Violência em Moçambique. Polícia reprime apoiantes de Mondlane em Maputo

por Inês Moreira Santos, Carlos Santos Neves - RTP
Dirigindo-se aos apoiantes, Mondlane voltou a dizer que vai até às últimas consequências pela reposição da verdade eleitoral Luísa Nhantumbo - EPA

O rosto da oposição de Moçambique regressou esta quinta-feira ao país, tal como tinha prometido. Durante um discurso diante de apoiantes no coração de Maputo, já depois de fazer as primeiras declarações à saída do aeroporto, Venâncio Mondlane denunciou a violência e a repressão contra opositores. A polícia dispersou com tiros e gás lacrimogéneo a multidão que ouvia o candidato presidencial. Há notícia de pelo menos três mortos.

Pouco depois da chegada de Mondlane a Maputo, a polícia dispersou, com recurso a tiros e gás lacrimogéneo, uma multidão de apoiantes que ouvia o candidato presidencial. Algumas pessoas foram atingidas no incidente, que aconteceu durante um discurso do candidato da oposição na zona do Mercado Estrela.Dirigindo-se aos apoiantes, Mondlane voltou a dizer, como em declarações aos jornalistas à chegada ao aeroporto, que vai até às últimas consequências pela reposição da verdade eleitoral, reafirmando-se vencedor das eleições gerais de 9 de outubro.

Ao fim de alguns minutos, ao falar a partir de um carro e depois de vários disparos e gás lacrimogéneo lançado na envolvente pela polícia, houve uma fuga generalizada. Isto após um apelo à desmobilização por parte de Venâncio Mondlane.


Segundo os relatos, seguiram-se momentos de caos, com rajadas de tiros e novos lançamentos de gás lacrimogéneo, depois de um cortejo com milhares de pessoas a acompanharem o carro de Venâncio Mondlane do aeroporto até ao centro de Maputo.

Desde a carga policial da manhã, desconhece-se o paradeiro do candidato presidencial, que regressou à capital moçambicana depois de mais de dois meses no estrangeiro.


Várias pessoas foram atingidas e, segundo as últimas informações, há pelo menos três mortos, pessoas que foram baleadas pela polícia neste local.
Orfeu de Sá Lisboa - RDP África

Venâncio Mondlane não aceita ter sido derrotado nas presidenciais, alegando fraude, e ausentou-se do país em outubro, depois das eleições que deram vitória ao candidato da Frelimo.
"Mesa de diálogo está em aberto"

Após o regresso de Mondlane, cinco partidos políticos moçambicanos asseguraram que as formações que discutem soluções face à tensão pós-eleitoral estão abertas a integrar o candidato presidencial no diálogo interno.

“A mesa de diálogo presente está em aberto, mas como dissemos inicialmente, o que está presente são plataformas partidárias e sendo plataformas partidárias, nós estamos aqui a trabalhar, mas reitero que a mesa de diálogo está em aberto”, declarou Daniel Chapo, secretário-geral da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder, durante a apresentação de um comunicado conjunto, respondendo a uma pergunta sobre a integração de Venâncio Mondlane nas discussões.

Dirigentes dos cinco partidos - Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), o Partido para o Desenvolvimento Optimista de Moçambique (Podemos), a Nova Democracia (ND), o Movimento Democrático de Moçambique (MDM) e a Frelimo estiveram novamente reunidos com o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi.

Em causa estão as manifestações e paralisações que levaram o caos às ruas em Moçambique, protestos convocadas pelo candidato presidencial independente apoiado pelo Podemos, Venâncio Mondlane, que rejeita os resultados proclamados pelo Conselho Constitucional (CC) nas legislativas de outubro. Já no final de dezembro, quatro partidos da oposição tinham manifestado abertura, após um encontro com o presidente de Moçambique, a prosseguir um diálogo para um pacto social que conduza a reformas no país, face à tensão pós-eleitoral.
Chegada entre fortes medidas de segurança
Venâncio Mondlane chegou a Maputo sob apertadas medidas de segurança, depois de dois meses e meio a liderar a contestação aos resultados das eleições gerais a partir do exterior. Diante dos jornalistas que o aguardavam, propôs-se "quebrar a narrativa" de estar "ausente por vontade própria". E denunciou o que descreveu como "genocídio silencioso".

“Apesar de vocês conhecerem todos os condicionalismos que me levaram a estar fora do país, eu tinha que quebrar essa narrativa de que estou ausente por vontade própria das iniciativas de diálogo. Estou aqui presente, em carne e osso, para dizer que se querem dialogar comigo, estou aqui. Então acabem com essa narrativa”.

“As pessoas estão a ser sequestradas nas suas casas, as pessoas estão a ser executadas extrajudicialmente nas matas, estão a ser descobertas valas comuns com supostos apoiantes de Venâncio Mondlane, há um crescimento geométrico de assassinatos”, acrescentou.

“Eu acho que não posso estar ao fresco, bem protegido, quando o próprio povo que está no suporte da minha candidatura está a ser massacrado. Estou aqui para testemunhar isso, justamente para monitorar esse processo, para visitar as valas comuns, para gritar a favor desses moçambicanos que estão a ser assassinados”.

Questionado sobre se está disposto a aceitar os resultados eleitorais, Mondlane retorquiu que não o fará “se forem os mesmos que foram anunciados até este momento”.

O Conselho Constitucional de Moçambique fixou 15 de janeiro para a tomada de posse do novo Presidente, que sucede a Filipe Nyusi. A 23 de dezembro, o CC proclamou Daniel Chapo, candidato apoiado pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder), como vencedor da eleição presidencial, com 65,17 por cento dos votos, bem como a vitória da Frelimo, que manteve a maioria parlamentar.

O anúncio levou de imediato a novos confrontos, destruição de património público e privado, manifestações, paralisações e saques, mas na última semana, sem novas convocatórias de protestos, a situação normalizou-se em todo o país. Os confrontos entre a polícia os manifestantes já provocaram quase 300 mortos e mais de 500 pessoas baleadas desde 21 de outubro, segundo organizações da sociedade civil que acompanham o processo.

c/ Lusa
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