Carta ao SIRP. Associação dos Ucranianos em Portugal denuncia "infiltrados russos"

por Carlos Santos Neves - RTP
“Foram em Portugal (e nos outros países) criadas ONG que, apesar de serem multiculturais nos seus estatutos, na realidade estão diretamente ligadas à Embaixada da Federação Russa” Lusa

A Associação dos Ucranianos em Portugal denunciou nos últimos dias, em carta enviada à secretária-geral do Sistema de Informações da República, Maria da Graça Mira Gomes, a alegada presença, no país, de “agentes de influência russos”. A estrutura, que afasta, por agora, qualquer ligação entre esta denúncia e a ordem de expulsão de dez funcionários da Embaixada da Rússia em Lisboa, aponta o dedo a organizações não-governamentais que só na aparência são “multiculturais”.

“O governo da Federação Russa planeava a invasão militar do território ucraniano já antes de 2014. Para isso, através das suas redes internacionais da propaganda e desinformação (Agência Rossotrudnichestvo, fundação Russki Mir, etc.) foram em Portugal (e nos outros países) criadas ONG que, apesar de serem multiculturais nos seus estatutos, na realidade e estão diretamente ligadas à Embaixada da Federação Rússia”, lê-se na carta da Associação dos Ucranianos em Portugal, datada de 2 de abril.

O presidente da associação, Pavlo Sadokha, adiantou que não ainda recebeu qualquer resposta por parte do Sistema de Informações da República Portuguesa. Quanto à notícia da expulsão de dez funcionários da Embaixada russa em Lisboa, conhecida na terça-feira, o responsável diz estar apenas ao corrente do que foi avançado pela comunicação social.

Na carta remetida a Maria da Graça Mira Gomes, pode também ler-se que “o principal papel político destas organizações e destes agentes de influência russos infiltrados em Portugal é o de influenciar a comunidade ucraniana, desinformar a sociedade portuguesa e ocidental sobre a história da Ucrânia, da realidade social e política na Ucrânia, convencer os países ocidentais de que o território da Ucrânia sempre pertenceu à Rússia e que o povo ucraniano é tão só uma parte integrante e étnica dentro da nação russa”.

“Alguns meses antes da invasão russa direta (24 fevereiro de 2022) ao território ucraniano, estas organizações de repente limparam toda informação que mostrava a ligação com a embaixada da Rússia em Portugal e nas suas páginas web e redes sociais”, prossegue a Associação dos Ucranianos, para acrescentar que “a agravante desta situação é que estas organizações em Portugal são reconhecidas pelo Alto Comissariado das Migrações.

“A Associação dos Ucranianos em Portugal e a Embaixada da Ucrânia em Portugal por várias vezes alertaram o ACM e os respetivos secretários de Estado da tutela sobre o inaceitável facto de a comunidade ucraniana em Portugal estar representada pelas associações que fazem parte das instituições de propaganda russa”, acentua-se no texto.
“Todos os alertas ficaram sem efeito”
A associação liderada por Pavlo Sadokha escreve que, “nos estatutos destas organizações pró-russas em Portugal não está definido nem claro que sejam ucranianas. Infelizmente, todas os alertas ficaram sem efeito”. “Através do ACM, estas organizações podem recebem apoio do Estado português para depois ser usado para fins e eventos de propaganda pró-russa. Quando alertámos para estas situações, nunca recebemos a resposta, mais uma vez”, insiste-se na carta.


“Hoje, estamos a receber inúmeros alertas da comunidade ucraniana em Portugal de que estas organizações de repente mudaram, aparentemente apenas, de cor política e começaram a receber apoios dos portugueses para a Ucrânia. Os ucranianos em Portugal estão a perguntar: os que sempre foram pró-Putin, que falaram mal da nossa pátria, agora estão a receber apoios que têm como destino a Ucrânia?”.

Na mesma carta é enfatizado que, o “facto de o ACM recomendar aos refugiados ucranianos que procurem o apoio das ONG que estão diretamente ligadas à Embaixada da Rússia em Lisboa significa, na realidade, que os ucranianos em fuga da agressão russa na Ucrânia, nomeadamente em Portugal, vão continuar a ser alvos de agentes russos”.

A associação teme que estes alegados agentes consigam “mais facilmente ficar com dados pessoais dos refugiados cujos familiares ficaram na Ucrânia, nomeadamente aceder às posições militares ucranianas através dos contactos dos respetivos cônjuges que continuam a fazer a defesa militar da Ucrânia”.

“Pedimos muita atenção para esta situação de modo a proteger os refugiados ucranianos em Portugal e a segurança dos seus familiares de momento na Ucrânia”, conclui.
Funcionários russos com ordem de expulsão
Portugal afinou na terça-feira pelo mesmo diapasão de boa parte dos países da União Europeia e atribuiu a classificação de persona non grata a uma dezena de funcionários da Embaixada russa em Lisboa.

O Ministério dos Negócios Estrangeiros fez saber, numa nota enviada às redações, que o Governo português notificou o embaixador da Federação Russa da decisão. O Executivo alega que estes dez funcionários da missão diplomática russa vinham desenvolvendo atividades contrárias à segurança nacional.
Contactada pela RTP, a Embaixada russa escusou-se a comentar a decisão de Lisboa.
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