Associações ciganas em risco devido ao atraso na implementação da estratégia nacional
Várias associações ciganas correm o risco de encerrar e houve já projetos que tiveram de parar pelo facto de a nova Estratégia para a Integração das Comunidades Ciganas (ENICC) 2022-2030 não ter sido implementada, denunciaram hoje dirigentes associativas.
Várias associações ciganas reuniram-se hoje com membros do Comité Consultivo da convenção-quadro para a proteção das minorias nacionais, do Conselho da Europa, que estão esta semana em Portugal para monitorizar a implementação desta convenção.
No final da reunião, em declarações à agência Lusa, a dirigente associativa Sónia Matos, presidente da Associação de Mulheres Ciganas Portuguesas (AMUCIP), afirmou que o facto de Portugal estar sem ENICC, depois de a mais recente ter terminado no final de 2023, está a ter consequências graves.
"Já há projetos que pararam (e há) associações que estão quase a fechar, porque não têm condições para continuar", adiantou.
Susana Silveira, fundadora da Associação Costume Colossal, por seu lado, salientou que "há todo um trabalho envolvido (...) que está-se a perder porque não há continuidade".
"As pessoas vão-se desmobilizando, vão-se desmotivando, vão até indo para outras alternativas e o nosso trabalho que foi desenvolvido com tanto custo, tanto sacrifício, tantas horas de voluntariado que todas as associações fazemos, acaba por se perder", alertou a dirigente associativa.
Sónia Matos apontou igualmente que "a comunidade cigana [sente que] continua ali meio perdida no vazio" depois da extinção do Alto-Comissariado para as Migrações e da passagem do gabinete que tratava os temas desta comunidade para a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA).
"Sentimos que o gabinete, que era o único que dava resposta a esta comunidade, acabou por ser um bocado engolido lá dentro da AIMA e necessitamos que esse gabinete sobreviva porque senão não temos qualquer tipo de apoio", alertou.
Segundo a responsável, existiam dois planos de apoio: Plano de Apoio ao Associativismo Cigano (PAAC) e o Fundo de Apoio à Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas (FAPE), mas apenas resistiu o primeiro, uma vez que o FAPE está dependente da ENICC e "enquanto ela não existir, ele não pode sair".
A dirigente adiantou também que, por isso, as várias associações estão desde julho de 2024 "sem qualquer tipo de projeto" e financiamento.
Susana Silveira acrescentou que as associações deram conta das várias preocupações aos membros do Conselho da Europa, uma vez que estão em Portugal para "avaliarem o que é que está a ser realmente implementado (...) e o que se pode alterar ou o que se pode melhorar".
Outra das preocupações tem a ver com os mediadores socioculturais e o facto de esta profissão continuar sem regulamentação, o que faz com que a contratação seja feita com auxiliares ou assistentes operacionais.
Sónia Matos apontou que esta é uma batalha com cerca de 25 anos, que poderia ter sido resolvida enquanto o Partido Socialista esteve no Governo com maioria absoluta, enquanto Susana Silveira salientou que a falta de regulamentação da profissão de mediador tem feito com que estas pessoas não sejam devidamente remuneradas e não progridam na carreira.
No final da reunião, a representante da Associação Costume Colossal leu um comunicado, assinado por 14 associações ciganas, no qual criticam o atraso na aprovação da ENICC 2022-2030, manifestando "preocupação e descontentamento".
"Esta situação compromete a continuidade e a eficácia das políticas de inclusão social dirigidas a estas comunidades, agravando desigualdades já existentes", afirmou.
Neste comunicado, exigem que "o Governo avance urgentemente com a aprovação e implementação da ENICC, garantindo recursos adequados para a sua execução".