O Ministério argelino dos Negócios Estrangeiros declarou esta quarta-feira que
Argel não tinha sido de modo algum informada das medidas anunciadas na véspera por Paris, que visam “os cidadãos argelinos titulares de documentos de viagem especiais que os isentam das formalidades de visto”, num comunicado de imprensa, citado pela
agência de notícias APS.
“O anúncio faz parte de uma longa lista de provocações, intimidações e ameaças dirigidas contra a Argélia”, denuncia a diplomacia argelina.
De acordo com a mesma fonte, a "Argélia tornou-se claramente o centro de disputas políticas intra-francesas, na quais são utilizados todos os truques políticos sujos no contexto de uma competição instigada, referida e ordenada pela extrema-direita”.
Apontado o dedo não só a forças políticas francesas, mas também a membros do governo francês, a diplomacia argelina alertou para "as consequências incalculáveis" nas relações franco-argelinas causadas por "esta dinâmica".
O ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Jean-Noël Barrot, revelou na terça-feira em declarações ao canal BFMTV que tinham sido tomadas "medidas de restrição da circulação e do acesso ao território nacional de certos dignitários argelinos". Estas medidas são "reversíveis" e "serão levantadas assim que a cooperação a que apelamos seja retomada”, explicou Barrot.
O anúncio da França surge num contexto de tensões crescentes entre Paris e Argel, reacendidas desde o atentado de sábado de Mulhouse, como consequência da Argélia se ter recusado repetidamente, nas últimas semanas, aceitar receber de volta vários dos seus cidadãos expulsos do território francês, como é o caso do argelino de 37 anos acusado de ter cometido um ato terrorista em Mulhouse.
Acresce neste ambiente a detenção do escritor franco-argelino Boualem Sansal, detido na Argélia no final do ano passado.
França ameaça pôr em causa acordos de 1968 com a Argélia
Após uma reunião interministerial sobre o controlo da imigração, convocada pelo primeiro-ministro francês para esta tarde, François Bayrou anunciou em declarações à imprensa que Paris vai pedir a Argel que "reexamine todos os acordos e a forma como são aplicados", com um prazo de "um mês, seis semanas".
O acordo de 1968, revisto três vezes desde a data da sua assinatura, concede um estato especial aos argelinos.
“Durante este período, será apresentada ao governo argelino uma lista de "emergência" de pessoas que devem poder regressar ao seu país e que
consideramos particularmente sensíveis", acrescentou Bayrou, sem referir o número de pessoas.
"Se não houver resposta no final do caminho, não há dúvida de que a
única saída possível será a rescisão dos acordos", avisou o primeiro-ministro francês, embora "não seja
esse o nosso desejo".
Questionado sobre o perigo de escalada nas tensões entre Paris e Argel, o chefe do Governo explicou que a "ideia não é de todo agravar" as relações com a Argélia. No entanto, Bayrou salientou que a França "não pode fechar os olhos" ao desrespeito da Argélia pelos acordos bilateriais em matéria de imigração, numa referência direta ao suspeito do ataque de Mulhouse, em que recordou que este foi apresentado "catorze vezes" às autoridades argelinas, que recusaram sempre a sua detenção. "As vítimas que vimos em Mulhouse este fim de semana são as vítimas
diretas da recusa de aplicar os acordos de 1968" entre os dois países,
denunciou Bayrou.
François Bayrou reiterou que "a nossa ideia é que ninguém deve ignorar a determinação do governo francês em não aceitar a continuação de uma situação tão prejudicial para as relações entre a Argélia e a França e para a sociedade francesa”, afirmou.
Durante a conferência de imprensa, o primeiro-ministro francês também manifestou a sua "grande preocupação" com a "saúde e a pressão" exercida sobre o escritor Boualem Sansal.
c/agências