Síria. Ocidente em peso denuncia ataque químico em Douma

por RTP
Tal como no passado dia 21 de março, o Conselho de Segurança da ONU deverá reunir-se de novo sobre a Síria esta segunda-feira, 19 de abril Reuters

Uma nova reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU deverá ter lugar já esta segunda-feira, a pedido de França e dos Estados Unidos, entre vários outros países e com fundo de apoio da União Europeia. Motivo, as novas acusações de ataque químico na Síria, por parte do exército de Damasco.

Desta vez, o ataque, para já impossível de confirmar por fontes independentes, terá ocorrido em Douma, último bastião dos grupos armados islamitas que se opõem a Bashar al-Assad em Ghouta Oriental e nos últimos dias alvo de bombardeamentos do exército.

O Governo sírio já reagiu às alegações. Em comunicado do ministério dos Negócios Estrangeiros, denunciou a "mesma velha cantiga chata".

"As alegações de utilização (de armas) químicas tornaram-se uma velha cantiga chata e não convincente, se não fosse por alguns países que apoiam o terrorismo na Síria", refere o texto transcrito pela agência oficial de notícias, Sana.

Estas novas acusações, diz Damasco, são uma "farsa" e "invenções".

O Governo de Bashar al-Assad já foi acusado várias vezes de utilizar armas químicas nas suas operações militares nos últimos sete anos de guerra, e sempre negou. As anteriores alegações mais recentes surgiram no início da ofensiva do exército contra a região de Ghouta Oriental.

As primeiras denúncias sobre o ocorrido em Douma surgiram sábado nas agências de notícias, ao fim da tarde em Portugal, através da ONG Observatório Sírio dos Direitos Humanos, OSDH.

A organização dava conta de casos de asfixia em Douma após um bombardeamento aéreo, mas sublinhava ser incapaz de confirmar a ocorrência.
"Cenas pavorosas"
Um comunicado conjunto da Organização Sírio-Americana de Auxílio Médico (SAMS) e dos auto-denominados serviços de defesa civil Capacetes Brancos, que operam nas áreas dominadas pelos grupos armados, afirmou depois que pelo menos 49 pessoas morreram no ataque de sábado no ataque com "gases tóxicos".

Referiu ainda de mais de 500 casos, na maioria mulheres e crianças, com "sintomas de exposição a um agente químico". O número de mortos terá subido entretanto para mais de cem.

A organização Capacetes Brancos difundiu entretanto na rede Twitter imagens do alegado ataque, com imagens de corpos sem vida deitados no chão, alguns com espuma branca na boca e de olhos arregalados.

Um socorrista de Douma, Firas al-Doumi, falou em "cenas pavorosas" à Agência France Press, com "muitas pessoas em asfixia, algumas mortas de imediato". "Foi um massacre. Havia um cheiro muito forte que causou dificuldades respiratórias aos socorristas", afirmou.

A proveniência destas alegações é impossível de confirmar de forma independente.
Ocidente condena
Responsáveis norte-americanos, e não só, afirmaram domingo que estão a verificar os detalhes do ataque, mas a condenação já é geral, da Casa Branca ao Vaticano.O Papa Francisco disse na Praça de São Pedro, perante os fiéis reunidos, que "não existe uma boa guerra e uma má e nada, nada pode justificar o uso de tais instrumentos de exterminação contra pessoas e populações indefesas".

O secretário-geral da ONU, António Guterres afirmou-se "particularmente apreensivo" com o presumível recurso ao gás.

A Grã-Bretanha considerou que "se esta nova utilização de armas químicas pelo regime se confirmar, será um novo exemplo da brutalidade do regime de Assad".

A Turquia, que apadrinha os grupos armados que combatem o Presidente sírio, disse ter suspeitas "fortes" de que o regime é responsável pelo alegado ataque, dado "os antecedentes em matéria de recurso às armas químicas, bem conhecidos".

O ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Jean-Yves Le Drian, que este domingo recebeu em Paris o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman, considerou os relatos muito preocupantes e condenou com firmeza os bombardeamentos das forças governamentais sírias das últimas 24 horas em Douma.

São "uma grave violação das leis humanitárias internacionais", afirmou, acrescentando que a França iria colaborar na verificação das denúncias para verificar que armas químicas foram usadas.

Referindo a promessa do Presidente francês, de que a França iria atacar de forma unilateral em caso de ataque químico, Le Drian disse que Paris "assumiria todas as suas responsabilidades na luta contra a proliferação de armas químicas".
Trump ameaça fazer pagar um "preço alto"
Em abril de 2017, os Estados Unidos lançaram 59 mísseis de cruzeiro contra uma base militar do regime sírio, em resposta a um alegado ataque químico que terá provocado a morte a mais de 80 civis em Khan Cheikoun, na provínvia de Idleb, nordeste do país.

Também agora, o Presidente Donald Trump fez ameaças mais ou menos veladas contra Damasco. Chamou "Animal" ao Presidente sírio Bashar al-Assad e criticou o apoio da Rússia a Damasco.

"A zona das atrocidades está confinada e cercada pelo exército sírio, tornando-a completamente inacessível ao resto do mundo. O Presidente Putin, a Rússia e o Irão são responsáveis pelo seu apoio ao Animal Assad. É preciso pagar um preço alto", sublinhou o Presidente norte-americano num tweet, sem precisar quem tem de pagar o preço e que preço será esse.

A reunião do Conselho de segurança foi entretanto confirmada pela missão britânica nas Nações Unidas.

"O Reino Unido, a França, os EUA, a Polónia, a Holanda, a Suécia, o Kuwait, o Peru e a Costa do Marfim apelaram a uma reunião de emergência do #UNSC para debater os relatos de um ataque com armas químicas na #Syria. Reunião esperada segunda-feira", anunciou num tweet.
"Desculpa" para ataque militar
Algum tempo depois, o contra-ataque diplomático. A Rússia pediu igualmente uma reunião do Conselho de Segurança sobre "ameaças a paz internacional e segurança", sem outras especificações.

Moscovo saiu em defesa de Damasco e, em coro com o Irão, outro apoiante de Assad, diz que os relatórios do ataque com gás na Síria são apenas "uma desculpa" para justificar uma ação militar dos EUA e de outros países ocidentais contra Damasco.

"Tais queixas e alegações pelos americanos e alguns países ocidentais indicam um novo plano contra o Governo sírio e o seu povo, e são uma desculpa para iniciar uma ação militar contra eles", afirmou o porta-voz do ministério iraniano dos Negócios Estrangeiros, Bahram Qasemi, citado pela agência IRNA. Qasemi afirmou também que os relatos sobre o ataque com gás "não são suportados pelos factos".

Logo de início, também Moscovo "desmentiu com firmeza estas informações". Depois o discurso passou a denunciar as intenções do Ocidente.

"O objetivo destas falsas conjeturas, totalmente infundadas, é proteger os terroristas e a oposição radical que rejeita um acordo político e, ao mesmo tempo, tentar justificar possíveis ataques militares a partir do exterior", afirmou o ministério dos Negócios Estrangeiros russo em comunicado.
Acordo em Douma
Douma, às portas de Damasco, é o último reduto dos grupos armados islamitas que fizeram a guerra a Bashar al-Assad em Ghouta oriental. Até este fim de semana, era dominado pelo grupo Jaish al-Islam, ou Exército do Islão.

De acordo com as agências internacionais, após negociações da oposição síria com a Rússia, os combatentes concordaram este domingo sair e deixar a cidade às forças militares de Moscovo.

Sob os termos do acordo, aqueles que quiserem render-se a Damasco e permanecer na cidade não serão perseguidos, nem serão forçados a integrar o exército por um período de seis meses.
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