A aparente normalidade regressou hoje à baixa de Algés, no concelho de Oeiras, atingida por duas fortes inundações em menos de uma semana, apesar do comércio permanecer fechado e alguns dos proprietários continuarem com a limpeza dos espaços.
Depois de, na quarta-feira passada, a rua Major Afonso Palla, junto à estação ferroviária, ter ficado inundada, na madrugada e manhã de terça-feira voltou a encher-se de água, mas desta vez com mais gravidade, atingindo comércio que tinha escapado à enxurrada da semana passada.
Os rostos dos poucos comerciantes que se encontravam no local estavam de feição fechada, de mangueiras e vassouras na mão, o desalento era mais que muito.
Pedro Castilho, que se preparava para reabrir na terça-feira o seu café que serve refeições ligeiras, viu a intenção ir literalmente por água abaixo.
"Íamos abrir ontem [terça-feira], voltou a acontecer o mesmo durante a madrugada e agora vamos aguardar por novidades, a ver o que vai acontecer", começou por contar à Lusa, recordando que da primeira vez "não foi muito mau" porque conseguiu salvar "algumas coisas".
Agora, está à espera que a eletricidade volte para verificar os equipamentos elétricos, reconhecendo que o prejuízo "há de ser elevado", mas que ainda não consegue apurar um valor correto.
Ainda assim, Pedro Castilho considerou ter sorte por o seu estabelecimento só ter um piso, frisando que muitos dos vizinhos, com pisos inferiores, têm uma situação "muito mais complicada". Por isso, também "conta ter tudo em ordem e abrir dentro de uma semana".
Na rua pedonal, as 15 estátuas de tamanho real ainda têm as marcas de onde chegou a água da chuva, que teimou em voltar a cair com força desde as 09:00 de hoje. Os pescoços das gentes de pedra estão agora adornados por colares de lama e limos tal foi o nível da inundação sentido.
À Lusa, Ricardo Brito, comandante de operações em Algés, explicou que os bombeiros estão agora a trabalhar "na reposição da normalidade da freguesia", esperando que, se as condições meteorológicas forem "favoráveis durante o dia de hoje, todas as ocorrências passarão a fase de resolução".
De acordo com o responsável, "toda a baixa de Algés foi um sítio preocupante", a chuva intensa provocou "inundações rápidas" e tudo o que são pisos abaixo do solo "ficaram com inundações", estando agora os bombeiros a fazer um esforço para retirar a água acumulada.
"As operações de dia 07 [quarta-feira passada] ficaram todas concluídas, já estavam sem água. Os nossos operacionais fizeram um magnífico trabalho, ficou tudo resolvido", explicou, acrescentando que, na noite passada, "tudo ficou repleto de água e tivemos de voltar com todos os operacionais ao terreno para resolver a situação".
Ricardo Brito elucidou ainda que o problema na freguesia de Algés "não teve tanto a ver com a preia-mar [nível mais alto a que a maré sobe]", mas sim com a chuva intensa "num determinado espaço" e que, "infelizmente", lhes calhou "as duas vezes".
O túnel de acesso à estação ferroviária de Algés encontra-se ainda encerrado, apesar dos comboios circularem na linha de Cascais, tendo Ricardo Brito acrescentado que os trabalhos dos bombeiros no local estão concluídos, sendo a reabertura da responsabilidade da Infraestruturas de Portugal, que gere a estação.
A azáfama junto ao talho no início da rua contrastava com a calma aparente na restante arteira, onde agora, junto aos bancos de madeira, estão perfiladas cadeiras e mesas de esplanada, à espera de limpeza e de dias melhores.
"Escapámos [na semana passada], tivemos 10 centímetros de água e ontem [terça-feira] foi cerca de 60 centímetros ou mais. A água chegou à parte elétrica dos balcões", disse Luís, empregado do talho, explicando que, como não há energia, "estão a retirar o resto das carnes", tendo "ido fora já algumas toneladas.
"Saíram agora muitos quilos de carne [na carrinha], vai para o armazém para ser selecionada e, se for aceitável, poderá ser doada ao jardim zoológico, mas muita dela já não está em condições. Temos geradores, mas não é suficiente para manter os frios das câmaras", esclareceu.
Apesar de tudo, as câmaras frigorificas principias encontram-se no andar de cima do talho, onde "não houve danos", reconheceu.
Os bombeiros continuam a bombear água da garagem onde na semana passada ficaram presos mais de 100 automóveis. Na madrugada de terça-feira voltou a encher, perdendo os responsáveis a conta aos metros cúbicos de água lamacenta que já retiraram e enviaram para as águas pluviais que se encontram mais próximas e destapadas.
Cá fora, na rampa de acesso perdem-se cozinhas de brincar, sapatilhas sem par e um álbum de fotografias que agora até para recordar memórias ficou perdido.
Na Rua Sacadura Cabral, no Dafundo, desmoronou um muro com cerca de oito metros de altura, estando parte da estrada fechada, porque se procedia esta manhã ao corte das árvores que se encontram no topo, sendo visíveis os ferros retorcidos que sustentavam a estrutura tal foi a força da água.
A chuva intensa e persistente que caiu de madrugada de terça-feira causou centenas de ocorrências, entre alagamentos, inundações, quedas de árvores e cortes de estradas nos distritos de Lisboa, Setúbal e Portalegre, onde há registo de vários desalojados.
Na zona de Lisboa a intempérie causou condicionamentos de trânsito nos acessos à cidade, que levaram as autoridades a apelar às pessoas para permanecerem em casa quando possível e para restringirem ao máximo as deslocações.