Em dezembro do ano passado, Sara Khadem esteve no Cazaquistão para participar num torneio de xadrez. Numa altura de sobressalto social no Irão, a jogadora iraniana decidiu tirar o lenço com que cobria a cabeça, imagem que correu mundo. Agora, em declarações ao Guardian, Sara Khadem explicou que não queria continuar a cobrir a cabeça porque sentia que estava a trair aqueles que há meses protestavam nas ruas após a morte de Masha Amini.
A jogadora e o marido, o realizador Ardeshir Ahmadi, viram naquela situação um ponto de viragem nas suas vidas, já que desde o nascimento do filho em 2022 ponderavam sair do Irão para um país mais seguro.
Uma decisão em muito apressada pela decisão de Khadem de não usar o hijab em público. Depois de dizer ao marido que não queria usar o lenço, Ahmadi apoiou a decisão e disse que o casal e o filho poderiam ir para Espanha, o que acabou por acontecer no início de janeiro, um processo facilitado pelo estatuto de atleta de elite que Khadem tem.
“Ouvi rumores que fizemos isto para conseguir asilo e para nos mudarmos para Espanha. Quero ser clara que não usámos nenhuma desculpa política para nos mudarmos porque não necessitamos dela”.
Sara Khadem é a quinta jogadora de xadrez iraniana a sair do país depois de tomar a decisão de não usar o hijab. No Irão, os protestos continuam e estima-se que perto de 20 mil pessoas tenham sido presas, havendo conhecimento da execução de pelo menos quatro pessoas. A Human Rights Activists do Irão pensa que mais de 500 pessoas morreram durante confrontos com as autoridades.
Apesar de a xadrezista não ter dado um significado político à mudança para Espanha, Teerão não viu a situação dessa maneira e houve uma tentativa de saber onde a família ia instalar-se. Khadem e o marido tentaram manter a sua localização secreta e Sara Khadem disse que apenas ela tem explicações a dar sobre o sucedido e “não a sua família”.
No novo país de residência, o casal tenta manter um perfil discreto mas o marido lembra que “o que ela fez não é tido como uma atitude política em muitos países, mas no Irão tudo é político”.
Também Ahmadi já esteve detido, em 2014, durante três meses na prisão de Dastgerd, onde terão sido conduzidas algumas das execuções por enforcamento dos manifestantes detidos nesta onda de manifestações. O realizador acredita que a detenção aconteceu após ter realizado um documentário sobre uma banda alternativa.
Em declarações a The Guardian, o casal disse que, após a pandemia e o nascimento do filho, quer agora deixar o passado para trás e assentar em Espanha para reconstruir a carreira de Khadem no xadrez.
Apesar de ter saído do Irão, Khadem pretende, no entanto, continuar a representar o país em torneios internacionais: “A decisão que tomei em Almaty foi pessoal. Por isso, quando regressar ao Irão, e tenho a certeza de que vou regressar, irei responder a todos aqueles que me perguntarem quais foram os meus sentimentos”.