Voto de luso-americanos em Trump contraria interesses da comunidade, diz conselheiro

por Lusa

O conselheiro das Comunidades Portuguesas Paulo Pereira acredita que o voto de luso-americanos em Donald Trump contraria os interesses da própria comunidade, que poderá sofrer numa eventual deportação massiva, embora considere que o foco estará na fronteira EUA-México.

Em entrevista à Lusa, Paulo Pereira, que é conselheiro das Comunidades Portuguesas pelo círculo de Newark e Nova Iorque e que é autarca da vila norte-americana de Mineola, admitiu não notar para já um aumento na sensação de "medo" entre os portugueses que estão de forma ilegal nos Estados Unidos, frisando que a imigração portuguesa para cidades norte-americanas, "tanto legal, quanto clandestina", estagnou nos últimos anos.

Contudo, não deixa de assinalar o "paradoxo" de ver muitos luso-americanos votarem em Donald Trump nas eleições presidenciais de 05 de novembro.

"Muitos dos imigrantes portugueses, principalmente legais, mas que conhecem pessoas em situação ilegal e que trabalham com elas, apoiaram Donald Trump. Eles pensam que isto não os vai afetar. Pensaram apenas nas recompensas económicas que acham que vão receber com uma nova administração", defendeu Paulo Pereira.

"Aqui é que está o paradoxo da comunidade portuguesa. Falando só de Nova Iorque, provavelmente oito em 10 portugueses apoiaram Donald Trump, mas, na minha maneira de ver, eles estão a votar contra os próprios interesses da comunidade e mais a favor dos interesses económicos. Só votaram a pensar na carteira deles. (...) É um fenómeno interessante, mas difícil de explicar e entender", afirmou.

Donald Trump, que foi eleito na semana passado o 47.º Presidente norte-americano, teve como uma das suas maiores bandeiras de campanha a promessa de concretizar a "maior deportação em massa da história".

Há cerca de 11 milhões de imigrantes indocumentados nos EUA, segundo estimativas do Departamento de Segurança Interna de 2022, o ano mais recente com dados disponíveis --- embora Trump tenha afirmado, sem evidências, que o número real é cerca do dobro.

O ainda chefe de Estado norte-americano, Joe Biden, chegou a reconhecer que a política de controlo de entradas de imigrantes pela fronteira do México tinha de ser revista, um problema que acabou por moldar a corrida à Casa Branca e que, potencialmente, contribuiu para a derrota do Partido Democrata.

Nascido em Veiros, na cidade portuguesa de Estarreja, Paulo Pereira emigrou aos 6 anos para os Estados Unidos, juntamente com os pais e irmãos, e foi em Mineola, no estado de Nova Iorque, que se fixou e onde é autarca e professor de História.

Apesar de não ter dados sobre o número de imigrantes portugueses que estarão de forma irregular no país, Paulo Pereira acredita que a percentagem dos que serão procurados pela nova administração de Donald Trump para deportação será "muito baixa", embora admita que existe essa possibilidade.

"Eu acho que esta administração não vai facilitar a vida dos portugueses que cá estão clandestinos, mas, por outro lado, também acho que não vai estar no topo da agenda do novo Governo encontrar os portugueses que estão a viver em Newark, em Mineola, na Califórnia ou onde for", afirmou o conselheiro, que acredita que o executivo de Trump se focará - pelo menos numa primeira fase - nas pessoas que entraram pela fronteira com o México e nos imigrantes que praticaram crimes no país.

"Portanto, acredito que a comunidade portuguesa, em geral, não tem de estar hoje mais preocupada do que estava há três semanas", reforçou à Lusa o `mayor`.

Paulo Pereira, que integra o órgão consultivo do Governo para as políticas relativas às comunidades portuguesas no estrangeiro, considera ainda que a "única opção" que os portugueses que estão há "10, 15 ou 20 anos" de forma irregular nos EUA teriam para se legalizar seria através do "Partido Democrata, não do Republicano".

"Acho que as pessoas não entendem isso, que Trump não vai fazer nada para facilitar-lhes o caminho. (...) Dificilmente será dada a esses portugueses uma amnistia, um caminho para se legalizarem", advogou ainda Pereira.

Os mexicanos são o maior grupo de imigrantes nos EUA, respondendo por cerca de 23% de todos os 47,8 milhões de residentes nascidos no exterior em 2023.

Refletindo essa grande presença em solo norte-americano, os mexicanos também são maior grupo de imigrantes não autorizados, representando 45% dos 11,3 milhões de pessoas sem estatuto legal em meados de 2022, segundo estimativas do `think tank` Migration Policy Institute.

Tendo em conta esses números, a comunidade tende a associar a imigração ilegal à população latino-americana, observou Paulo Pereira, que salientou ainda que os imigrantes de hoje estão apenas a traçar o mesmo percurso que alguns portugueses traçaram quando chegaram ao país de forma irregular.

"As pessoas pensam que a imigração ilegal só envolve pessoas do México e El Salvador, mas abrange várias nacionalidades: do Haiti, da República Dominicana, da Venezuela, de Portugal, da Irlanda, do Paquistão. De todos os sítios. Mas nós temos esta noção que só os latinos é que vêm para cá ilegais. E nós olhamos para eles e pensamos que eles são menos do que nós, mas nós passamos por aquilo que eles estão a passar agora", refletiu.

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