A votação de quinta-feira ditou uma frágil vitória do Partido Conservador, que perdeu pelo menos 12 deputados em relação às eleições anteriores, em 2015. Um resultado inconclusivo que deixa o Parlamento britânico fragmentado e o futuro do próximo Governo mais incerto, em véspera do arranque das negociações para o Brexit. Mesmo sem maioria absoluta, Theresa May visita a rainha Isabel II ainda esta sexta-feira para propor a formação de Governo.
O Partido Trabalhista, liderado por Jeremy Corbyn, garantiu 261 lugares (com 40 por cento dos votos) na nova composição da Câmara dos Comuns, o que representa uma subida de 29 lugares na comparação com as últimas eleições legislativas. Seguem-se os Liberais Democratas, com 12 deputados e 7,3 por cento no conjunto dos votos.
Na Escócia, o SNP conseguiu 35 dos 59 lugares do Parlamento escocês, com 36,9 por cento dos votos, mas perdeu 21 deputados para conservadores, trabalhistas e liberais democratas, colocando em xeque a realização de um novo referendo à independência. O UKIP, partido de extrema-direita que protagonizou o referendo no ano passado, desapareceu do Parlamento, ao perder o único deputado que tinha como representante. Mesmo sem maioria absoluta, Theresa May vai visitar esta sexta-feira o Palácio de Buckingham para anunciar que vai tentar a formação de Governo com a liderança dos conservadores.
Com este resultado, nenhum partido consegue assegurar uma maioria absoluta, restando a cada um a tentativa de entendimento com diferentes formações políticas nas próximas semanas, quando faltam apenas dez dias para o início oficial das negociações com Bruxelas, no âmbito da saída da União Europeia.
Durante a madrugada, a primeira-ministra reagia aos resultados e prometia aos britânicos uma "liderança forte", apesar do fraco resultado.
"Nesta altura, mais do que qualquer coisa, este país precisa de um período de estabilidade. Se de facto o Partido Conservador conquistou o maior número de lugares e o maior número de votos, caberá a nós o dever de garantir um período de estabilidade, e é precisamente isso que vamos fazer", assegurou a líder conservadora.
Corbyn quer Governo trabalhista
Na primeira reação aos resultados, Jeremy Corbyn destacou o falhanço de Theresa May nestas eleições, tendo em conta os objetivos a que se propôs. "O mandato que Theresa May recebeu foi a perda de lugares para o Partido Conservador, a perda de votos, a perda de apoios e de confiança", enfatizou o líder do Labour.
Corbyn foi mais longe e sugeriu ainda a demissão da atual primeira ministra: "Para mim, isso seria o suficiente para ir embora e abrir caminho a um Governo verdadeiramente representativo de todas as pessoas deste país".
"Vamos aguardar o resto dos resultados, mas garanto o seguinte: no novo parlamento, faremos tudo para assegurar que o que dissemos nesta campanha e está no nosso programa eleitoral é apresentado ao Parlamento para que este país seja diferente e se torne fundamentalmente um sítio melhor", assegurou o líder trabalhista ainda durante a madrugada, altura que eram reveladas as primeiras projeções.
Já esta manhã, em entrevista à BBC, Jeremy Corbyn garantiu que o Partido Trabalhista está pronto para servir o país e para procurar as melhores soluções nas negociações com a União Europeia.
Também Nicola Sturgeon, líder do Partido Nacional Escocês (SNP) - que perdeu lugares para os partidos Conservador, Trabalhista e para os Liberais Democratas nesta eleição - vê o lugar da líder conservadora posto em causa: “Isto é um desastre para Theresa May. Ela antecipou as eleições acreditando de forma muito arrogante que conseguiria esmagar a oposição (…) e alcançar uma maioria esmagadora. A sua posição é agora muito, muito difícil”.
Sobre um novo referendo à independência da Escócia, Sturgeon admite que os resutados de quinta-feira vão levar o SNP a refletir sobre as posições a tomar no futuro.
Dentro do próprio Partido Conservador, algumas vozes dissonantes apelaram ao afastamento de Theresa May. A deputada torie Anna Soubry pediu desde logo a Theresa May para que "reconsiderasse a sua posição".
Com efeito, o resultado de quinta-feira representa o fracasso da campanha dos conservadores, mas vem sobretudo colocar em causa a primeira-ministra britânica e a sua continuidade à frente do Governo, uma vez que foi Theresa May quem forçou a marcação de eleições antecipadas, quando o próximo ato eleitoral legislativo estava previsto apenas para 2020.
Ao propor-se a eleições, a primeira-ministra britânica procurava alargar a maioria absoluta obtida pelos conservadores em maio de 2015 e legitimar-se enquanto líder efetiva do Governo. De relembrar que Theresa May chegou ao poder em julho do ano passado em substituição direta de David Cameron, o antigo primeiro-ministro, que apresentou a demissão na sequência da vitória do "Brexit" no referendo.
Na altura em que May anunciou eleições antecipadas, tudo corria bem ao Partido Conservador. A 18 de abril, as sondagens apontavam para uma vitória esmagadora dos conservadores e para o fortalecimento da maioria absoluta. Mas as sete semanas de uma campanha "terrível", como descreve a mesma deputada conservadora, diminuiram vertiginosamente a vantagem dos tories sobre o Labour.
“Um Governo que possa atuar”
Em Bruxelas, as reações são ainda escassas mas revelam de forma clara a perspetiva europeia destas eleições no Reino Unido. Pierre Moscovici, comissário europeu para os Assuntos Económicos e Financeiros, considera que Theresa May perdeu margem de manobra.
"A Senhora May procurava sair reforçada mas perdeu a aposta. Por isso, está numa situação menos simples, até porque ainda não conhecemos a configuração do Governo", afirmou o responsável em entrevista à rádio Europe 1.
Güenther Oettinger, comissário europeu da Economia e das Sociedades Digitais, pede certezas ao lado britânico.
“Precisamos de um Governo que possa atuar. Com um parceiro fraco nas negociações corremos o risco que estas corram mal para ambos os lados”, referiu o responsável em entrevista à televisão alemã Deutschlandfunk.