões de euros nos 7.500 quilómetros que gere e adianta que fazem ainda supervisão com recurso a meios aéreos, tecnologia laser e drones.

C/Lusa

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