Animais vivem em sofrimento nos mais de mil circos na UE, incluindo Portugal
Um estudo realizado por uma bióloga portuguesa sobre os animais nos mil circos que existem na União Europeia (UE) revelou que estes vivem em sofrimento e muitas vezes são vítimas de maus tratos.
De acordo com o relatório "Animais em circos: legislação e controlo na União Europeia", realizado por Leonor Galhardo, consultora do Eurogrupo para o Bem-Estar Animal, existem cerca de mil circos na UE.
A França, com 400 circos, a Alemanha (300) e a Itália (140) são os países com maior número de circos e são igualmente os que têm maior número de animais: entre 500 e 1.000.
Contudo, Leonor Galhardo ressalva que a França é também o país onde os novos circos - sem animais - estão mais desenvolvidos.
Segundo a autora do estudo, Portugal tem 20 circos, tantos como a Holanda, e é frequentemente visitado por, pelo menos, dois circos espanhóis.
A investigação apurou ainda que, nos países com maior número de circos, existe uma elevada proporção destes espectáculos que são pequenos, pobres e muito pobres.
Um desses exemplos é a Alemanha, onde apenas cinco dos cerca de 300 circos são grandes e ricos e só 15 são considerados médios.
Também na Itália, com 140 circos, apenas foram identificados três circos de grandes dimensões.
Em Portugal - como na Áustria, na Lituânia e em Espanha - os circos são pequenos e pobres ou muito pobres.
Nesta caracterização dos circos na UE, Leonor Galhardo identificou o Natal como o período em que estes espectáculos têm mais actividade.
Para este estudo, os circos mencionaram a existência de todo o tipo de animais domésticos: cavalos, póneis, macacos, vacas, cães, gatos, porcos, cabras ovelhas, coelhos, patos, galinhas e variadas espécies de pássaros. Furões e renas foram igualmente mencionados como animais domésticos.
A investigação identificou 50 espécies diferentes de animais selvagens mantidos em circos.
Portugal tem entre cem e 500 animais nos seus circos nacionais, tal como a Suécia, o Reino Unido, a República Checa e a Polónia.
A bióloga concluiu que existe "um elevado número de espécies e animais utilizados nos circos" e que os cavalos domésticos são a espécie mais comum nestes espectáculos.
Por seu lado, um elevado número de elefantes é mantido nos circos, com a Alemanha a contabilizar perto de 90.
Existe igualmente um grande número de felinos nos circos, como na Alemanha (cerca de 200).
Os chimpanzés continuam a ser mantidos nos circos, tendo sido identificados em pelo menos dois países: Alemanha e Itália.
De uma forma geral, os países comunitários têm uma opinião muito negativa sobre as condições dos seus circos, nomeadamente a nível dos alojamentos, transporte, cuidados, treino dos animais, o seu comportamento e aparência.
Estes países consideram que o alojamento dos animais é pequeno e inadequado, que o transporte tem problemas a nível da temperatura e da ventilação e que os cuidados prestados aos animais não são apropriados, como o fornecimento de comida e água de uma forma irregular.
Segundo estes Estados-membros, citados no estudo, o treino dos animais tem procedimentos que não são transparentes e evidencia técnicas muito stressantes, tendo sido reportados casos de agressão durante as performances, assim como o uso de instrumentos cruéis nos treinos.
Muitos dos animais vivem permanentemente presos ou acorrentados, têm um aspecto aborrecido e apático e alguns apresentam- se mesmo mutilados.
Leonor Galhardo analisou igualmente a origem dos animais dos circos, tendo recebido relatos de países cujos circos adquiriram animais nos zoológicos ou em outros circos.
O destino dos animais dos circos quando estes já não são usados nos espectáculos é muito variado, passando por centros de recuperação ou zoológicos.
Em Portugal, um dos destinos encontrados para alguns tigres foi o Badoca Park, no Alentejo.
Em termos legais, Leonor Galhardo concluiu que não existem leis específicas de protecção dos animais nos circos nos Estados- membros.
Em Portugal, por exemplo, existe uma lei geral de protecção dos animais (1995), a qual não tem cláusulas específicas para os animais nos circos. Existem ainda outras leis (de 2001 e 2003) que abordam a temática dos animais nos circos, mas que possuem "vários problemas de aplicação".
Para Leonor Galhardo, os circos são naturalmente incapazes de satisfazer as necessidades dos animais selvagens: "A vida num circo é completamente incompatível com as necessidades dos elefantes, ursos pardos e polares, primatas, grandes felinos, entre outros", exemplificou.
Ao questionar o controlo que é realizado pelas inspecções veterinárias, a bióloga concluiu que os inspectores não estão devidamente preparados para verificar as condições de bem-estar dos animais nos circos.
Perante este cenário, o Eurogrupo para o Bem-Estar Animal recomenda o fim do uso de animais nos circos de uma forma faseada e que um primeiro passo nesse sentido deve ser a proibição de animais selvagens nestes espectáculos.
"O único caminho possível para alcançar a protecção de animais selvagens em circos é seguir os passos já dados por alguns países que aboliram a sua utilização nos circos", defende o relatório.