No último dia de fevereiro de 1969, os portugueses acordaram sobressaltados. Um terramoto de magnitude 7,9 na escala de Richter interrompeu a noite, com especial veemência na região algarvia. O último sismo a assustar Portugal destruiu, mas esteve longe do potencial de devastação a que o país está sujeito. “Foi um aperitivo”, avisa o investigador Mário Lopes.
Como nenhum outro desde então, o terramoto de magnitude 7,9 na escala de Richter provocou estragos, arrasou uma aldeia, deu azo a um pequeno tsunami e provocou 13 vítimas mortais, duas das quais consideradas vítimas diretas do abalo.
O sismo foi sentido em Marrocos, mas também em Bordéus e nas Canárias. Em Portugal, o Algarve foi a região mais afetada. Era também a que estava mais próxima do epicentro, localizado a cerca de 200 quilómetros a sudoeste de Sagres.
“Ao sair para a rua, trouxe um filho nos braços e o meu marido trouxe outro. Quando caiu a casa, fomos os primeiros a sair. Depois começámos a gritar e as pessoas começaram todas a sair para a rua. Começámos a ir aqui pelo povo e as casas todas a cair”, confessou Leonilde Jesus à RTP em 2008.
Em 1969, Leonilde morava em Bensafrim, no concelho de Lagos, uma das localidades mais afetadas. “Estava uma noite boa, ninguém pensava que ia haver um tremor de terra”, recordou. Segundo o IPMA, mais de 20 casas desta localidade algarvia acabaram por ruir.
O sentimento terá sido semelhante um pouco por todo o Barlavento algarvio. As localidades de Vila do Bispo, Portimão, Bensafrim e Castro Marim foram das mais afetadas do país. A maior intensidade foi registada na ponta de Sagres: nível VIII, Ruinoso.
“É uma coisa horrível mas uma coisa mesmo horrível. É um barulho e trabalha as paredes com uma velocidade. Não sei como não arrasou mais”, assinalou António Teixeira à RTP em 2008, a poucos meses de se assinalarem os 40 anos do terramoto.
Reportagem de Helena Figueiras - Telejornal, 21 de novembro de 2008
Em Lisboa, o sismo foi sentido com intensidade VI na escala de Mercalli. Ou seja, um terramoto “bastante forte” que é “sentido por todos” e motiva o pânico entre a população. “Os pratos, as louças, os vidros das janelas, os copos partem-se” e “os quadros caem das paredes. As mobílias movem-se ou tombam”. Há registo da queda de chaminés, da destruição de carros pela queda de paredes e de meia centena de feridos.
“Foi assustador. Vivi esse sismo, tinha nove anos, a cama andava de um lado para o outro, os pratos caíam dos armários, as pessoas estavam cheias de medo. Vínhamos para a rua em roupa interior”, explica Mário Lopes. Era ainda uma criança quando a terra tremeu em 1969 e estava longe de ter o conhecimento que tem hoje. É investigador do Instituto Superior Técnico e foi presidente durante mais de uma década da Sociedade Portuguesa de Engenharia Sísmica.
O conhecimento que tem hoje permite-lhe desvalorizar o outrora “assustador” fenómeno de 1969. Mário Lopes sabe bem que Lisboa pode sofrer terramotos muito piores do que aquele ocorrido há 48 anos.
“O sismo de 1969 foi fraquinho. Em termos das acelerações que se sentiram em Lisboa, foi cerca de dez por cento da capacidade de resistência dos edifícios prevista pela regulamentação atual”, analisa com a distância do tempo e o conhecimento adquirido ao longo das últimas décadas. Vê-o como uma forma de alerta. “Aquilo, como sismo, foi um aperitivo. Foi para nos lembrarmos que há aqui sismos”, avisa.