Supremo brasileiro decide levar Jair Bolsonaro a julgamento por golpe de Estado

por RTP
Foto: Amanda Perobelli - Reuters

O ex-presidente brasileiro e outros sete aliados civis e militares vão ser levados a julgamento por tentativa de golpe de Estado, decidiu o coletivo do primeiro juízo do Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil.

A decisão foi unânime. Os cinco juízes consideraram que não havia qualquer dúvida do envolvimento de Bolsonaro e dos restantes acusados na tentativa de golpe de Estado de 08 de janeiro de 2023.

O ex-presidente está acusado de cinco crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, envolvimento em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de património, cujas penas máximas rondam os 40 anos de prisão.

A decisão surgiu depois de, na terça-feira, primeiro dia do julgamento, o mesmo coletivo ter rejeitado os recursos apresentados por Jair Bolsonaro, assim como as tentativas da defesa em anular o testemunho da principal testemunha, o antigo assessor de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, figura central na investigação, alegando pressão do juiz de instrução, Alexandre de Moraes.

Numa troca acalorada de argumentos, a defesa tentou igualmente, sem sucesso, afastar vários dos juízes por suposta falta de imparcialidade, entre eles Cristiano Zanin, ex-advogado pessoal de Lula, Alexandre de Moraes e Flávio Dino, que foi ministro da Justiça de Lula da Silva até ao ano passado. 

A análise do que significa a decisão, pelo correspondente da RTP no Brasil, Pedro Sá Guerra.
"Graves e infundadas"

Jair Bolsonaro, que não esteve presenta na audiência desta quarta-feira e que mantém a sua inocência, reagiu à decisão do coletivo de juízes com alguma revolta.

As acusações são "muito graves e infundadas", afirmou.

"Ontem fui ao Supremo, foi uma decisão de última hora. Hoje resolvi não ir. O motivo: obviamente sabia o que ia acontecer", justificou. "Parece que eles têm algo pessoal contra mim, e as acusações são muito graves e infundadas", referiu a declaração publicada pelo ex-presidente.

Bolsonaro reafirmou que não apoiou os atos de vandalismo realizados em 08 de janeiro de 2023 e que desencorajou manifestações violentas em transmissões ao vivo nas redes sociais.

"Eu sou golpista? Em oito de janeiro (de 2023) eu estava nos Estados Unidos, uma das cinco acusações contra mim é destruição de património, só se for por telepatia (...). (Fizeram) três busca e apreensão em casa, não acharam nada a meu respeito", declarou.

Embora tenha afirmado não ter tido nenhuma influência no ataque a Brasília realizado pelos seus apoiantes, o ex-Presidente defendeu uma amnistia para os autores desses atos para "passar a borracha" e "fazer o Brasil voltar à normalidade."

Bolsonaro reconheceu, porém, que discutiu "hipóteses de dispositivos constitucionais" com os comandantes das Forças Armadas, mas considerou que "isso não é crime", tentando rebater a acusação da PGR que o acusa de ter apresentado uma minuta de decreto para convencer a cúpula militar a aderir a uma intervenção na Justiça eleitoral.

Bolsonaro voltou a atacar as urnas eletrónicas, comparou o sistema de votação do Brasil com o da Venezuela e refirmou que a Justiça do Brasil influenciou a sua derrota nas eleições presidenciais, alegando que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) "jogou pesado" contra ele "e a favor do candidato Lula (da Silva)".
"Querem-me preso ou morto"

Dias antes do início das audiências, Bolsonaro clamou inocência, perante uma multidão que o apoia e acredita que o ex-presidente está a ser vítima de perseguição política.
Nesse evento, realizado na Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, e que juntou milhares de pessoas, Bolsonaro denunciou que o facto de estar impedido de se candidatar nas eleições do próximo ano é "uma negação da democracia".

"Quero dizer aos que não gostam de mim em Brasília: as eleições sem Bolsonaro são uma negação da democracia no Brasil", disse o ex-presidente, empoleirado num palanque com um cartaz que mostrava o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, com o punho erguido, após o ataque sofrido durante a campanha eleitoral, na Pensilvânia, em julho passado.

"Tudo isto se deve ao facto de me quererem preso ou morto", denunciou o ex-presidente.

"Fabricaram esta história sobre o golpe, e agora tenho de provar que sou inocente", declarou ainda, referindo-se à acusação do Ministério Público, dele ter engendrado o ataque aos três poderes governamentais ocorrido no início do ano de 2023, uma semana após a tomada de posse do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Nesse dia, milhares de bolsonaristas invadiram e vandalizaram os edifícios da presidência, do Parlamento e do Supremo Tribunal Federal em Brasília, incitando as Forças Armadas a derrubar o novo governo.

Bolsonaro e cerca de trinta dos seus colaboradores mais próximos são acusados também de terem conspirado para impedir a investidura de Lula, que o tinha derrotado nas eleições de outubro de 2022.

A acusação, apresentada ao STF pelo Procurador-Geral da República do Brasil, Rodrigo Janot, aponta Bolsonaro, de 70 anos, como o líder de uma alegada organização criminosa que supostamente conspirou para mantê-lo no poder após a derrota eleitoral.

Janot baseou a sua acusação num extenso relatório policial, divulgado em novembro passado, que revelou que Bolsonaro terá tido "pleno conhecimento" de um plano para assassinar o então Presidente eleito, Luís Inácio Lula da Silva, e o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin.

com Lusa
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