Tribunal Internacional de Justiça ordena a Israel que trave ofensiva em Rafah
O Tribunal Internacional de Justiça ordenou esta sexta-feira a Israel que ponha um travão imediato à ofensiva sobre Rafah, no sul da Faixa de Gaza. A mais alta instância judicial das Nações Unidas, com sede em Haia, adverte para o potencial de "destruição física ou parcial" do "grupo dos palestinianos em Gaza". Contudo, o exército israelita intensificou, nas últimas horas, os ataques em Rafah.
Israel, determinou o TIJ, deve "parar imediatamente a sua ofensiva militar e qualquer outra ação efetuada em Rafah, que seria suscetível de infligir ao grupo dos palestinianos em Gaza condições de existência suscetíveis de levar à sua destruição física ou parcial".A decisão decorre de uma petição interposta em dezembro passado pela África do Sul, dois meses após o ataque desencadeado pelo movimento radical palestiniano Hamas e a subsequente contraofensiva israelita.
Em janeiro, a mesma instância havia ordenado a Israel que fizesse o que estivesse ao seu alcance para impedir qualquer ato de genocídio e que permitisse a entrada de ajuda humanitária na Faixa de Gaza.
O tribunal com sede em Haia citou as obrigações que incumbem a Israel "por força da Convenção sobre a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio, e tendo em conta o agravamento das condições de vida dos civis" em Rafah.
O TIJ declarou também que Israel deve manter a passagem de Rafah aberta para permitir a entrada de ajuda humanitária em Gaza "sem restrições".
Além disso, Israel também deve "tomar medidas eficazes para garantir o acesso sem entraves à Faixa de Gaza de qualquer comissão de inquérito, missão de apuramento dos factos ou outro órgão de investigação" mandatado pela ONU "para investigar alegações de genocídio".
O Estado de Israel tem ainda de apresentar um relatório, no prazo de 90 dias, sobre as medidas decididas pelo TIJ.
O gabinete do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, rejeita as alegações da África do Sul de genocídio por parte de Israel , chamando-as de “falsas e ultrajantes”, e alegando que as operações em Rafah não levam nem vão “levar à destruição da população civil palestiniana".
O secretário-geral das Nações Unidas (ONU), António Guterres, sublinhou que as decisões do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) "são vinculativas", após a principal instância judicial da ONU ordenar a Israel que cesse a ofensiva no sul de Gaza.
"O secretário-geral recorda que, nos termos da Carta e do Estatuto do Tribunal, as decisões do Tribunal são vinculativas e confia que as partes cumprirão devidamente a ordem do Tribunal", indicou o gabinete do porta-voz de Guterres em comunicado.
Esta decisão do TIJ foi aprovada por 13 votos a favor e dois contra, anunciou o presidente do TIJ, o libanês Nawaf Salam.
Entretanto, o líder da oposição israelita, Yair Lapid, condenou a decisão do Tribunal por não conseguir estabelecer um acordo que preveja a exigência pelo fim dos combates e a exigência de devolver os reféns israelitas mantidos em Gaza.
Lapid, normalmente um crítico feroz do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu , disse que o fracasso do tribunal em ligar as duas questões foi “um colapso moral e um desastre moral”.
O ministro das Finanças de Israel, Bezalel Smotrich, disse que exigir que Israel pare a guerra contra o Hamas equivale a exigir que decida deixar de existir.
“Os israelitas não concordarão com isso”, disse em comunicado.
Também um porta-voz do Hamas, Basem Naim, já reagiu, saudando "a decisão do tribunal mundial que apela às forças de ocupação sionistas para que ponham fim à sua agressão militar a Rafah".
"Acreditamos que não é suficiente, uma vez que a agressão de ocupação em toda a Faixa de Gaza e especialmente no norte de Gaza é igualmente brutal e perigosa", afirmou Naim, citado pelas agências.
