Caso gémeas. Chefe da Casa Civil nega "tratamento de favor" e revela conteúdo dos e-mails de Nuno Rebelo de Sousa
O chefe da Casa Civil de Marcelo Rebelo de Sousa garantiu esta terça-feira em Comissão Parlamentar de Inquérito que "não houve qualquer tratamento de favor da parte da Presidência da República" no caso das gémeas luso-brasileiras que receberam o medicamento mais caro do mundo no Hospital de Santa Maria. Fernando Frutuoso de Melo apresentou aos deputados a fita do tempo, revelando o conteúdo dos e-mails do filho do presidente nos quais este terá insistido para obter respostas.
“Perguntava como podia ajudar no sentido de as crianças”, com “doença rara e muito grave” e nacionalidade portuguesa, poderem ter acesso ao tratamento em Portugal, explicou o responsável perante os deputados no Parlamento.
No mesmo e-mail, o filho do presidente referiu que o Governo de Portugal já tinha dado esse medicamento a outras duas crianças e que a família das gémeas enviou “o histórico, o diagnóstico, exames e relatórios a pedido da doutora Teresa Moreno”.
O presidente da República “reencaminhou o e-mail para o chefe da Casa Civil” com a mensagem: “Será que a [assessora do presidente] Maria João Ruela pode perceber do que se trata?”. O chefe da Casa Civil indicou ainda que não enviou documentação à IGAS por estar em segredo de justiça.
A assessora pediu então mais detalhes a Nuno Rebelo de Sousa, nomeadamente se as crianças se encontravam em Portugal. “Este respondeu que estavam em São Paulo”, revelou Frutuoso de Melo.
No dia seguinte, o chefe da Casa Civil informou Marcelo Rebelo de Sousa de que as gémeas estavam no Brasil “a ser seguidas em São Paulo”, onde residiam, e não em Lisboa. “Pretendem vir a Lisboa fazer o tratamento”, informou então o responsável.
“Foram obter os cartões de cidadão portugueses com o fito de virem cá e terem o tratamento. Escreveram para o Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Lisboa Central a pedir o tratamento e ainda não obtiveram reposta”, escreveu Frutuoso de Melo no mesmo e-mail ao presidente da República.
O chefe da Casa Civil adiantou ainda que “o processo foi recebido” e que estavam a ser analisados vários casos do mesmo tipo, de doentes internados e seguidos em hospitais portugueses, sendo a capacidade de resposta muito limitada e dependente de decisões médicas do hospital e do Infarmed.
Nuno Rebelo de Sousa questionou se processo podia ser acelerado
No dia seguinte, 23 de outubro de 2019, a assessora Maria João Ruela confirmou estas informações. A 24 de outubro, Nuno Rebelo de Sousa escreveu-lhe a agradecer e a questionar novamente “se não há nada que se possa fazer para acelerar a análise e o processo”.
A 29 de outubro, o filho do presidente voltou a insistir, perguntando desta vez ao chefe da Casa Civil “o que podia responder aos pais das bebés, muito angustiados com a situação das filhas, sobre quando seriam contactados”.
“Respondi-lhe que, cito: A prioridade é dada aos casos que estejam a ser tratados em hospitais portugueses, daí que ainda não tenham sido contactados nem é previsível que o sejam rapidamente”.
“O SNS cobre em primeiro lugar as situações de pessoas que residam ou se encontrem em Portugal. Os portugueses residentes no estrangeiro têm direito a ser tratados pelos sistemas de saúde dos países onde residam”, informou na altura Frutuoso de Melo a Nuno Rebelo de Sousa.
O procedimento seguiu, então, o adotado “em muitos outros casos, com uma única diferença”: “para evitar uma eventual interpretação errónea, em particular qualquer tratamento diferenciado dado o parentesco do peticionário com sua excelência o presidente da República, decidi deliberadamente omitir a identificação de quem tinha feito chegar tal solicitação por e-mail à Presidência da República”, explicou.
Questionado por um dos deputados sobre por que razão foi Nuno Rebelo de Sousa a enviar o pedido à Presidência e não os pais das gémeas, o chefe da Casa Civil disse desconhecer as motivações do filho do presidente.