Tribunal britânico decide a favor de Maputo

por Lusa

O Tribunal Comercial de Londres decidiu hoje a favor de Moçambique no processo das chamadas `dívidas ocultas` e determinou que o grupo naval Privinvest deve pagar compensação por corrupção do antigo ministro das Finanças Manuel Chang.

Na decisão, o juiz Robin Knowles recusou os testemunhos do proprietário do grupo, Iskandar Safa, que morreu em janeiro, e do negociador da Privinvest Jean Boustani, de que a Privinvest não pagaria subornos.

"Estou convencido de que o senhor Safa e o Grupo Privinvest estavam dispostos a prometer ou a pagar a quem quer que fosse, e especificamente ao ministro Chang (...). E foi isso que fizeram", escreve na sentença distribuída hoje.

O juiz considera que a ideia de que "os pagamentos se destinavam e se acreditava que se destinavam a investimentos e não a subornos é falsa e foi concebida para ocultar o seu verdadeiro objetivo".

O magistrado também afirma ser "uma conclusão segura e correta que (...) Moçambique não tinha conhecimento dos pagamentos e promessas", mas acrescenta que "não se pode excluir que alguns outros altos funcionários e detentores de cargos públicos tivessem conhecimento dos pagamentos ao ministro Chang e das promessas que os precederam ou que implicavam para o futuro".

Como resultado da decisão, o juiz calcula que Moçambique tenha direito ao pagamento de 825 milhões de dólares (761 milhões de euros no câmbio atual) e a uma indemnização para cobrir os 1,5 mil milhões de dólares (1,38 mil milhões de euros) que é responsável por pagar a bancos e obrigacionistas. 

Num comunicado, a Privinvest afirmou que pretende recorrer por considerar que a conclusão de que Chang foi corrompido é "baseada em grande parte em suposições e não sustentada por uma análise credível".

"É uma consequência injusta e injustificada da decisão de primeira instância de hoje que, apesar das críticas feitas nessa decisão aos detentores do poder em Maputo, e das irregularidades criminais reconhecidas e admitidas e de outras falhas dos bancos e do FMI, seja a Privinvest que agora pode enfrentar o ónus de indemnizações de centenas de milhões de dólares", lamenta.

A Privinvest manifesta também a intenção de lançar procedimentos judiciais "de forma vigorosa" contra o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, quando este perder a imunidade diplomática, em janeiro.

Nyusi era ministro da Defesa na altura dos acontecimentos e a Privinvest alega que o atual chefe de Estado deve ser responsabilizado. 

A decisão de hoje é o culminar de quase cinco anos de litígio na justiça britânica, à qual o país africano recorreu alegando corrupção, conspiração para lesar por meios ilícitos e assistência desonesta para anular dívidas e reclamar compensação financeira.

Moçambique exigia 3,1 mil milhões de dólares (2,86 mil milhões de euros no câmbio atual) por danos, compensação e indemnização ao grupo naval Privinvest e ao proprietário, Iskandar Safa, o qual morreu em janeiro de doença. 

Ambos eram acusados de pagar subornos a funcionários públicos, incluindo ao antigo ministro das Finanças Manuel Chang, que assinou garantias estatais sobre os empréstimos das empresas públicas Proinducus, Ematum e MAM em 2013 e 2014 para comprar navios e equipamento de vigilância marítima em 2013.

Descobertas em 2016, as dívidas foram estimadas em cerca de 2,7 mil milhões de dólares (cerca de 2,49 mil milhões de euros), de acordo com valores apresentados pelo Ministério Público moçambicano.

Manuel Chang encontra-se atualmente a ser julgado em Nova Iorque por conspiração de fraude e envolvimento num esquema de lavagem de dinheiro. 

O grupo Privinvest e Safa eram os únicos réus que restavam devido à conclusão de vários acordos extrajudiciais entre o Estado moçambicano e vários bancos e instituições financeiras para renegociar as dívidas. 

Antes do julgamento começar, no ano passado, o Governo moçambicano chegou a um acordo extrajudicial com o grupo UBS, dono do Credit Suisse, que resultou no perdão de cerca de 450 milhões de dólares (415 milhões de euros no câmbio atual) ao país africano.

No âmbito do mesmo acordo, aceitou pagar 142 milhões de dólares (131 milhões de euros) a outras oito instituições financeiras com interesses nos contratos, de acordo com uma informação do Fundo Monetário Internacional (FMI) consultada pela Lusa.

No início de junho, o Governo moçambicano anunciou um acordo extrajudicial com três bancos, o português BCP, VTB Capital Plc e o antigo VTB Bank Europe, comprometendo-se a pagar 220 milhões de dólares (205 milhões de euros) em vez de 1,4 mil milhões de dólares (1,3 mil milhões de euros).

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