Twitter "democrático". Musk quebra silêncio após votação que o destitui mas nada diz

por Paulo Alexandre Amaral - RTP
Dos mais de 17 milhões de utilizadores que votaram na sondagem, uma larga maioria de 57,5 por cento disse a Musk para deixar a liderança do Twitter Dado Ruvic - Reuters

Há quem adore Elon Musk, há quem odeie Elon Musk. Nada de novo debaixo desse Sol incandescente que é o Twitter, portanto. Senhor dos seus domínios, Musk ensaiou no domingo a pele de um rei magnânimo e colocou à consideração dos utilizadores da rede a sua continuidade como CEO. A resposta foi clara: dos mais de 17 milhões que aceitaram pronunciar-se 57,5 por cento mostraram o desejo de o apear.

A questão colocada por Musk aos utilizadores do Twitter pode ter sido vista no imediato como um capricho de quem tudo controla. Quando na noite de domingo a pergunta caiu na rede todas as questões se tornaram legítimas, em particular que efeitos práticos traria para a própria empresa cuja compra há um par de meses envolveu um montante de 44 mil milhões de dólares.

E essa é uma questão que se mantém. Elon Musk, que tem feito uso do Twitter à moda de Donald Trump, com uma sucessão imparável de tweets, entrando em interação com os utilizadores da rede, esteve em silêncio desde a noite de domingo, quando lançou a sondagem sobre a sua permanência como CEO da empresa, limitando-se a meia dúzia de tweets e retweets.

Continuam, no entanto, por revelar os efeitos práticos da votação, que não terá saído como desejava. Dos mais de 17 milhões de utilizadores que votaram na sondagem, uma larga maioria de 57,5 por cento disse a Musk para deixar a liderança do Twitter. Pelo menos, deixar a liderança nos moldes empresariais, ou seja, abandonando o lugar de CEO.

É, porventura, um resultado que não esperaria. Em resposta a um utilizador que sugeria que em futuras sondagens sobre a política da rede apenas aqueles que tivessem uma conta “azul” – um selo de autenticidade usado para certificar contas do Twitter – pudessem votar, Elon Musk reagiu com “Boa ideia. O Twitter vai fazer essa alteração”.
Uma dúvida que persiste
Até ao momento, o bilionário da Tesla continua no entanto a nada dizer quanto a abdicar da chefia, ou, abdicar deste modelo de chefia. Apesar do historial de Musk de recorrer às sondagens do Twitter para colocar uma chancela em decisões importantes, como aconteceu em 2021 quando já teria decidido vender dez por cento das suas participações na Tesla ou a reabilitação da conta de Donald Trump, o cenário de uma entrega de controlo do Twitter não encaixa na equação do último ano, marcado por um processo de compra a roçar a hostilidade.
Depois de ressuscitar a conta do ex-presidente, Elon Musk deixou um tweet com “Vox Populi, Vox Dei”. A dúvida persiste se os 57,5 por cento de votos serão também abrangidos por esta alocução que entrega a soberania da decisão ao povo, no caso, à tribo que constitui o Twitter (ainda que seja corrente a ideia de que a rede não é uma tribo, mas uma constelação constituída por várias tribos). Esta dúvida é ainda potenciada pela ideia de que o Twitter é nas mãos de Musk mais do que um brinquedo caro nas mãos de uma personagem extravagante.

Musk chegou a ser acusado em algumas contas de ter comprado a rede para banir um utilizador que seguia em tempo real os trajetos do seu jato particular. Na semana passada, entre muita polémica, acabou por banir essa conta da rede invocando questões de segurança pessoal e da sua família. Seguiu-se a censura de contas de alguns jornalistas para os quais diz ter usado a mesmo critério. Alegadamente, segundo Musk, teriam replicado essa informação sensível para a sua segurança, mas os críticos invocaram outras razões. Segundo estes, o bilionário estaria a castigar jornalistas que antes haviam escrito sobre o agora dono do Twitter.

Estes “castigos” extravasaram a atenção da própria rede e valeram a Musk um aviso da União Europeia, que o lembrou da existência de “linhas vermelhas”, prometendo “em breve sanções” face a esta atitude persecutória.

O final da semana passada foram dias de barragem sobre Elon Musk e as próprias Nações Unidas vieram publicamente manifestar “sérias preocupações” face às suas atitudes na rede. Volker Turk, alto-comissário para os Direitos Humanos, e saudando a decisão posterior de reativar as contas suspensas dos jornalistas, instou Musk a “comprometer-se em tomar decisões baseadas em políticas acessíveis ao público e que respeitem os direitos, nomeadamente a liberdade de expressão”.
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