Sudão do Sul. Crianças morrem a procurar tratamento para a cólera

por Cristina Sambado - RTP
CARE via Reuters

Oito pessoas no Sudão do Sul, incluindo cinco crianças, morreram numa caminhada de três horas para procurar tratamento médico contra a cólera, depois de os cortes na ajuda dos EUA terem forçado o encerramento dos serviços de saúde locais, revelou esta quarta-feira a instituição de caridade britânica Save the Children.

Deveria haver uma indignação moral global pelo facto de as decisões tomadas por pessoas poderosas noutros países terem levado à morte de crianças em apenas algumas semanas”, disse Christopher Nyamandi, diretor nacional da Save the Children no Sudão do Sul.As mortes no mês passado estão entre as primeiras a serem diretamente atribuídas aos cortes impostos pelo presidente dos EUA, Donald Trump, após a tomada de posse em 20 de janeiro.

A Save the Children apoiou 27 instalações de saúde no Estado de Jonglei, no leste do Sudão do Sul, até ao início deste ano, altura em que os cortes dos EUA forçaram sete a fechar completamente e 20 a fechar parcialmente, frisou a organização em comunicado.

Os serviços de transporte financiados pelos EUA para levar as pessoas ao hospital na principal cidade local também pararam por falta de fundos, o que significou que os oito doentes de cólera tiveram de caminhar sob um calor de quase 40°C para procurar tratamento na unidade de saúde mais próxima, revelou a organização.

Segundo Christopher Nyamandi, “três das crianças tinham menos de cinco anos de idade".

Para além dos cortes dos Estados Unidos, reduções mais graduais por parte de outros doadores têm prejudicado a resposta humanitária no Sudão do Sul. A Save the Children espera gastar 30 milhões de dólares no país em 2025, contra 50 milhões no ano passado, explicou Nyamandi.Os peritos alertaram para o facto de os cortes - incluindo o cancelamento de mais de 90 por cento dos contratos da USAID - poderem custar milhões de vidas nos próximos anos devido à desnutrição, SIDA, tuberculose, malária e outras doenças.

Em outubro de 2024, foi declarado um surto de cólera no Sudão do Sul. Em março de 2025, tinham sido registados mais de 22 mil casos, que causaram centenas de mortes, segundo a Organização Mundial de Saúde.

O Departamento de Estado dos EUA disse não ter informações sobre as mortes relatadas pela Save the Children.

Um porta-voz afirmou que muitos programas do governo dos EUA que fornecem ajuda para salvar vidas no Sudão do Sul continuam ativos, mas que o apoio aos serviços médicos também foi usado para enriquecer os líderes do país.

“Enquanto os programas de emergência para salvar vidas continuarem, não vamos, em boa consciência, pedir ao contribuinte americano que forneça assistência que subsidie efetivamente o comportamento irresponsável e corrupto dos líderes políticos do Sudão do Sul”, sublinhou o porta-voz.

O governo do Sudão do Sul reconheceu no passado uma quantidade significativa de corrupção pública, mas negou acusações específicas de corrupção, incluindo contra a família do presidente Salva Kiir.

Mais de um terço dos cerca de 12 milhões de habitantes do Sudão do Sul foram deslocados devido a conflitos ou catástrofes naturais, e as Nações Unidas afirmam que o país pode estar à beira de uma nova guerra civil, depois de os combates terem eclodido em fevereiro no nordeste do país.

A ajuda humanitária ao país é frequentemente canalizada através de organizações não-governamentais, em grande parte devido a preocupações com a corrupção.
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