Eu e o Chico

Vim ao Rio e não vi o Chico. É a versão tropical de Roma e do Papa. Em tom de desilusão com os ritmos do samba que ele adora e da música popular do Brasil que ele representa e interpreta como poucos.

A história é fácil de contar. Chico Buarque faz 70 anos, tem mais de 50 de carreira a compor e a cantar, vive no Rio, é também dramaturgo e escritor, adora futebol e é uma das maiores figuras do país da Copa. Está obviamente no Brasil. Certo? Errado. O homem mudou-se para Paris e só volta depois do Mundial. Ah, foi certamente para uma série de concertos na cidade-luz. Certo? Errado. Foi para escrever um novo livro em paz - é um escritor várias vezes premiado e um dramaturgo muito respeitado - e levou a família para também fazer um pouco de turismo.

Ok. E agora? O homem faz 70!!! anos, eu estou no Rio. Finjo que não sei ou vou à luta? Não sou de me ficar, fui "dar uma olhada".

O Wagner, que conhece o Rio como ninguém, também conhece o campinho do Clube Politheama, no Centro Recreativo Vinicius de Morais onde Chico e os amigos se juntam duas vezes por semana para grandes futeboladas. Ele que sempre escreveu sobre tudo e mais alguma coisa, sobre a vida e as pessoas, sobre o amor e a desilusão, também escreveu sobre o desporto-rei que adora, de tal forma que dizem que a própria editora lhe "comprou" um campo só para jogar com os amigos. E já lá jogam há mais de três décadas.

Há uns anos valentes, o bom do Chico escreveu 'Meu Caro Amigo'. Uma música dedicada ao amigo Augusto Boal que vivia exilado em Portugal nos anos quentes da ditadura brasileira. Boal sentia-se solitário e queixava-se de que não sabia de nada do país que amava e dos amigos que não via. A lamúria comoveu o Chico que lhe enviou uma carta-cassete onde se podia ouvir: "Aqui na terra tão jogando futebol/, tem muito samba, muito choro e rock'n'roll/, uns dias chove, noutros dias bate o sol/, mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta." Ele não teria ficado lá muito animado com a cantoria mas nasceu um dos temas mais famosos de Chico Buarque que já tem na conta mais de 80, interpretados a solo ou em dueto. Interpretações excelentes daquele que muitos consideram o maior compositor e cantor do Brasil. País onde ser o melhor cantor de sempre é mais difícil que ser o Pélé do futebol.

Esta profissão tem coisas de excelência. Uma delas é poder privar com algumas das maiores figuras da história, e elas darem-nos atenção. Encontrei o melhor e mais íntimo amigo de Chico. Já leva mais de 30 anos disto e é só considerado um dos mais respeitados compositores brasileiros. Carlinhos Vergueiro já fez várias parcerias com o amigo Buarque, Paulinho da Viola, Vinícius de Moraes, e outros grandes nomes da música nacional brasileira.

Encontrei também Paulo César Feital. Nome grande da música e do mundo do espectáculo brasileiro, é autor, compositor, poeta e teatrólogo. E ainda Silvio César. Um famoso cantor e compositor brasileiro muito querido no país. Foi "crooner" do Conjunto de Ed Lincoln, no início dos anos 1960 e na altura aventurou-se na sétima arte onde participou no filme "Na Onda do Iê-iê-iê", no papel de César Silva. Contracenava com Renato Aragão e Dedé Santana.

Encontrei também o maestro Afonso Machado, bandolinista, compositor e arranjador, fundador do Galo Preto e da Orquestra de Cordas Brasileiras, acompanhou músicos como Cartola, Chiquinho do Acordeon e Hermeto Pascoal. Deu uma bela reportagem como podem imaginar e deu para perceber que estes grandes músicos brasileiros são uns verdadeiros craques nestas coisas, se houvesse um Mundial da música dariam uma selecção de luxo, mas não são "bons de bola". Felizmente dedicaram-se à música a tempo inteiro e ao futebol apenas duas vezes por semana.

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