Bairro do Segundo Torrão. Famílias em risco de ficarem desalojadas, alerta a Amnistia Internacional
Em Almada, há famílias que podem ficar sem sítio para dormir já a partir desta sexta-feira. Em causa está a demolição das habitações, sobretudo de migrantes, no Bairro do Segundo Torrão, segundo denuncia a Amnistia Internacional em Portugal.
"No Bairro do Segundo Torrão, freguesia de Trafaria, concelho de Almada, o dia 30 de setembro foi estipulado como a data-limite para muitas famílias saírem das casas onde vivem, sem terem ainda definido um local para realojamento provisório”, denuncia a Amnistia Internacional em comunicado.
A organização aponta o dedo à Câmara Municipal de Almada pela “incerteza sobre o futuro, a ausência de uma comunicação clara e transparente”. Estas famílias, salienta a AI, estão sujeitas “a grande pressão, por receio de perder a sua casa sem um sítio para onde irem”.
Em declarações à Antena 1, Pedro Neto, diretor executivo da Amnistia Internacional Portugal, refere que "são sobretudo pessoas migrantes, algumas que já cá estão há muitos anos e que já têm filhos".
De acordo com a Amnistia Internacional, a Câmara Municipal de Almada tem justificado a necessidade de realojamentos e demolições com a “degradação de uma vala de drenagem de águas pluviais, situada por baixo de várias construções informais do bairro, que tem ameaçado desabar, colocando em perigo quem ali reside”.
Essa instabilidade aumenta nos períodos de maior probabilidade de chuva e marés cheias, com risco de inundações e colapso pela pressão da água. Neste contexto, Pedro Neto salienta a importância do diálogo entre os moradores e a Câmara.
De acordo com a Câmara de Almada, há 66 construções sob ameaça de desabamento e 44 têm função habitacional, diz a Amnistia Internacional.
Até ao momento, a autarquia "não acedeu ao pedido da Amnistia Internacional de lhe facultar o relatório" em que sustenta as razões para a demolição, afirmando que apenas cede o relatório a “entidades públicas e oficiais”.
“Alguns moradores afirmaram existir casas em cima da vala que não foram notificadas” e que “estão excluídas do processo de realojamento, apesar de apresentarem igual risco de desabamento e se encontrarem no mesmo perímetro de casas notificadas”, lê-se no comunicado.
Por outro lado, “existem casas fora do perímetro da vala a serem consideradas e ainda famílias que receberam notas de despejo mas que não foram posteriormente incluídas no plano de realojamento”, adianta a Amnistia Internacional.
Por outro lado, “existem casas fora do perímetro da vala a serem consideradas e ainda famílias que receberam notas de despejo mas que não foram posteriormente incluídas no plano de realojamento”, adianta a Amnistia Internacional.
"Discurso por vezes intimidatório"
A organização apela ainda a que seja realizada “uma avaliação individual de cada família e casa, capaz de determinar se existem questões intrínsecas ao agregado que merecem ser consideradas para o realojamento, nomeadamente referentes ao aumento do agregado ou à sua situação legal”, ou ainda questões de orçamento ou limitações de mobilidade física.
“Não se pode pensar na habitação individualmente, porque ela
interliga-se a outras dimensões da vida das famílias. Pensar numa
solução de habitação é ter em conta a dignidade, a estabilidade e o
normal acesso ao meio de sustento das famílias, assim como o acesso à
educação das suas crianças e jovens”, aponta.
À Amnistia Internacional, a Câmara de Almada garantiu que nenhuma família seria colocada numa casa que não aceitasse. No entanto, no caso de rejeição, essa família passaria "para o fim da lista", pelo que poderá ficar desalojada.
“É de significativa importância que uma família que trabalha, muitas vezes em condições salariais baixas, não veja o seu orçamento familiar ser impossível de gerir pelo acrescento de custos de deslocações que não conseguem comportar, para os empregos e para as escolas”, sublinha a Amnistia Internacional.
De acordo com a organização, os moradores queixam-se de “falta de comunicação clara e transparente” por parte da Câmara.
“O desespero e o drama que vivem estas famílias é causado - de acordo com os testemunhos das famílias que ouvimos - pela pouca clareza, esclarecimento, proximidade, e até por um discurso por vezes intimidatório da Câmara Municipal junto da população a quem serve”, refere Pedro Neto.
Dezasseis famílias ainda sem resposta
A Antena 1 procurou obter esclarecimentos da Câmara de Almada mas não teve sucesso até ao momento. Na quinta-feira, em conferência de imprensa, a presidente da Câmara, Inês de Medeiros adiantava que a demolição das construções clandestinas irá decorrer entre 1 de 6 de outubro.
“Nove agregados familiares já estão realojados temporariamente e há mais 27 que já têm uma solução habitacional aceite pelos próprios”, adiantou a autarca, citada pela agência Lusa.
Segundo Inês de Medeiros, alguns destes moradores que vão ser realojados através do programa Porta de Entrada – Programa de Apoio ao Realojamento Urgente, cofinanciado pelo Instituto da habitação e Reabilitação Urbana (IHRU), terão de permanecer alguns dias em unidades hoteleiras de Almada ou de Lisboa, até que sejam formalizados os respetivos contratos e possam ocupar as novas casas.
Inês de Medeiros referiu também que a autarquia continua a procurar respostas para 16 famílias, oito das quais já recusaram soluções propostas pela autarquia.