Caso das gémeas. Buscas da PJ no Ministério da Saúde e em Santa Maria, Lacerda Sales é arguido há três dias

por RTP
Lusa

A Polícia Judiciária desencadeou esta quinta-feira buscas no Ministério da Saúde e no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, no quadro da investigação sobre suspeitas de favorecimento de duas gémeas luso-brasileiras com um medicamento de quatro milhões de euros. A RTP apurou que a casa de António Lacerda Sales foi igualmente alvo de buscas, na passada segunda-feira, tendo o antigo secretário de Estado sido então constituído arguido.

Lacerda Sales, apurou também a RTP, está indiciado pelo crime de abuso de poder.

Nas buscas domiciliárias do início da semana, o ex-governante prestou termo de identidade e residência. Coincidiram com o dia em que o médico e ex-secretário de Estado escreveu à Assembleia da República a pedir para não ser ouvido esta quinta-feira na comissão de inquérito sobre o caso das gémeas por razões profissionais, relacionadas com o acompanhamento a doentes no hospital.
As buscas desta quinta-feira visaram a recolha de prova documental em diferentes formatos: analógico e digital.

A RTP confirmou também que decorreram buscas domiciliárias em casa do ex-diretor Clínico do Hospital Santa Maria, Luís Pinheiro, e no Instituto de Segurança Social, em Lisboa.

A Polícia Judiciária confirmou, entretanto, a realização da operação policial, “na área da saúde, visando o cumprimento de 11 mandados de busca, a fim de consolidar a investigação em curso à prática de crimes de prevaricação, abuso de poderes, tráfico de influência, abuso de poder e burla qualificada”. Tipologia que não pende necessariamente toda sobre Lacerda Sales. Por agora, está indiciado apenas pelo crime de abuso de poder.

Com a realização desta operação, frisa PJ em comunicado, “procura-se a recolha de equipamentos de telecomunicações, informáticos, prova de natureza documental, correio eletrónico, elementos que serão submetidos a exames e perícias, tendentes ao cabal esclarecimento dos factos”.
As buscas no Ministério estão centrada na Secretaria de Estado da Saúde, onde funciona o gabinete do ex-secretário de Estado, Lacerda Sales, que é um dos principais suspeitos de crimes como tráfico de influência ou abuso de poder. Lacerda Sales é apontado como recetor das cunhas diretas de Nuno Rebelo de Sousa, amigo dos pais das crianças, tendo o governante alegadamente movido influências para o tratamento.

Para já, o Palácio de Belém fica de fora da primeira operação levada a cabo na investigação e não se prevêl que desta operação resulte a constituição de arguidos.
A Polícia Judiciária está a realizar esta operação de buscas no processo de favorecimento às duas crianças gémeas luso-brasileiras com um tratamento de quatro milhões de euros para atrofia muscular espinhal à base de Zolgensma, o medicamento mais caro do mundo que foi administrado às menores no Hospital de Santa Maria, na sequência de sucessivas pressões do filho do presidente da República.

Lacerda Sales vai ser ouvido no Parlamento no dia 17 de junho, já na qualidade de arguido no processo-crime.

O Ministério da Saúde era, na época, liderado por Marta Temido, atual candidata pelo PS e cabeça de lista para as eleições para o Parlamento Europeu. Em campanha na Figueira da Foz esta manhã, Temido garantiu que "não tem nenhuma ligação" ao caso e que confia na justiça.

A cabeça de lista do PS às europeias e antiga ministra da Saúde admitiu estar "disponível para dar todos os esclarecimentos", acrescentando que não teve conhecimento sobre o caso das gémeas luso-brasileiras.

"Espero ser chamada, naturalmente. Estou disponível para dar todos os esclarecimentos", afirmou. "As polícias e o Ministério Público têm de fazer o seu trabalho de investigação. Não comento timmings, não comento decisões. Cada um tem de fazer o seu trabalho".

Garantido que "os ministros não autorizam a administração de medicamentos", a ex-governante com a tutela da Saúde acrescentou ainda "com a maior tranquilidade" que confia "nas instituições, verdadeiramente".

"Tenho de ter confiança que as diligencias que estão a ser feitas têm um propósito e que vão conduzir a um apuramento total dos factos deste caso", adiantou, e repetindo não temer que os desenvolvimentos do caso afetem a campanha, até porque já se sabia que as investigações estavam a decorrer.

Também esta manhã, em entrevista à Antena 1, no âmbito das eleições europeias, a antiga ministra da Saúde manifestou-se disponível para colaborar com as autoridades "em todas as fases" da investigação ao caso das gémeas luso-brasileiras tratadas com um fármaco milionário no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.

"É importante que todas as portuguesas e os portugueses tenham a perceção de que quando há uma suspeita ela tem que se investigada e quem é envolvido nessa suspeita tem de se disponibilizar a colaborar e a esclarecer", vincou a cabeça de lista do PS para as eleições europeias.

"Pela minha parte, esclareço publicamente que nada tiver a ver com este caso e que estou disponível para colaborar com toda a investigação", insistiu.

Questionada sobre o eventual impacto das buscas desta quinta-feira para a campanha socialista, Marta Temido disse acreditar que "os portugueses são sábios".
O caso está ainda a ser investigado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), tendo a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) já concluído que o acesso à consulta de neuropediatria destas crianças foi ilegal. Também uma auditoria interna do Hospital Santa Maria concluiu que a marcação de uma primeira consulta hospitalar pela Secretaria de Estado da Saúde foi a única exceção ao cumprimento das regras neste caso.

A comissão de inquérito ao caso das gémeas tratadas com o medicamento Zolgensma agendou já o início das audições para 17 de junho, com depoimento do antigo secretário de Estado Adjunto e da Saúde António Lacerda Sales.

Na operação desta quinta-feira participaram cerca de 40 inspetores da UNCC e peritos da Unidade de Perícia Tecnológica e Informática da Polícia Judiciária, além de diversos magistrados do Ministério Público e magistrados judiciais.
pub