Num mundo onde a necessidade de consumo é uma constante, o plástico é um dos subprodutos derivados do petróleo mais utilizados. Desde os componentes e equipamentos eletrónicos, estruturas, vestuário ou embalagens de conservação alimentar, o plástico é para muitos um milagre. Mas é também um "mal" necessário. Um dos principais problemas é a eliminação.
Embora a indústria já recicle uma boa percentagem deste tipo de resíduo, o certo é que essa solução, só por si, não chega. De acordo com estudos elaborados nas últimas cinco décadas, o consumo de plástico está em constante crescimento, estimando-se que em todo o mundo se produza, anualmente, cerca de 400 milhões de toneladas deste polimero.
Olhando à estimativa presente, a produção em 2050 pode chegar aos 33 mil milhões de toneladas, com centenas de milhares de milhões de dólares investidos em novas fábricas de produção de plástico, incentivadas pelo consumo nos países em economias emergentes.
Por cá, apesar de haver políticas que desincentivam o uso de plástico, como por exemplo o pagamento dos tradicionais sacos nos supermercados, só em 2018 Portugal produziu 600 mil toneladas de plástico, das quais só 72 seguiram para os ecopontos.
Tradicionalmente, estamos habituados a olhar para as garrafas de água com uma apresentação translúcida, mas esta nova garrafa, à primeira vista, até parece ser confundida com uma normal embalagem de leite. Na verdade, apenas o aspeto é igual.
O novo material, apresentado sob a forma de garrafa de água mineral, surge no âmbito de um protocolo estabelecido entre a Mirpuri Foundation e a Universidade do Minho (UMinho) em 2018, para a construção de um programa de investigação e desenvolvimento. Veio criar uma alternativa que altera o rumo da produção em massa de embalagens de plástico, substituindo, por exemplo, as garrafas de água. Através do investimento da Fundação, um grupo de cientistas da UMinho, coordenado por Raul Fanqueiro, elaborou um protótipo que pretende revolucionar a industria dos bens de consumo: uma embalagem 100 por cento biodegradável e compostável, substituindo assim as opções descartáveis e com longos períodos de decomposição.
“Nós neste processo, desenvolvemos uma composição polimérica, de base natural, que foi transformada num recipiente, que é uma garrafa e que tem na sua composição algas”, refere o investigador da UMinho.
O desafio inicial lançado pela fundação, que procura a defesa ambiental e a eliminação e uso mais racional do plástico, foi criar uma embalagem mais amiga da natureza e que pudesse ser totalmente decomposta em curto prazo na natureza.
“A garrafa é produzida a partir de amido [existente em alguns vegetais como o milho ou a batata] e esse polímero de base natural foi estudado e combinado com estas algas até chegarmos a uma composição que permite ser processada em ambiente industrial e transformada em embalagens. Neste caso especifico na the Good Bottle”.
Apesar do uso de polímero termoplástico [polietileno tereftalato – PET], perfeitamente passível de reciclagem, na fabricação de produtos consumíveis e facilmente descartáveis, como as garrafas, estes produtos, ainda assim geram o forte impacto ambiental devido aos elevados números de produção mundial.
Sendo que, mesmo com uma elevada taxa de recolha para reciclagem, em 2016 estimou-se que menos da metade das garrafas compradas foi reconvertida pelo método de reciclagem. E o que sobra deste produto acaba em montanhas de aterros sanitários e/ou na pior das hipóteses vai para ao rios e consequentemente aos oceanos, afetando um vasto ecossistema que acaba por também chegar até nós.
Um problema que a comunidade científica estuda e tenta solucionar à nascença. São já algumas as empresas que, num contexto mais próximo do equilíbrio entre a produção – consumo e meio ambiente -, encontram soluções menos agressivas e ecológicas.