"Apelamos ao Conselho de Segurança da ONU para que implemente imediatamente esta exigência do Tribunal Mundial em medidas práticas para obrigar o inimigo sionista a implementar a decisão".
O Hamas saudou ainda o pedido do tribunal para permitir que se investigue "atos de guerra ou genocídio contra o povo palestiniano", acrescentando que se compremete "a cooperar com as comissões de investigação".
Na mesma linha, o porta-voz da Autoridade Palestina, Abu Rudeineh, saudou a decisão emitida "pelo Tribunal Internacional de Justiça, que representa um consenso internacional sobre a exigência de pôr fim à guerra total em Gaza".
O presidente da Autoridade Palestiniana saudou a deliberação do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) de pedir a suspensão da operação militar israelita em Rafah, apelando à comunidade internacional para que obrigue o “Estado ocupante” a cumprir a decisão.
"Apelamos à comunidade internacional para que obrigue o Estado ocupante a aplicar as decisões do TIJ e para que o pressione a respeitar e a aplicar as decisões com base na legitimidade internacional e no direito internacional", disse Mahmud Abbas, líder da Autoridade Nacional Palestiniana (ANP), que governa pequenas zonas da Cisjordânia ocupada, mas não a Faixa de Gaza, enclave palestiniano controlado pelo grupo islamita Hamas desde 2007.
Reações internacionais
A Comissão Europeia disse entretanto que as decisões do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) sobre a suspensão da incursão militar israelita em Rafah "são vinculativas" e "todas as partes têm de obedecer".
"Tomo nota da decisão do TIJ de ordenar a suspensão das operações militares em Rafah e a abertura de um corredor para acesso a apoio humanitário e serviços básicos", escreveu o comissário para a Gestão de Crises, Janez Lenarčič, na rede social X.
"As decisões do TIJ são vinculativas e todas as partes têm de obedecer. Espero uma implementação total e imediata", completou.
Também o alto representante de Política Externa, Josep Borrell, considerou que a União Europeia tem que "escolher entre o nosso apoio às instituições internacionais do Estado de direito ou o nosso apoio a Israel".
O Governo sul-africano congratulou-se com a decisão "inovadora" do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ).
"Esta ordem é inovadora, pois é a primeira a pedir explicitamente a Israel que suspenda a sua ação militar em qualquer área de Gaza", disse Zane Dangor, diretor-geral do Departamento de Relações Internacionais e Cooperação da África do Sul (Dirco), num vídeo publicado nas redes sociais.
"Embora o tribunal não possa utilizar legalmente o termo cessar-fogo (...), trata-se de um apelo de facto a um cessar-fogo", acrescentou Dangor.
Israel volta a intensificar ataques em Rafah
Israel reagiu já à decisão, afirmando que não coloca qualquer risco existencial para a "população civil palestiniana".
"Israel não conduziu nem conduzirá operações militares na zona de Rafah que criem condições de vida suscetíveis de implicar a destruição da população civil palestiniana, no total ou em parte", indica um comunicado comum do Ministério dos Negócios Estrangeiros e do Conselho de Segurança Nacional.
O exército israelita intensificou entretanto os ataques em Rafah, mesmo depois de conhecida a decisão do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ).
“Os aviões da ocupação israelita lançaram um violento bombardeamento contra várias zonas da cidade de Rafah. O bombardeamento teve como alvo as ruas e as casas dos cidadãos no centro do campo de Shaboura, em Rafah, causando vítimas entre os cidadãos", informou a agência noticiosa.
Segundo a mesma fonte palestiniana, a artilharia israelita visou igualmente o hospital Abu Yoused al-Najjar, do qual dependem cada vez mais os restantes habitantes de Gaza em Rafah, uma vez que o outro hospital da zona, o Kuwaiti, poderá deixar de funcionar nas próximas horas devido aos danos causados pelos ataques israelitas.
O exército israelita ainda não comentou nenhum dos ataques.
C/agências