Vacina contra HPV reduziu drasticamente casos de cancro do colo do útero, revela estudo

por Andreia Martins - RTP
Reuters

O estudo publicado na revista The Lancet conclui que há uma menor taxa de cancro do colo do útero e prevalência de células pré-cancerígenas nas mulheres no Reino Unido que foram vacinadas contra o HPV entre os 12 e os 18 anos. A taxa é ainda menor nos casos em que a vacinação ocorreu no início da adolescência, revelam os peritos.

O estudo realizado no Reino Unido revela uma taxa de cancro do colo de útero 87 por cento mais baixa entre as mulheres que receberam a vacina do HPV quando tinham entre os 12 e os 13 anos.

A menor incidência na taxa de cancro do colo do útero por comparação à população não vacinada é de 62 por cento nas mulheres que receberam esta vacinação entre os 14 e os 16 anos e de 34 por cento para as que receberam a vacina entre os 16 e os 18 anos.

Este estudo, publicado na revista The Lancet esta quarta-feira, analisou dados entre janeiro de 2006 e junho de 2019 e separou as mulheres em vários grupos etários para avaliar as incidências de cancro do colo útero e carcinoma não invasivo.

No caso do carcinoma não invasivo (CIN3), houve uma redução de 97 por cento na taxa de incidência em mulheres vacinadas entre os 12 e os 13 anos, 75 por cento em mulheres vacinadas entre os 14 e os 16 anos e 39 por cento em mulheres vacinadas entre os 16 e os 18 anos.

Em concreto, o estudo conclui que houve menos 450 casos de cancro do colo do útero e menos 17.200 carcinomas (casos pré-cancerígenos) do que o esperado para uma população com esta idade, não vacinada.

"O programa de imunização contra o HPV quase eliminou com sucesso os casos de cancro do colo do útero em mulheres que nasceram depois de 1 de setembro de 1995", referem os investigadores na interpretação dos resultados.

“Como esperado, a vacinação contra o HPV foi mais eficaz nas coortes vacinadas com idades entre os 12 e os 13 anos, nas quais a absorção foi maior e a infeção anterior menos provável”, refere Kate Soldan, investigadora da Agência de Segurança de Saúde do Reino Unido e co-autora deste estudo. 
A caminho da erradicação?
A investigação versa em particular a realidade no Reino Unido desde a adoção desta inoculação no programa do National Health Service (NHS, o SNS do Reino Unido), mas demonstra que a vacina contra o papilomavírus humano (HPV) está a salvar vidas e a impedir o desenvolvimento de cancro em milhares de pessoas em todo o mundo.

O cancro do colo do útero é provocado pelo vírus do HPV, uma infeção muito comum, sexualmente transmissível, que pode ser em grande parte evitada com a vacinação ou curada, caso seja detetada e tratada precocemente. A vacinação não confere proteção total, mas prefine parcialmente contra um vírus que pode afetar homens e mulheres, independentemente da idade, e que pode originar vários tipos de cancro.   

O Reino Unido começou a vacinar raparigas com a inoculação bivalente Cevarix em 2008. Este estudo, financiado pela Cancer Research UK, fornece os primeiros dados sobre o programa iniciado há 13 anos com adolescentes, agora mulheres na casa dos 20 anos.

A Cevarix foi administrada no NHS entre 2008 e 2012 e acabou por ser substituída por outra, a vacina quadrivalente Gardasil, que é agora dada a raparigas e rapazes entre os 12 e os 13 anos.

Apesar dos resultados positivos, os autores reconhecem as limitações deste estudo. Por exemplo, o facto do diagnóstico de cancro do colo do útero ser raro em mulheres jovens.

Uma vez que as primeiras populações vacinadas são ainda jovens, os autores reconhecem que é cedo para identificar o verdadeiro impacto da imunização contra o HPV no longo prazo. Ainda assim, defendem que esta primeira análise de dados constitui a primeira prova relevante da eficácia da vacina.

“Tem sido incrível ver o impacto da vacinação contra o HPV e agora podemos provar que evitou centenas de cancros em mulheres em Inglaterra. Sabemos há muitos anos que a vacinação contra o HPV é muito eficaz na prevenção de certas estirpes deste vírus, mas ver o impacto da vacina na vida real é muito compensador”, refere um dos responsáveis do estudo, Peter Sasieni, da King’s College London.

“Assumindo que a maioria das pessoas vai continuar a receber a vacina contra o HPV e continuar a ser rastreada, o cancro colo do útero vai tornar-se numa doença rara”, acrescenta ainda.
Desafios à vacinação

Os investigadores assinalam que o efeito da vacinação contra o HPV relatada por este estudo “deve estimular programas de vacinação em países mais pobres”. No ano passado, a Organização Mundial da Saúde lançou uma estratégia global para eliminar a doença.

No entanto, a aceitação e disponibilidade das vacinas representa um problema, assinalam os especialistas. 

“Mesmo num país rico como o Reino Unido, com acesso gratuito à imunização contra o HPV, a adesão não atingiu a meta de vacinação de 90 por cento das raparigas de 15 anos, estabelecida pela OMS”, assinalam as ginecologistas Maggie Cruickshank e Mihaela Grigore.

A pandemia global ainda em curso representa “um desafio adicional para a entrega de vacinas contra o HPV”, a acrescentar à dificuldade no acesso a inoculações acessíveis ou infraestrutura para as cadeiras de abastecimento com temperatura adequada.

Em Portugal, a vacinação contra o HPV está no Programa Nacional de Vacinação (PNV) desde 2008. A inoculação iniciou-se em janeiro de 2009 e visou jovens nascidas em 1992, 1993 e 1994, vacinadas respetivamente em 2009, 2010 e 2011 com uma vacina quadrivalente administrada em três doses.

A partir de 2014, a vacina contra o HPV passou a ser recomendada a raparigas entre os 10 e os 13 anos de idade, num esquema de duas doses. 

Em 2017, passou a ser administrada uma nova vacina nonavalente (HPV9) que confere proteção para cerca de 90 por cento dos tipos de vírus do papiloma humano associados ao cancro do colo do útero, mas também contra outros cancros anogenitais.

Desde então, esta nova inoculação é administrada às raparigas com dez anos de idade, também num esquema de duas doses.
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