Tribunal declara nulos atos administrativos na intervenção no moçambicano Moza Banco
O Tribunal Administrativo (TA) moçambicano manteve a decisão de declarar nulos os atos administrativos do Banco de Moçambique na intervenção no Moza Banco, um dos cinco maiores, participado anteriormente pelo português Novo Banco, recusando recurso do banco central.
Em causa, conforme acórdão do TA, está a forma como o banco central realizou a intervenção no Moza Banco - alegando na altura a situação financeira do banco e o seu risco sistémico -, anunciada por um aviso publicado em 14 de novembro de 2016, em Boletim da República (BR).
"Facilmente percebe-se que o mesmo entrou em vigor e começou a produzir efeitos jurídicos a partir do dia 14 de novembro de 2016, quando na verdade o Moza Banco foi intervencionado pelo Banco de Moçambique [BM] no dia 30 de setembro de 2016, antes da publicação do controverso aviso", lê-se no acórdão, por unanimidade dos 16 juízes e notificado em 01 de abril, em resposta ao recurso à mesma decisão da instância anterior, interposto pelo BM, cujo governador é desde agosto de 2016 Rogério Zandamela, e pelo Moza.
"Portanto, equivoca-se e contradiz-se o apelante, no seu posicionamento, quando defende que para legitimar a intervenção do Moza Banco não era necessário publicar o aviso do governador do BM no BR, contudo procedeu com a publicação do competente aviso já decorridos 44 dias após a sua intervenção", acrescenta o acórdão, que confirma totalmente a primeira decisão, favorável ao requerente, a Moçambique Capitais, acionista minoritário (cerca de 3%), mas que à data era maioritário e fundadora do banco.
O Moza Banco passou a ser liderado em 2016 pela Kuhanha, sociedade gestora do fundo de pensões dos trabalhadores do BM (atualmente mais de 60% do capital social), na sequência da intervenção do banco central, quando tinha o português Novo Banco como um dos principais acionistas (49%), sucessor do Banco Espírito Santo.
Fonte oficial do Moza Banco contactada pela Lusa disse que a instituição não comenta o teor do acórdão, garantindo apenas que "o banco mantém o seu foco na estabilidade, solidez e compromisso com os seus clientes, colaboradores e parceiros", continuando "a crescer de forma sustentável e alinhada com as melhores práticas do setor financeiro em Moçambique".
A Lusa questionou o Banco de Moçambique sobre esta decisão, sem sucesso.
O acórdão do TA recorda que à data da intervenção, a Moçambique Capitais detinha uma participação social de 51% no Moza Banco, no valor de 1.085.875.000 meticais (15,5 milhões de euros, ao câmbio atual). Contudo, essa participação passou a valer 217.175.000 meticais (3,1 milhões de euros), face à "redução do capital social seguido imediatamente de aumento de capital social, com consequente desvalorização induzida no valor do título de ação, de 25.000 meticais para 5.000 meticais [358 para 71,5 euros]".
"O BM jamais deveria ter feito a intervenção no Moza Banco, sem que antes tivesse publicado o aviso no BR, pois que doutro modo seria contraditório" à Constituição, pelo que "as decisões por si tomadas desde 30 de setembro de 2016 a 14 de novembro de 2016, não têm nenhum valor jurídico, sendo deste modo nulos e de nenhum efeito", acrescenta, anulando assim "atos materialmente administrativos", como "a intervenção e a adoção da medida extraordinária de saneamento do Moza Banco", e a nomeação de um conselho de administração.
O acórdão sublinha que a Constituição "exige que os avisos do governador do BM sejam publicados no BR, sob pena de ineficiência jurídica", pelo que o "pedido de declaração de nulidade [do recurso] não procede".
No acórdão também se afirma que a intervenção foi feita "sem respaldo legal", classificando como "antagónico o posicionamento" do BM, "quando defende que para legitimar a intervenção no Moza Banco não era necessário publicar o aviso do governador", fazendo-o depois, quando "já eram decorridos 44 dias".
Acrescenta que "no culminar do procedimento de seleção de investidores", a Kuhanha "mostrou-se a mais favorecida pelo cumprimento da exigência dos requisitos básicos", recordando que o governador é o presidente do conselho de administração da sociedade, cujo capital social "é inteiramente detido pelo BM e que subscreveu a maioria do capital do Moza Banco" na sua recapitalização.