Trump substitui McCaster por Bolton como conselheiro para a Segurança

por Graça Andrade Ramos - RTP
John Bolton, em fevereiro de 2017

A equipa de Trump sofreu mais uma remodelação. O tenente-general H.R. McCaster, conselheiro para a Segurança Nacional, saiu e, para o seu lugar, o Presidente dos Estados Unidos foi buscar um diplomata dos tempos de George W.Bush: John Bolton.

A saída de McCaster já estaria a ser preparada há algum tempo.

O anúncio foi feito pelo próprio Presidente, como já se tornou habitual, na rede social Twitter.
"Tenho o prazer de anunciar que, com efeitos a partir de 4/9/2018, @AmbJohnBolton será o meu novo Conselheiro para a Segurança Nacional. Estou muito grato pelo serviço do general H.R.McMaster que realizou um trabalho excelente & será sempre meu amigo. Haverá uma passagem de pasta oficial dia 4/9", escreveu o Presidente.O anúncio surge apenas 10 dias depois de Trump ter demitido o secretário de estado Rex Tillerson, substituindo-o pelo diretor da CIA, Mike Pompeo.

Analista do canal de televisão Fox News, John Bolton, de 69 anos, foi embaixador da ONU sob George W.Bush e deverá iniciar as suas novas funções a 9 de abril.

Vai dirigir várias centenas de especialistas de segurança nacional ao serviço da Casa Branca, muitos deles oriundos do Pentágono, do Departamento de Estado e das agências de Informação.

A sua função é aconselhar o Presidente em questões tão variadas como a luta contra o Islamismo ou a expansão do poder económico e militar da China.

A sua nomeação não necessita de confirmação do Senado.
Granada na gaveta
Bolton é uma figura conhecida em Washington, um falcão que mantinha uma granada de mão numa gaveta da sua secretária no Departamento de Estado, quando integrava a Administração de George W.Bush.

Em 2007 publicou um livro de memórias intitulado A rendição não é uma opção. Entre os seus alvos preferenciais estão os regimes do Irão e da Coreia do Norte, as Nações Unidas, os governos da União Europeia e tratados internacionais.

Muitos na capital norte-americana consideram-no abusivo. Em 2005, durante a sua sua avaliação para se tornar embaixador dos EUA na ONU - o Senado chumbou-o mas George W.Bush passou por cima e nomeou-o mesmo assim - o então chefe do Serviço de Informações do Departamento de Estado, Carl Ford, considerou-o um "puro lambe-botas".
Contra a Coreia do Norte, marchar, marchar
A escolha deverá desde já, e pelo menos, dificultar qualquer esboço de aproximação à Coreia do Norte, pois Bolton é conhecido pelas duras criticas ao anterior líder norte-coreano, Kim Jong II - a quem chamou "ditador tirânico" num discurso em 2003, em Seul, e por advogar o uso de força contra o regime de Pyongyang.

Em resposta, este chamou-lhe "escumalha humana", e recusou reconhece-lo como representante do Governo norte-americano ou sequer falar com ele, devido à sua "vulgaridade política e condição psicopatológica".

Os anos não terão mudado a forma aparentemente preferida de Bolton resolver as questões internacionais mais prementes. Numa entrevista à radio WMAL de Washington, mal se soube dos planos de Trump para se reunir com o líder norte-coreano Kim Jung Un - decisão que o deixou "em choque e deslumbrado" -, considerou-os uma oportunidade de ouro para ameaçar com uma intervenção militar.

"Penso que esta sessão entre os dois líderes poderia bem ser muito breve, na qual Trump dirá diga-me que começou a desnuclearização total, porque não vamos ter longas negociações. Pode dizer-me desde já ou nós iremos dar início a outra coisa", antecipou Bolton.

Na rede Twitter, Bolton exprimiu bem o que pensa sobre a questão.
"Aqueles que estão satisfeitos com uma Coreia do Norte nuclear argumentam que pode ser contida e desencorajada como a União Soviética durante a Guerra Fria. Esta avaliação tem falhas profundas", escreveu a 15 de março.
Seul a roer as unhas
Com Bolton no lugar de conselheiro para a Segurança, a reunião nem deverá chegar a realizar-se, antecipa desde já Seul. A Casa Azul, sede do Governo sul coreano, habitualmente entalada entre a influência de Pyongyang e de Washington, reagiu com cautela à nomeação.

"A nossa posição é que, se um novo caminho surgir, devemos segui-lo", afirmou aos repórteres um alto-responsável sul-coreano, sob anonimato. "Bolton está muito bem informado sobre os assuntos da Península Coreana e sobretudo, sabemos que é um dos assessores do Presidente dos EUA em que ele confia".