Neste contexto, a utilização de componentes naturais como o amido e resinas, associados ao plástico, continuam a conferir a resistência e a eficácia necessária às embalagens. Embora o tempo de longevidade e degradação no ambiente destes produtos [exemplo: garrafa de água] seja já bastante menor (cerca de dez anos) do que um produto feito exclusivamente do material original e derivado do petróleo (cerca de 400 anos), uma década continua a ser um período bastante longo e com consequências danosas ao ambiente.
Este projecto lançado pela Fundação Mirpuri e desenvolvido em conjunto com a Interface Fibrenamics, da Universidade do Minho, foi apresentado à Sociedade Águas de Monchique, que viu com muito agrado a possibilidade de se juntar a algo tão nobre a nível ambiental.
Desta forma coube à empresa de águas do barlavento algarvio a responsabilidade de contribuir na solução industrial com este material inovador num produto que possa ser disponibilizado em massa ao mercado.
Em conversa com a RTP, Vítor Hugo Gonçalves, presidente da Sociedade Águas de Monchique, refere que a parceria surgiu de uma forma bastante natural, pela forma inovadora como a marca desta água nacional se apresenta mercado, bem como pela necessidade do conceito sustentabilidade.
“Foi uma honra para nós poder fazer parte deste projeto que ainda está em desenvolvimento”, mas que a empresa conta, ainda este ano, colocar no mercado.
O presidente da Sociedade Águas de Monchique revela que esta garrafa não é apenas uma campanha de charme ou de imagem bonita: “É importante que as pessoas entendam que isto não se trata apenas de uma imagem. A garrafa já existe na realidade e a água já foi engarrafada e vai ser apresentada este sábado – dia 5 de junho – na Volvo Ocean Race, na corrida dos Oceanos. O local mais indicado para lançar uma garrafa deste tipo”.
The Good Bottle, um produto composto por uma base polimérica compostável em ambiente doméstico, contém algas, as quais, durante a degradação, servem de alimento a espécies marinhas. Mas não é só a embalagem. Também a tampa é produzida a partir da mesma composição, contando com as mesmas caraterísticas de biodegradação.
Este produto totalmente biocombustável apresenta uma taxa de biodegradabilidade de 74 por cento, ao fim de 45 dias, e em condições de compostagem controlada de acordo com a norma ISO 14855-1:2012. E de 90 por cento até 12 meses, dependendo das condições a que está exposta, de acordo com a norma ISO 13432.
Um tempo bastante agradável para o coordenador da UMinho neste projecto, que explica esta garrafa comparativamente aos plásticos que estão no mercado, tem um ganho de biodegradação inultrapassável.
“Quando falamos em plásticos que utilizamos diariamente que podem durar 100, 200 ou mesmo 3000 anos para degradarem completamente”, explica Raul Fanqueiro.
Sendo esta garrafa feita a 100 por cento de origem vegetal e de algas, não poderá o material, em contacto com a água, um solvente natural, apropriar-se indevidamente do composto orgânico?
De igual forma, o CEO das Águas de Monchique sublinha que “esse foi um cuidado que desde do início, quer a empresa detentora do produto água, quer a UMinho, quer a fundação Mirpuri, foi o grande desafio. Conseguir um package que no fundo preservasse as qualidades químicas, bacteriológicas da água Monchique”. Além de não criar qualquer interferencia na água engarrafada, a embalagem apresenta outras vantagens, como o facto de poder ser consumida pela fauna marinha, caso estas embalagens cheguem ao oceano, como tantas outras de plástico e que acabam por poluir e perdurar por séculos.
Este projeto totalmente pensado para ser amigo do ambiente, com o intuito de reduzir a utilização de plástico, bem como a biodegradação rápida e natural, teve também em conta a investigação, criação e produção total com a marca Portugal. Entre as vantagens da Good Bottle para a conservação dos Oceanos, destaca-se os resultados do estudo de avaliação da toxicidade aguda realizado em ambiente marinho, usando peixes-zebra, o qual registou efeitos excelentes em comparação com a registado com polímeros convencionais.