Ao passo que McCaster tinha estabelecido uma relação próxima de amizade e de trabalho com os seus homólogos sul-coreanos, as relações com Bolton deverão ser provavelmente mais complicadas. "Vai ser um caminho difícil mesmo antes da cimeira", considerou um ex-agente de segurança sul-coreana, Nam Sung-wook.

Um deputado conservador sul-coreano, Kim Hack-yong, ficou apreensivo. "Isto são notícias preocupantes. A Coreia do Norte e os Estados Unidos devem dialogar mas isto só alimenta a especulação sobre se as conversações chegarão a acontecer", afirmou.

"Se Bolton assume o lugar e as negociações com a Coreia do Norte descarrilarem, não sei o que iremos fazer", acrescentou.
Irão pelo cano abaixo
Se a aproximação a Pyongyang era uma luz ao fundo do túnel que parece agora apagar-se, a questão iraniana estará mais definida: o acordo para o programa nuclear iraniano deverá ser deitado para o lixo.
"Os europeus caíram na armadilha iraniana e reabriram as relações económicas com o Irão. A única forma de os fazer ver a seriedade e a gravidade da ameaça colocada pelo Irão é abandonar o acordo", opinou recentemente na rede Twitter.

Conhecidas as opiniões de Bolton sobre o acordo, vários analistas preveem que ele irá aconselhar Trump a abandona-lo, se os subscritores europeus, a França, a Alemanha e o Reino Unido, não cederem e aceitarem, até meados de maio, os novos limites exigidos pelos Estados Unidos a Teerão.

Um dos principais conselheiros da Casa Branca em questões iranianas, Mark Dubowitz, da Fundação para a Defesa da Democracia, reagiu com desânimo à nomeação.

Ele advoga a manutenção do acordo nuclear desde que sejam resolvidos os pontos deixados em aberto no texto e que Trump considera preocupantes mas agora, afirma que "o meu apoio de longa data para uma atualização do acordo iraniano deve ter dado o último suspiro".

Bolton também aplaudiu a decisão de Trump de mudar para Jerusalém a embaixada norte-americana em Israel e recomendou a manutenção da prisão de Guantanamo em Cuba.
Palavras ocas com Pequim
Também as relações com a China, já abaladas nos últimos dias pela guerra comercial do aço e pelas novas taxas que Trump quer impor à importação de produtos chineses, deverão endurecer com Bolton, desta vez no plano da Segurança e Defesa. O novo conselheiro recomenda pressão sobre Pequim através do apoio a Taiwan.

"Que cooperação de segurança com a China poderá existir? Armas nucleares, Coreia do Norte, Taiwan, Mar do Sul da China, ciberespaço... Onde é que há esperança de cooperação?" desesperou à agência Reuters um analista das relações sino-americanas da universidade de Pequim, Shi Yinhong.

"Trump e Xi Jinping falaram em público da lógica de cooperação mas com o rumo negativo na cooperação económica e de segurança, estas palavras soam cada vez mais ocas", acrescentou.

Zhao Tong é ainda mais pessimista. Especialista nas questões da Coreia do Norte e desarmamento nuclear do centro Carnegie-Tsinghua em Pequim, diz que a nomeação de Bolton deverá ser interpretada por Pequim como um sinal para "reforçar as suas posições de força".

Já Tóquio espera que as relações com Washington se mantenham "normais" pois, de acordo com um alto responsável nipónico, John Bolton tem "muitos amigos" no Governo japonês.

Um analista de Estudos Políticos no Japão está um pouco mais preocupado. "O problema é que ele não tem qualquer flexibilidade", assumiu Narushige Michishita.
Mostrar à Rússia quem manda
A reação inicial de Moscovo à nomeação de Bolton foi pragmática. O vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Ryabkov, disse que a Rússia está pronta a trabalhar de forma construtiva com Washington, afirma a agência de notícias russa RIA.

A avaliar pelas opiniões expressas por Bolton na sua página Twitter, o confronto deverá ser a escolha.

Não só tem desdenhado das alegações de conluio entre o Kremlin e Trump nas presidenciais norte-americanas como ironiza com a interferência russa nessas mesmas eleições e advoga uma resposta dura ao envenenamento recente de um ex-duplo espião russo no Reino Unido de que Moscovo é acusada.

Dia 1 de março passado, Bolton reagiu com a habitual atitude belicosa ao anúncio russo de novas armas nucleares.
"É preciso uma resposta estratégica aos novos mísseis nucleares da Rússia, para mostrar aos nossos aliados na Europa que não iremos deixar #Rússia empurrar os EUA e os seus aliados", escreveu.

Logo após a sua nomeação ser conhecida, Bolton pareceu estar pronto a refrear as suas opiniões, pelo menos em público. "Francamente, o que eu disse em privado fica agora para trás, pelo menos a partir de dia 9 de abril", afirmou na Fox News.

c/ agências
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